"É complexo. Varia de rua, de dia. Atualmente moro na Santa Cecília, região central de São Paulo. Tem sido uma experiência interessante, pois sou um dos poucos corpos negros na rua.
A primeira reação foi de recusa desse lugar. Tinha vergonha, achava que não era o meu lugar. Sentia-me constrangida de sair com qualquer roupa. É um bairro muito hipster e muito branco, então, tinha uma tentativa de estar sempre à altura.
Estou no processo de me sentir confortável. Sou muito fechada quando estou na rua. Ando rápido, de cara fechada. Não sei se não ouço, mas não sinto os homens me paquerando. Talvez eu não seja o perfil de mulher negra hiperssexualizada. Eu tenho dread, minha pele é escura.
O que é bem irritante é as pessoas perguntarem de onde eu sou. Respondo que sou daqui, mais do que ela, pois sou como 53% da população brasileira, que se declaram negros.
Tem uma coisa da beleza diferente, de me colocarem num lugar mais do exótico, do que do sexual. Eu gosto de frequentar lugares bons.
Sou chamada de preta pobre patrícia. Fico feliz de ver outras pessoas pretas nesses espaços. Fico triste com o discurso de 'esse lugar não é para mim'.
Precisamos estar em todos os espaços. Não é agir como branco. Mas é ser a gente mesmo nos lugares que são nossos por direito. É não ter vergonha de ter possibilidades de acesso
Quando encontro outra pessoa negra, eu aceno com a cabeça, a gente troca olhares e segue. É bom, é reconfortante. Isso dá uma sensação de que você pertence. Mas, em alguns casos, esse olhar de reciprocidade também é de disputa. A nova geração preta tem que se reconectar. Não é disputa de looks, de fama nas redes sociais. Sou preta, você é preto. Estamos no mesmo lugar e, se algo der errado, estamos um pelo outro. É uma construção que precisa ser feita. Sinto-me fortalecida quando vejo outra pessoa negra na rua, mas nem sempre os olhares são positivos de volta."