O dia em que SP parou

Paulista vazia, centro silencioso: retratos da capital paulista, que se recolhe para frear avanço da covid-19

Lucas Borges Teixeira Colaboração para o UOL, em São Paulo Reinaldo Canato / UOL

Faz sol em São Paulo. Poucas pessoas de máscara caminham com pressa junto aos prédios para aproveitar a sombra, alguns moradores de rua sem proteção falam baixo deitados sobre papelotes e cobertores em frente a lojas — todas fechadas.

É terça-feira de manhã, horário de pico, mas as ruas estão quase desertas e silenciosas. Ao longe, ouvem-se alguns sons espaçados de carros. Segundo a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), entre as 9h e as 10h da manhã, a cidade tinha zero quilômetro de congestionamento — muito abaixo dos pelo menos 60 quilômetros que a cidade costuma registrar.

Em meio a pior pandemia da história recente da humanidade, após apelos das autoridades e a proibição ao comércio e a abertura de restaurantes (com exceção para supermercados, farmácias e entrega de comida), a maior cidade do hemisfério sul, hoje, praticamente parou.

Pelo menos é o que se vê em áreas tradicionalmente movimentadas da capital paulista, como o Centro Antigo, a avenida Paulista, a rua Augusta e a rua Oscar Freire.

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Quarentena até 7 de abril - pelo menos

O comércio na capital paulista começou a ser fechado na semana passada, mas restaurantes, lanchonetes e empresas nos prédios continuavam abertos. Até ontem, o movimento ainda era razoável na região da República — mas, hoje, a situação visivelmente mudou.

No último sábado (21), o governador João Doria (PSDB) assinou um decreto determinando que todos os serviços não essenciais devem ficar fechados de hoje até o dia 7 de abril. E a decisão pode ser prorrogada caso o ritmo de contágios de covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, não baixe.

Centro vazio

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No centro, os poucos supermercados que abriram hoje viram um movimento reduzido, quase inexistente.

Nesta manhã, a região que abriga órgãos do governo estadual, a bolsa de valores e a prefeitura não tinha mais o vaivém de engravatados, ambulantes ou turistas.

As ruas, que pareciam mais amplas com o vazio, eram de alguns poucos carros e permitiam a alguns trabalhadores de uniforme, com máscara cirúrgica e passo apressado, atravessar com facilidade.

Farmácias e bancos, cada qual com seu procedimento de segurança para evitar aglomerações, ainda registravam um movimento leve.

Só 7 serviços essenciais podem abrir em SP

  • Segurança pública e privada

  • Supermercados e abastecimento

  • Transporte público

  • Alimentação por delivery

  • Limpeza

  • Bancos e Lotéricas

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O comércio diverso — de acessórios para smartphones a utensílios para fumo e produtos para academia - que tanto movimenta a região central também estava fechado hoje.

Nos stands, um ou outro comerciante aproveitava a portinha lateral para abastecer o estoque. Ninguém parecia feliz com a situação.

O transporte público também foi reduzido na capital desde a semana passada. No ponto da Praça Ramos, na Rua Xavier de Toledo, um dos mais movimentados do Centro, os ônibus se enfileiravam, estacionados, sem qualquer passageiro à esper

Parte dos veículos levava um aviso sobre higienização para os passageiros. Motoristas e cobradores, em grande parte de luva, tentavam evitar o contato com colegas. A maioria também usava máscara.

Rua Augusta

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A rua Augusta, que, entre algumas mudanças de nome, liga o Centro ao Jardim Europa, estava tão vazia que os poucos transeuntes usavam o espaço destinado a carros.

Com o comércio fechado, o movimento limitava-se a alguns moradores indo ao mercado ou aos postos de vacinação de idosos na região.

Não havia som de lanchonetes, ambulantes de cerveja ou dos skatistas que geralmente lotam a Praça Roosevelt em dias ensolarados. Os disputados salões de beleza da região estavam todos fechados.

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Sem fila para o bilhete único

O governo do estado e a prefeitura mantiveram parte dos serviços de atendimento ao cidadão, como o posto da SPTrans no bairro da Consolação. A população, por sua vez, priorizou a prevenção e não compareceu.

Entre os locais administrados pela iniciativa privada, como sebos, lojas de LPs e esfiharias, a pausa forçada foi usada para reformar ou pintar os ambientes.

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No cartão postal paulistano, as frequentes buzinas deram lugar ao som intercalado de automóveis passando.

Não fosse pelo sol, fechando-se os olhos, era possível acreditar que era madrugada na avenida Paulista — mas era hora do almoço.

Dentro do Conjunto Nacional, um dos símbolos da avenida, o cenário era condizente com o de uma epidemia. O ambiente fechado já não era mais ponto de passeio. Ali circulavam apenas seguranças, funcionários e poucos clientes do mercado aberto no interior.

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Se a maioria das pessoas que pela Paulista passavam pareciam ter um motivo profissional, algumas pessoas usaram o dia livre e a calma da avenida para dar uma corridinha.

A prática esportiva durante a quarentena é controversa. Os decretos paulistanos não proíbem nem autorizam o ato, que é liberado em cidades da Alemanha, por exemplo, e proibidos na Espanha.

De qualquer maneira, as aglomerações são contraindicadas pela Organização Mundial de Saúde agora, e por isso, inclusive, os parques da cidade, como o Ibirapuera, estão fechados.

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Por volta das 12h, não se viam grupos de homens com mangas arregaçadas e mulheres de roupa executiva saindo para almoçar em um dos tantos restaurantes da região. Com grande parte das empresas impondo o home office e o veto das autoridades, os estabelecimentos estavam fechados.

Também não se via turistas no vão do Masp (Museu de Arte de São Paulo) ou trabalhadores aproveitando a pausa para o almoço para relaxar no Parque Trianon, fechado. Ao redor, policiais e moradores em situação de rua completavam a paisagem atípica para um dia de semana.

Sem luxo

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A rua Oscar Freire, polo de luxo da capital paulista, também ganhou ares pós-apocalípticos. Com quase nenhum carro passando, o movimento era quase nulo. Em um raio de cinco quarteirões com mais de 60 lojas e cafés, não havia cinco estabelecimentos abertos.

Como na avenida Paulista, a exceção da paisagem vazia se dava por poucos transeuntes que aproveitaram a calmaria para passear pela rua. Um homem se exercitando aqui, duas mulheres olhando as vitrines — em parte, também vazias — ali e diversos moradores levando seus golden retrievers e shih-tzus para fazer as necessidades

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