Os militares estão retirando a gente da água. Temos direito. Sem água, a gente não sobrevive.
Ditas na manhã de sexta-feira, 16 de outubro, as palavras de Crispiniana, que pescava com outras mulheres, mais pareciam um presságio. Menos de 24 horas depois, o temor da marisqueira se confirmava: a pedido da Marinha do Brasil, a Justiça proibia as 110 famílias do quilombo Rio dos Macacos de acessar as águas que banham a comunidade, localizada entre Simões Filho e Salvador, na Bahia.
Disputada pelo grupo formado por ao menos cinco gerações de remanescentes de escravizados e a Força, a barragem Rio dos Macacos está no centro de um embate que durou meio século e parecia ter sido encerrado em julho deste ano.
Há apenas quatro meses, a comunidade recebeu do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) o título de posse de 98 hectares de terras até então pertencentes à União.
No processo de regularização, contudo, a barragem foi demarcada como pertencente ao território militar. Ainda assim, os quilombolas festejaram. Viram na decisão uma alforria tardia e vislumbravam a chegada de um novo tempo, com cidadania e serviços públicos.