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Números da dengue no RJ aumentam preocupação com zika durante Jogos

José Lucena/Futura Press/Estadão Conteúdo
Imagem: José Lucena/Futura Press/Estadão Conteúdo

Jefferson Puff

No Rio

27/01/2016 20h05

Em meio à epidemia de zika vírus enfrentada pelo Brasil, números divulgados pelo governo do Rio de Janeiro mostram que nos primeiros 25 dias deste ano houve 3.954 casos suspeitos de dengue em todo o Estado, contra 2.584 no mesmo período do ano passado --um aumento de 53%.

Já na capital fluminense, as três primeiras semanas do ano registraram 593 casos, contra 133 no mesmo período de 2015. Para infectologistas, a elevação ressalta a importância de estratégias de combate ao mosquito Aedes aegypti, especialmente com a proximidade dos Jogos Olímpicos.

Para Edimilson Migowksi, doutor em infectologia e diretor do Instituto de Pediatria da UFRJ, os números mostram que os esforços para conter o vetor têm sido "ineficazes". "Os dados traduzem a falha do controle do mosquito. É nítido que o controle ao Aedes não tem sido eficiente há décadas, embora as atuais secretarias de Saúde até estejam levando o assunto mais a sério", diz.

Ações de combate ao Aedes aegypti, mosquito transmissor dos vírus da dengue, zika e chikungunya, são vistas pelos especialistas como a maior arma que as autoridades possuem contra a ameaça.

"Não é necessário reinventar a roda ou ter novas tecnologias. As duas coisas essenciais agora são a mobilização da população e a intensificação do trabalho com mais agentes. A campanha precisa ser boca a boca, é necessário mostrar o que pode ser um potencial criadouro, educando a pessoa no nível cara a cara mesmo", diz o infectologista Jessé Reis Alves, coordenador do Ambulatório de Medicina do Viajante do Hospital Emílio Ribas.

O especialista ressalta, no entanto, que além de medidas em grande escala anunciadas pelo governo, é necessário garantir investimento para intensificar o controle ao mosquito, sobretudo nas circunstâncias atuais.

"Sobre os Jogos Olímpicos, é preciso levar em conta que o evento ocorre numa época do ano em que o número de casos costuma cair, mas sim, se houver uma grande quantidade de zika vírus em circulação, teremos muita gente infectada, por mais que somente em um quinto dos casos haja sintomas", diz Alves.

Embora muitos casos de zika sem assintomáticos e alguns dos sintomas sejam confundidos pelos médicos com os da dengue, a grande preocupação com relação à epidemia é a população de mulheres grávidas, já que há suspeitas de que o vírus esteja relacionado ao aumento de casos de microcefalia no país.

Segundo o último boletim do Ministério da Saúde, atualmente há 3.448 casos suspeitos sendo investigados no Brasil e 270 já foram confirmados. Migowski, da UFRJ, diz que a proximidade da Olimpíada reforça a necessidade de controlar o vetor. "É fundamental que todos os esforços sejam intensificados para baixar o índice de infestação pelo mosquito. É a ferramenta mais eficaz de que dispomos - a única, na verdade", avalia.

Mobilização e microcefalia

Para Alves, do Emílio Ribas, seria importante que as autoridades e a população aproveitassem a crise em torno do zika vírus para implementar mudanças concretas. "Agora o momento é de aproveitar esse empenho, essa mobilização nacional, para a gente ver se consegue obter resultados melhores do que nos anos anteriores", diz.

Migowski, da UFRJ, acredita que a questão da microcefalia possa ter um impacto neste cenário. "Essas crianças vão ser o ícone atual da incompetência de todos nós no combate ao vetor. Pode ser que haja maior mobilização quando as pessoas virem essas crianças e se lembrem de que o mosquito é a origem do problema", diz.

Epidemias e tipos de vírus

Uma análise dos números de casos de dengue registrados nos últimos cinco anos somente na cidade do Rio de Janeiro mostra que há grande flutuação. Em 2011, a cidade registrou 77.653 casos. Em 2012, foram 130.412 casos. Já em 2013, o Rio contabilizou 66.278 casos, e em 2014 a cifra caiu para 2.649 casos. No ano passado, em 2015, foram 18.059 casos.

Para os especialistas, os anos de maiores epidemias estão relacionados à circulação de novos tipos de dengue. "A flutuação se deve ao vírus novo circulando. Há quatro tipos de dengue, então quando circula um novo tipo para o qual as pessoas ainda estão vulneráveis, há mais casos, e menos quando circula um tipo para o qual a população está imune", explica Jessé Reis Alves, do Emílio Ribas.

Apesar das questões em torno do grande número de casos assintomáticos, os especialistas não descartam a possibilidade de que o aumento das notificações de dengue no Estado do Rio de Janeiro esteja relacionado à entrada do zika vírus, para o qual a população está totalmente vulnerável, e que os médicos estejam confundindo o novo vírus com a dengue ao fazerem diagnósticos.

Outro lado

Consultados pela BBC Brasil, os encarregados do combate ao Aedes aegypti e controle da dengue no Estado e na cidade do Rio de Janeiro responderam às críticas de que o trabalho tem sido "ineficaz".

Para o subsecretário de Vigilância em Saúde da Secretaria de Estado da Saúde do RJ, Alexandre Chieppe, a estratégia adotada pelo Brasil é a mesma preconizada pela Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) e a OMS (Organização Mundial da Saúde), focando na eliminação mecânica dos criadouros do mosquito.

"Temos que melhorar a capacidade de mobilização da população e o desenvolvimento de novas tecnologias. Não existem tecnologias atualmente que permitam um controle total do Aedes, e no Estado nós temos 6 milhões de imóveis, é impensável colocar um agente por semana em cada imóvel", diz.

Chieppe adianta que os agentes de saúde estão sendo orientados a auxiliar os agentes de vigilância epidemiológica nos meses de janeiro a abril, o que permitiria dobrar o efetivo de 10 mil agentes.

Para Marcus Vinicius Ferreira, coordenador de Vigilância Ambiental em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, o percentual de casos da capital na cifra estadual tem diminuído, o que sinalizaria um melhor controle na cidade.

"A população do Rio de Janeiro representa 50% de toda a população do Estado, mas os números atuais mostram que nós contribuímos com muito menos do que isso para o total de casos de dengue. Este percentual foi reduzido nos últimos anos, o que mostra que nossos esforços estão indo na direção certa", diz.

Sobre os 593 casos de dengue registrados nas três primeiras semanas de 2016 contra os 133 no mesmo período do ano passado, Ferreira diz que o aumento gradual mês a mês entre janeiro e maio é "normal".

"Após maio, temos historicamente uma redução dos casos. Os meses de julho e agosto, quando ocorrerão os Jogos Olímpicos, são mais frios e registram número menor de casos", afirma.

Chieppe, do Estado do RJ, também descarta riscos para a Olimpíada. "No período dos Jogos, os meses de julho e agosto, a série histórica mostra que a taxa de transmissão tem ficado em torno de menos de um para cada cem mil habitantes. Já no período de março e abril, num ano de epidemia, a taxa sobe para até 300 casos transmitidos a cada cem mil habitantes", diz.