Nova terapia cria "superpais" e melhora condição de crianças autistas
Dar a mães e pais as habilidades para se tornarem "superpais" pode melhorar consideravelmente a condição de vida de crianças autistas, aponta um estudo publicado na revista científica The Lancet.
O estudo é focado em crianças com nível avançado de autismo, que muitas vezes não conseguem se comunicar com os pais. Segundo especialistas, os resultados do treinamento sugerido na pesquisa são "extremamente animadores".
Nele, os pais assistiram a imagens gravadas de si mesmos brincando com seus filhos enquanto especialistas davam dicas sobre como ajudar as crianças a se comunicarem.
"O que é impressionante é o retorno", diz Louisa Harrison, que passou pelo treinamento e acompanhou uma enorme mudança em seu filho Frank.
"Você sente como se estivesse sendo realmente treinada por essas pessoas que confiam no seu julgamento sobre o que funciona com a criança."
Experimento
O tratamento foi testado por 152 famílias que recentemente haviam recebido o diagnóstico de autismo em crianças com cerca de 3 anos. Geralmente os sintomas pioram conforme o avanço da idade.
Metade das famílias usaram terapias tradicionais. Cerca de 50% das crianças dessas famílias tinham autismo avançado no começo do tratamento. Seis anos mais tarde, a porcentagem de crianças com autismo severo no grupo aumentou para 63%.
O oposto aconteceu com as famílias que receberam o treinamento intensivo. Nesse grupo, 55% das crianças tinham autismo avançado, uma taxa que caiu para 46% depois de seis anos de tratamento.
Para o principal autor do relatório, Jonathan Green, professor de psiquiatria da Universidade de Manchester, os resultados são "extraordinários".
No entanto, Green sublinhou que não é uma cura. "As crianças que demonstraram melhoria continuaram com outros sintomas de autismo", disse à BBC.
O que o estudo apontou é que trabalhar com os pais pode trazer resultados a longo prazo, segundo o psiquiatra. "Sugere que o que eles conseguiram implantar na família foi mantido até mesmo depois do tratamento, o que é bastante promissor."
Para Louisa e seu filho Frank, seu progresso utilizando o método foi marcado por lâmpadas de postes. "Ele adora assistir aos postes de luz acendendo na nossa rua", conta.
"Alguns anos atrás, era uma interação silenciosa entre nós, mas agora ele puxa assunto. 'Mamãe, mamãe, olha, eles estão indo em uma ordem diferente'", afirma a mãe. "Se você me dissesse que ele diria uma frase dessas há quatro anos eu teria chorado."
O objetivo dos pesquisadores era simples: melhorar os cuidados dos pais para melhorar as habilidades sociais da criança.
"Nós pegamos a interação dos pais com a criança e a levamos para um nível 'super'", disse Catherine Aldred, terapeuta e consultora de linguagem e fala. "Essas crianças precisam de algo além de 'bom o bastante', elas precisam de algo excepcional."
Passo a passo
Só que ser excepcional dá trabalho. Primeiro, os pais foram filmados enquanto brincavam com a criança, que poderia estar sentada, brincando sozinha.
Em seguida, os pesquisadores mostraram aos pais os momentos - facilmente perdidos - em que a criança se aproxima dos pais para brincar.
O próximo passo foi trabalhar junto com os pais e com especialistas de comunicação as habilidades necessárias para aproveitar ao máximo esses breves momentos.
Pouco a pouco, as crianças começaram a falar mais. "Você percebe coisas que não perceberia em tempo real. Coisas como esperar, dar a Frank tempo o bastante para se comunicar e comentar em vez de questioná-lo, o que o pressiona para responder", conta Louisa.
"O poder dessa terapia é o fato de que se estende além da hora que você passa na sala do terapeuta porque vai para dentro de casa. É implementado na vida familiar e no jeito como você se comunica com seus filhos", disse Adumea, cujo filho Kofi, de 12 anos, também participou do experimento.
Casos globais
Uma em cada cem pessoas desenvolve algum tipo de autismo no Reino Unido. Mas não há tratamento com remédios para o transtorno e muitas famílias acabam indo atrás de charlatões.
No Brasil, estima-se que são 2 milhões de casos, ainda que não existam dados oficiais, e sim uma estimativa baseada em números internacionais.
Outro problema é que apenas 10% dos casos são diagnosticados no Brasil, segundo estimativas do Programa de Transtornos do Espectro Autista do Instituto de Psiquiatria do HC de São Paulo.
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