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Em busca de saúde e bem-estar, adeptos da calistenia desafiam a gravidade

Aldo Gallo, de 51 anos, pastor e praticante de calistenia - arquivo pessoal
Aldo Gallo, de 51 anos, pastor e praticante de calistenia Imagem: arquivo pessoal

09/04/2017 14h42

Aldo Gallo, de 51 anos, é pastor na comunidade Vida, na zona leste de São Paulo, mas nos vídeos que publica na internet ele aparece em situações bem diferentes daquelas que conduz em seu templo.

Em clipes ao som de música eletrônica, gravados em um parque, ele ensina posições e movimentos que usam o peso do próprio corpo para fortalecer a musculatura e que, junto com flexões, exercícios na barra e abdominais, melhoram o condicionamento físico.

Essa prática conhecida como calistenia nasceu no século 19, a partir da ginástica sueca, e se popularizou inicialmente nos Estados Unidos e na Europa. O nome original em grego -- kallistenés -- significa "bela força".

Gallo conheceu a calistenia há dois anos. "Fiquei curioso ao ver um japonês fazendo exercícios diferentes na barra. Comecei a pesquisar sobre os movimentos e a praticá-los. Gostei tanto que hoje faço vídeos para ajudar quem está começando", diz Gallo, que treina com seu filho de 15 anos de idade.

"É um esporte sem restrição etária, acessível a todos. Além disso, sempre há um novo desafio a ser superado. Você nunca cai na mesmice e fica com o corpo bem definido."

Superação

A superação dos limites do corpo é, com frequência, apontada por praticantes da calistenia como um dos aspectos mais atraentes da modalidade.

Uma vez adquirido o domínio sobre um movimento básico, é possível tentar uma série de outros novos, com graus variados de dificuldade.

Outro aspecto, diz a educadora física Samanta Zequini, é a autonomia que proporciona. A prática não demanda aparelhos específicos e pode ser realizada em parques e praças.

"Muita gente está saturada das academias, do ambiente fechado e da necessidade de contar o número de séries e repetições de exercícios, o que pode tornar o treino chato", afirma.

Os chamados movimentos calistênicos envolvem diversas regiões musculares e podem desenvolver simultaneamente habilidades como flexibilidade, força, coordenação motora, ritmo e equilíbrio.

"A calistenia tem potencial de reduzir bastante o percentual de gordura do corpo porque é um treino muito intenso. Adotando bons hábitos alimentares e complementando a rotina de treinamento com exercícios cardiovasculares, a perda de peso é consequência", aponta Zequini.

"Quem pratica calistenia não fica à mercê de horários determinados, além de não precisar de máquinas nem de peso. As pessoas vão para locais abertos, parques, enfim, para a natureza."

Esse foi o apelo para Ivan Chagas, de 24 anos. Morador de Curitiba, ele diz nunca ter sido fã de academias de ginástica.

"Quando jogava bola, era obrigado a fazer academia e não gostava daquele lugar fechado. Quando comecei a fazer calistenia, me dei conta de quanta liberdade ela traz", diz Chagas.

Praticante de calistenia usa o peso do corpo e o apoio em barras para se exercitar - arquivo pessoal - arquivo pessoal
Praticante de calistenia usa o peso do corpo e o apoio em barras para se exercitar
Imagem: arquivo pessoal

"Tendência contemporânea"

Para Ary Rocco, professor da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (USP), a calistenia associa "exercícios simples a tendências contemporâneas de práticas corpóreas, como explorar espaços ao ar livre".

"Isso tem popularizado muito a prática no Brasil e torna a atividade atraente para quem quer praticar uma atividade em local agradável, a um baixo custo e com benefícios para a saúde." Mas ele alerta para o fato de que, como qualquer atividade física, é sempre importante ter o acompanhamento de um profissional da área.

O aumento do número de praticantes fez até mesmo uma academia no centro de São Paulo adotar o conceito do esporte e oferecer aulas de calistenia indoor.

"Como ainda não temos barras instaladas, as aulas ministradas contemplam exercícios no solo, como flexões variadas e outros que proporcionam ganho de força e resistência", diz Saymon Lopes, sócio-proprietário da academia.

"Aos fins de semana, reunimos os alunos num parque para testar nas barras o que eles treinaram nas aulas ao longo da semana."

Riscos

O educador físico Luis Mochizuki, professor da USP, afirma que o esporte "não requer habilidades motoras específicas para a maioria dos movimentos", mas afirmou que a modalidade pode trazer riscos se praticada sem acompanhamento adequado.

"É um esporte que pode ser praticado por pessoas de idade variada, desde crianças até idosos, com ou sem doenças, desde que sejam supervisionados por um profissional preparado para adequar a carga, quantidade, sequência, intensidade e duração dos exercícios para necessidades e restrições de cada pessoa. E os exercícios devem ser gerenciados de acordo com as restrições de saúde de cada um."

A educadora física Samanta Zequini lembra que também é aconselhável consultar um médico para verificar a aptidão à atividade física. "É preciso ainda ter atenção na execução dos movimentos para que não haja lesões, respeitar o descanso e a pausa, saber os limites do corpo e principalmente ter consciência corporal, além de uma alimentação adequada. Fazer aquecimento ou alongamento antes do treino de calistenia também é importante."

Para os iniciantes, adaptar os exercícios é uma boa opção, como fazer flexões com os joelhos dobrados e apoiados no chão, em vez de ficar com as pernas esticadas, para facilitar a execução e evitar lesões.

Diversão

O estudante Luiz Otavio Mesquita, de 23 anos, fundou em 2013 o grupo Calistenia Brasil, que tem hoje dez atletas e mais de 50 grupos menores associados. Ele encara a hora de se exercitar mais como lazer do que compromisso com o corpo e a saúde.

"Sempre me divirto tentando fazer novos movimentos. Nem percebo que estou de fato praticando um esporte, e isso me ajuda até a tirar o foco de problemas que possa estar enfrentando", afirma Mesquita.

Morador de Brasília, Mateus Chiarini, de 20 anos, também diz ter aprimorado sua saúde física e mental após começar a praticar a modalidade.

"Considero mais um estilo de vida do que um esporte. Mesmo com a agenda apertada entre trabalho e faculdade, nunca deixo de lado, e levo o foco que tenho nas barras para outras áreas da vida, até as relações interpessoais."

Sua identificação com a calistenia foi tanta que ele resolveu mudar de curso na faculdade, de Geofísica para Educação Física.

Juntamente com um amigo que conheceu nos treinos e educadores físicos, ele oferece treinos gratuitos todos os domingos. "Em dois meses, já tínhamos 70 alunos", diz ele.

Para começar

Marco Tulio Bernardes, de 15 anos, também organiza um grupo que se reúne todos os dias para praticar calistenia na cidade mineira de Araguari.

"É preciso ter bastante força para executar os movimentos, mas, uma vez que você os domina, o desafio é domar a gravidade."