Topo

Inteligência artificial vence dermatologistas no diagnóstico de câncer de pele

iStock
Imagem: iStock

Fábio de Castro

28/05/2018 20h45

A máquina é mais eficiente que os humanos na hora de descobrir se um paciente tem câncer de pele, de acordo com um novo estudo. A pesquisa, realizada por um grupo internacional de cientistas, comparou diagnósticos de câncer de pele feitos por dermatologistas experientes a diagnósticos que foram obtidos por um método de inteligência artificial - e concluiu que os médicos foram menos eficientes.

Em um dos testes, os médicos detectaram com precisão 86,6% dos melanomas e o sistema de inteligência artificial conseguiu acertar 95% dos casos.

O novo estudo, publicado nesta segunda-feira (28) na revista científica Annals of Oncology, foi liderado por Holger Haenssler, professor do departamento de Dermatologia da Universidade de Heidelberg (Alemanha) e também teve participação de cientistas da França e dos Estados Unidos.

Os cientistas utilizaram 100 mil imagens de melanomas - o tipo mais agressivo de câncer de pele - para "treinar" uma rede neural convolucional (CNN, na sigla em inglês) a distinguir os tumores malignos e benignos.

As redes neurais são modelos computacionais inspirados no funcionamento do sistema nervoso central. A CNN é um tipo de rede neural bastante utilizada no processamento e análise de imagens digitais - ela é capaz de aprender com rapidez a partir de imagens e melhorar seu desempenho a partir desse aprendizado.

Leia também: 


"A CNN funciona como o cérebro de uma criança. Para treiná-la, nós mostramos a ela mais de 100 mil imagens de tumores de pele malignos e benignos e indicamos o diagnóstico correto para cada imagem. Só foram utilizadas imagens dermatoscópicas, que ampliam as lesões em 10 vezes. A cada imagem recebida, a CNN melhora sua capacidade de diferenciar entre lesões malignas e benignas", explicou Haenssler.

Depois de treinar a máquina, os pesquisadores compararam os resultados por ela obtidos a diagnósticos de melanoma feitos por 58 dermatologistas de 17 países. "Depois de finalizar o treinamento, nós criamos dois conjuntos de testes de imagens a partir de imagens de uma coleção que não foi utilizada no treinamento e, por isso, eram desconhecidas para a CNN", afirmou Haenssler.

Segundo ele, um conjunto de 300 imagens foi construído somente para testar a CNN. "Antes de fazer isso, 100 das lesões mais difíceis de distinguir foram selecionadas para testar dermatologistas de verdade e comparar seus resultados aos da CNN", disse o cientista.

Os testes foram divididos em dois níveis. No primeiro nível, os dermatologistas fizeram 100 diagnósticos de melanoma maligno ou benigno exclusivamente a partir de imagens dermatoscópicas e tomaram a decisão sobre o procedimento a ser adotado em cada caso: cirurgia, nenhum tipo de intervenção, ou acompanhamento a curto prazo.

Quatro semanas depois teve início o segundo nível de testes: os dermatologistas receberam informações clínicas sobre os pacientes - incluindo idade, sexo e posição da lesão - e imagens ampliadas das lesões dos mesmos 100 casos. Em seguida eles tomaram a decisão sobre as providências a serem tomadas.

No primeiro nível, os médicos detectaram com precisão 86,6% dos melanomas malignos, em média, e 71,3% dos melanomas benignos. Enquanto isso, a CNN conseguiu detectar 95% dos tumores malignos e 82,5% dos tumores benignos.

No segundo nível, os dermatologistas melhoraram o desempenho, mas ainda assim erraram mais que a inteligência artificial: detectaram 88,9% dos tumores malignos e 75,7% dos melanomas benignos.

A CNN teve uma sensibilidade maior que a dos dermatologistas e errou menos diagnósticos de melanomas malignos. Ela também fez diagnósticos errados de menos tumores benignos, o que significa que, além de mais sensível, também é mais específica - e isso significa que o método resultaria em número menor de cirurgias desnecessárias."

O cientista afirma que o desempenho dos dermatologistas melhorou quando eles receberam mais informações clínicas e as imagens do segundo nível de testes. "Ainda assim, a CNN, que trabalhou unicamente com as imagens dermatoscópicas e nenhuma informação clínica adicional, continuou a ter desempenho melhor que o dos médicos nos diagnósticos."

A incidência do melanoma maligno está aumentando em todo o mundo. De acordo com dados da Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer, há 232 mil novos casos da doença e 55,5 mil mortes por ano em todo o planeta. O tumor pode ser curado se a detecção for precoce, mas em muitos casos o câncer só é diagnosticado quando está em estágio avançado e o tratamento já é menos eficaz.

"Estou envolvido há mais de 20 anos em projetos de pesquisa sobre o aprimoramento da detecção precoce do melanoma em estágio curável. Meu grupo tem foco nas tecnologias não-invasivas que podem ajudar os médicos a fazer esse tipo de diagnóstico", disse Haenssle.

"Quando descobri que alguns algoritmos ligados ao aprendizado de máquina tinham desempenho melhor que o dos humanos em algumas tarefas específicas, imediatamente percebi que a inteligência artificial deveria ser explorada para o diagnóstico de melanoma", afirmou.

Ele afirma que o estudo tem algumas limitações. Uma delas é que os dermatologistas foram testados em um ambiente artificial e sabiam que não estavam tomando decisões de "vida ou morte". Outro aspecto é que os testes não incluíram toda a gama de lesões na pele.

Em um editorial sobre o estudo, publicado na mesma edição da Annals of Oncology, Victoria Mar, da Universidade Monash e Peter Soyer, da Universidade de Queensland - ambas da Austrália - afirmam que os resultados do estudo são promissores, mas também observam que a inteligência artificial precisará superar diversos obstáculos para se tornar um recurso padrão na clínica médica.

"Neste momento, não há substituto para um minucioso exame clínico. No entanto, a fotografia 2D e 3D é capaz de captar imagens de 90% a 95% da superfície do corpo e, levando em conta o desenvolvimento exponencial das tecnologias de imagem, nós imaginamos que mais cedo ou mais tarde o diagnóstico automatizado vai se tornar um paradigma na dermatologia. Ainda assim, há muito mais trabalho a ser feito para que essa tecnologia seja implementada de forma segura no atendimento clínico de rotina", escreveram.