Médica confundiu zika com alergia, conta mãe de bebê com microcefalia em PE
Carlos Madeiro
Colaboração para o UOL, no Recife
26/02/2016 06h00
No segundo mês de gravidez do pequeno Mauro, hoje com quatro meses, Isadora Correia Lima, 24, teve manchas vermelhas no corpo todo, principalmente no tronco e nas coxas. "Coçava muito, mas não tive febre ou dor", lembra. À época, abril de 2015, procurou um hospital particular do Recife (PE), onde a médica informou a ela que não havia motivo para preocupação.
Ela disse que era alergia e passou um remédio. Não desconfiei de nada, porque sempre tinha alergias. Tive algo parecido uma vez que comi camarão
Na 37ª semana da gestação, Isadora e o marido, o servidor estadual Rodrigo de Moura, 26, descobriram que Mauro tinha microcefalia. Ele nasceu no Imip (Instituto Materno Infantil Professor Fernando Figueira), no Recife, com 26 cm de perímetro cefálico --bebês com 32 cm ou menos são notificados como microcéfalos.
"Até então não sabíamos nada da ligação do vírus da zika com a microcefalia", conta a mãe. "Após o nascimento, uma pessoa da Secretaria de Saúde nos procurou, falou o que estava ocorrendo e pediu para retirar líquido da coluna dele para pesquisar".
Era ainda no começo desses casos, e ele foi um dos primeiros a passar por exames
Os exames do bebê e da mãe não apontaram outra causa infecciosa que pudesse resultar em microcefalia, o que só reforçou a tese de que o vírus da zika seria o principal causador do problema.
Desde então, a vida da família mudou. "Minha profissão agora é ser só mãe, é dedicação exclusiva", explica Isadora. "Não dá tempo para outra coisa."
Ela e Mauro, que moram em Olinda, na região metropolitana, precisam ir quase todos os dias para a AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente) da capital pernambucana, onde são acompanhados por uma equipe multiprofissional. O bebê já passa pelo processo de estimulação precoce.
Surto em Pernambuco
O Estado é o que mais registra casos confirmados de bebês com microcefalia ou alterações no sistema nervoso central relacionadas com a zika. Ali estão 209 dos 583 computados no país até o final de fevereiro. Outras 1.188 notificações estão em investigação.
O controle dos casos está sendo feito porque diversos estudos já ligaram o vírus à microcefalia, embora ainda não se sabia se a zika sozinha é a causa da microcefalia ou se há outro fator que, por exemplo, facilite a entrada do vírus na placenta para causar a má-formação.
Hoje, todas as crianças que nascem com 32 cm ou menos de perímetro cefálico são alvo de investigação e passam por exames de imagem e consultas com médicos para confirmação ou descarte de problemas neurológicos, que incluem também lesões oculares e auditivas.
Até o momento, os casos confirmados de microcefalia por infecção congênita no país praticamente se igualam aos dados de 2012 a 2014, quando a notificação ainda não era obrigatória --e levanta-se a hipótese de que os dados são menores do que a realidade. No entanto, os especialistas consideram que houve um aumento significativo de casos mais graves de microcefalia no último trimestre de 2015.
A OMS reportou uma associação entre a existência do zika e o aumento da incidência da síndrome de Guillain-Barré em Polinésia Francesa, Brasil, El Salvador, Martinica, Colômbia, Suriname, Venezuela e Honduras. Já com a microcefalia, a relação foi detectada no Brasil e na Polinésia Francesa.