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Bactérias da boca podem provocar infecção grave no cérebro, como de Banhara

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Imagem: Getty Images

Fernando Cymbaluk

Do UOL, em São Paulo

12/04/2017 13h43

Diversas bactérias vivem na nossa boca. Elas são importantes, participam do início do processo de digestão dos alimentos, mas podem causar infecções se estivermos vulneráveis. E se não for corretamente tratada, uma infecção no dente ou na gengiva pode virar um problema mais grave, se espalhar para outros órgãos, como pulmão, coração e cérebro e levar à morte.

A modelo Renata Banhara foi internada na última quarta-feira (5) no Hospital Albert Einstein com uma infecção bacteriana no cérebro e precisou passar por cirurgias. De acordo com um relato da própria modelo, uma bactéria que se alojou em um de seus dentes após um tratamento de canal se espalhou para os seios da face e chegou ao cérebro. Ela não teria sentido dor nem tido outros sintomas de inflamação no dente ou sinusite – como é chamada a inflamação nos seios da face. 

“A cavidade bucal possui uma quantidade enorme de micro-organismos, uma flora extremamente rica e diferenciada”, diz Waldyr Antonio Jorge, cirurgião bucomaxilofacial e diretor do Hospital Universitário da USP (Universidade de São Paulo). Contudo, quando temos uma inflamação ou ferida na boca, essas bactérias podem se proliferar neste local vulnerável e formar um foco infeccioso.

“Não é só o tratamento de canal que pode causar uma infecção mais séria, mas uma gengiva inflamada, um problema periodontal [do tecido de sustentação dos dentes]”, explica o cirurgião dentista Alexandre Bussab. Quando isso ocorre, nosso organismo emite sinais de alerta: dor, pus e febre. “A dor é o alerta para você procurar um dentista. Ou um otorrino, se for problema de amídala ou ouvido”, diz Waldyr Jorge.

Infecção pode ser silenciosa

Segundo os especialistas, uma infecção na boca pode, sim, ser silenciosa. Isso ocorre principalmente quando fazemos algum tratamento que acaba com a dor, mas não elimina o foco infeccioso – ou seja, as bactérias.

Exemplo disso é o chamado tratamento de canal, quando é necessário cuidar de problemas na polpa dentária, o tecido mole que fica no interior do dente. Uma cárie profunda ou uma fratura pode necrosar esse tecido com nervos e vasos sanguíneos, o que abre espaço para bactérias que causam infecção. Retirar o tecido elimina a dor. Mas se o local não for bem desinfetado, as bactérias permanecem ali e podem causar problemas maiores.

“Os microorganismos que ficam vão se proliferando, se infiltrando em tecidos mais tênues, mais frágeis, não só pelo osso”, diz Waldyr Jorge. Dessa forma, a infecção pode se espalhar para a mandíbula (arcada inferior) ou maxilar (arcada superior) da boca, e dali para outras partes, como órgãos do tórax, face e região intracraniana. “Pode desaguar em uma septicemia [infecção generalizada], quadra grave de infecção, que pode levar à morte”, completa o cirurgião.

Bactérias se espalham pelo corpo

As bactérias podem se espalhar tanto por proximidade como através da corrente sanguínea. Um problema comum decorrente de infecções graves na cavidade bucal é a colonização por bactérias de válvulas cardíacas e outras partes do coração – chamado de endocardite bacteriana. “Esse é um risco grande, pode acontecer com qualquer pessoa, desde que se tenha uma inflamação na boca”, afirma Bussab.

As bactérias que provocam infecções na boca também são combatidas pelo próprio organismo, que pode evitar que elas se espalhem. "Mas dependendo do grau de replicação e da agressividade da bactéria, ou se os anticorpos não a reconhecerem como invasor, pode ocorrer complicação", diz Fausto Nakandakari, otorrinolaringologista do Hospital Sírio Libanês.

Além disso, pessoas que possuem as defesas naturais do organismo mais frágeis, como crianças pequenas e idosos, ou que tenham imunidade reduzida por causa de doenças, como pacientes com câncer, estão mais propensas a sofrerem consequências graves de infecções.

"É quando os microorganismos quebram a resistência do corpo. Pode ocorrer por falta de alimentação [que provoca fraqueza], falta de cuidado [com os dentes], falta de sinais clínicos", diz Jorge. Quanto à endocardite bacteriana, corre mais riscos quem possui histórico de doenças cardíacas ou aparelhos na região do coração. 

Quando infecção vira sinusite

As bactérias da boca podem, por exemplo, colonizar os seios da face, provocando uma sinusite. “É uma infecção do seio da face. Quando não foi tratada, pode evoluir com complicações. Uma delas é intracraniana”, diz Nakandakari, otorrinolaringologista do Hospital Sírio Libanês.

O especialista explica que a causa mais comum de sinusite é gripal, provocada por vírus ou bactérias externas. A proliferação de bactérias nos seios da face causa inflamação, quadro típico da sinusite aguda. Contudo, dentre outras causas da sinusite estão a má conservação dentária, tumores e doenças benignas, como pólipo -- tumor benigno indolor.

No caso de Renata banhara, não há confirmação do que provocou a infecção no cérebro. Para os especialistas, uma sinusite provocaria sinais de alerta. Quanto à infecção dentária, a modelo afirma ter feito o tratamento de canal há seis anos. Jorge considera improvável que o tratamento tenha causado um problema agora, após esse longo período. "Seria uma reação, uma queda de resistência, muito tardia", afirma. 

Ida ao dentista e atenção aos sinais evita quadro grave

Para evitar infecções, tratamentos dentários precisam seguir todos os procedimentos de assepsia, que impedem entrada de germes. No caso de um tratamento de canal, a restauração do dente deve ser bem finalizada e o paciente deve retornar ao dentista periodicamente para verificar se não há problemas. "Às vezes a pessoa acha que está tudo bem, mas tem problema no estômago, no coração. Na boca não é diferente", diz Jorge. 

A OMS (Organização Mundial da Sáude) recomenda a ida ao dentista ao menos uma vez por ano. Nas consultas, o dentista deve fazer higenização dos dentes, verificar se há fratura, cárie e inflamação na boca, e fazer radiografias em caso de maiores suspeitas. Em um tratamento dentário, o dentista poderá avaliar a necessidade do paciente tomar antibióticos para evitar infecções.

A sinusite demanda os mesmos tipos de atenção aos alertas do corpo. “Quando existe algum sinal de sinusite, a orientação é procurar auxílio médico”, diz Nakandakari. Ele explica ainda que em caso da infecção alcançar a região intracraniana, é necessário internação hospitalar e, eventualmente, cirurgia para remoção de pus e bactérias.

O tratamento de infecções é sempre feito com antibióticos, que podem ser tomados por via oral ou venosa, em quadros graves. De acordo com os especialistas, é possível evitar quadros graves atentando para os sinais de infecção. São eles:

Infecção na boca

  • dor
  • pus
  • sangramento
  • eventualmente febre
  • CUIDADO: pode ser silenciosa. Por isso, é importante ir ao dentista uma vez por ano

Infecção nos seios da face

  • congestão nasal
  • saída de secreção do nariz
  • tosse
  • dor de cabeça
  • sensação de peso na cabeça e face
  • diminuição do olfato

Infecção intracraniana

  • febre
  • mal estar
  • agitação (pessoal fica facilmente irritável)
  • dor de cabeça de intensidade maior e latejante
  • confusão mental