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Podemos usar fezes de cães e gatos como adubo para as plantas?

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Imagem: Getty Images

Paula Moura

Do UOL, em São Paulo

27/04/2017 04h00

Se fezes de vacas, galinhas e até porcos são usadas como adubo em fazendas, por que não aproveitar os excrementos dos nossos bichinhos de estimação?

É possível aproveitar sim, mas não basta recolher as fezes e jogar sobre o vaso ou deixar na grama, pois os dejetos podem estar contaminados.

“Tanto cães como gatos podem ser portadores de agentes patogênicos que podem causar infecção em humanos”, diz Vanete Soccol, especialista em parasitologia veterinária e professora da UFPR (Universidade Federal do Paraná).

Por isso, deixar as fezes dos cães e gatos na rua, em jardins ou parques é prejudicial.

Os cães podem eliminar ovos de Toxocara canis, que pode causar lesões no fígado, ou cistos de Cryptosporidium e de Giardia duodenalis, que  causam diarreia. Os gatos podem estar infectados também por oocistos de Toxoplasma gondii, que causa lesões oculares e pode levar a microcefalia em bebês.

“As fezes desses animais devem ser adequadamente tratadas. Se deixados no ambiente, poderão ser levados com água das chuvas para rios, lagos, etc. e contaminar outras pessoas.”, diz Vanete.

Ela lembra que mesmo os adubos provenientes do esterco de vaca e galinha precisam passar por compostagem, pois carregam bactérias como ovos de Mammomonogamus laryngeus no caso dos bovinos, que podem infectar a traqueia das pessoas, Escherichia coli, entre outros.

Como deve ser feita a compostagem?

17.abr.2017 - Compostagem termofílica em cilindros - Morada da Floresta/Divulgação - Morada da Floresta/Divulgação
Compostagem termofílica em cilindros
Imagem: Morada da Floresta/Divulgação
No caso de fezes de animais, a composteira mais comum, com minhocas não é indicada. Ela é apropriada para compostar alimentos, segundo Cláudio Spínola, da empresa especializada em compostagem orgânica Morada da Floresta.

Isso porque é preciso se certificar que as minhocas comam todo o material orgânico, o que é bem difícil e deve ser feito por uma análise química.

A forma mais segura para compostar fezes de animais é a chamada compostagem termofílica, usada para volumes maiores de fezes. Usam-se bactérias termofílicas que elevam a temperatura do material até a 70ºC por semanas e matam assim os agentes patogênicos.

O tamanho recomendado é um metro cúbico, assim os resíduos de poucos animais não são suficientes. Elas levam 90 dias para transformar as fezes em adubo.

E seria possível usar fezes humanas?

Acento de banheiro feito pelo Coletivo Ocupação Verde, com tubos de pasta de dente. A cooperativa compra placas feitas com tubos de pasta de dente moídos e prensados pela empresa Ecotop e transforma em Banheiros secos compostáveis são banheiros que dispensam o uso de água, onde o tratamento dos dejetos é realizado com material seco através do processo de compostagem - Divulgação - Divulgação
Banheiro seco
Imagem: Divulgação
Mesmo as fezes humanas podem ser usadas para adubar florestas e algumas plantações. Contudo, precisam passar por um tratamento especial de sistema de esgoto.

Esse sistema existe em algumas cidades brasileiras, como Botucatu (SP), e em outras partes do mundo já é usada há décadas. Geralmente é mais fácil de ser aplicado em cidades menores pela dificuldade de se tratar grandes quantidades de esgoto.

O resultado do tratamento se chama “lodo de esgoto” e é usado para fertilizar plantações de milho e outras culturas com grandes extensões, reflorestamento e paisagismo. No Japão, o lodo de esgoto vira até bioenergia.

No Brasil, de 1994 a 2006, um estudo com participação da pesquisadora da UFPR Vanete Soccol chegou a uma normatização para o uso do lodo na agricultura. O tratamento elimina as principais ameaças contidas nas fezes humanas: ovos de helmintos (populares vermes), cistos de protozoários e bactérias.

Em outra técnica, chamada de biofiltro, o banheiro usa água na descarga. Os dejetos são armazenados em um tonel de 200 litros com brita, fibras (serragem, bambu, etc) e minhocas.

Clóvis de Oliveira, botânico e pesquisador da USP (Universidade de São Paulo), lembra que além de patógenos, fezes e urina humanas são contaminadas com substâncias químicas presentes em remédios como anticoncepcionais, e metais. Por isso, o uso desse material como adubo teria restrições para cultivo de verduras. “Precisam ser usadas em culturas em que o alimento fica longe do solo”, diz.