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Medidas de contenção podem reduzir taxa de contaminação se aplicadas cedo

25.mar.2020 - Pouca movimentação nas ruas da cidade de São Paulo (SP) durante quarentena por causa do coronavírus - DANILO M YOSHIOKA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
25.mar.2020 - Pouca movimentação nas ruas da cidade de São Paulo (SP) durante quarentena por causa do coronavírus Imagem: DANILO M YOSHIOKA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Carolina Marins

Do UOL, em São Paulo

30/03/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Medidas requerem de duas a três semanas para começar a influenciar na desaceleração da taxa
  • Ainda é cedo para analisar as medidas de contenção brasileiras
  • Isolamento, restrições à circulação e testagem em massa são considerados exemplos de sucesso no mundo

Um estudo do Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde, que reúne pesquisadores da Fiocruz, PUC-Rio e Instituto D'or de Pesquisa e Ensino, demonstrou que a implementação de medidas de contenção logo após a notificação dos primeiros casos de covid-19 pode levar a um impacto positivo na redução da propagação da pandemia.

O estudo comparou curvas de contaminação de diversos países e identificou que, na Coreia do Sul, onde as medidas foram aplicadas logo após as primeiras confirmações de contágio, a curva sofreu um achatamento. Na Itália, no entanto, onde houve demora na adoção de tais medidas, a curva ainda não apresentou mudanças significativas para conclusões.

Os pesquisadores observaram que esses resultados positivos, de medidas como isolamento social e fechamento de estabelecimentos, podem levar até duas semanas para aparecer.

"As medidas de contenção e isolamento social, uma vez implementadas, ainda requerem um tempo razoável para começar a influenciar na desaceleração da taxa de crescimento do número de casos confirmados (cerca de uma ou duas semanas, pelo que se observou em outros países)", dizem os pesquisadores.

A China impôs quarentena em 23 de janeiro, quando tinha 199 casos confirmados fora da província de Hubei — por ser o epicentro, a província recebeu uma análise à parte. Em oito dias, em 31 de janeiro, foi observada uma mudança de concavidade na curva, indicando uma desaceleração dos números. Em 16 dias, em 8 de fevereiro, observou-se a suavização da curva, indicando um declínio mais expressivo na taxa de crescimento.

A Coreia do Sul agiu ainda mais rápido e, antes mesmo de atingir 20 casos, impôs restrição de entrada àqueles que vinham de Hubei em 4 de fevereiro. A recomendação de isolamento veio no dia 20 de fevereiro, quando havia apenas 104 casos. A mudança na concavidade da curva logarítmica ocorreu oito dias depois, e a desaceleração na taxa de crescimento ocorreu 14 dias depois do isolamento.

Os pesquisadores ressaltam que a primeira medida retardou o crescimento da curva de propagação no país. A medida de testagem em massa também contribuiu e a própria cultura sul-coreana influenciou para o sucesso nas medidas de contenção.

Já em países que optaram tardiamente por medidas como o isolamento, não se percebe o mesmo resultado. A Itália decretou quarentena em 9 de março, quando já tinha 9.172 casos. Antes, o país adotou o fechamento de fronteiras e escolas, mas já quando apresentava milhares de casos.

A curva em escala logarítmica apresenta pequenas quebras na curva em seis e 14 dias. Contudo, segundo o estudo, isso pode ser reflexo das medidas de contenção regionais e não das nacionais.

Algumas regiões, como a província de Lodi, tomaram medidas antes de atingir cem casos, e agora repetem a curva da China e Coreia do Sul. Por outro lado, Lombardia e Bérgamo tomaram medidas mais tarde e ainda não apresentam redução na curva de casos. O mesmo se repete na Espanha, onde regiões que optaram por isolamento mais cedo apresentam resultados melhores hoje.

A curva brasileira e projeções para hoje

Ainda é cedo para analisar as medidas de contenção brasileiras, principalmente porque elas estão sendo tomadas em nível regional. São Paulo decretou quarentena a partir do último dia 23. No Rio de Janeiro, a medida começou no dia 24.

Porém, projeções anteriores feitas pelo núcleo e repercutidas pelo UOL foram comparadas com o crescimento real dos números e mostraram que o Brasil caminha para um cenário otimista de contaminados.

A projeção, feita em 16 de março, mostrava que até o dia 26 deste mês o Brasil tinha três possíveis cenários: o pessimista, no qual teríamos 4.970 casos; o mediano, com 3.750 casos; e o otimista, com 2.314. Segundo dados do ministério da Saúde, divulgados no dia 26 de março, o Brasil tinha 2.915 casos oficias, mais próximo da projeção otimista.

Como ainda é cedo para atribuir o resultado positivo às medidas de contenção, o grupo acredita que "a subnotificação, um baixo volume de testagem e a demora nos resultados dos testes confirmatórios, possam ter afetado os valores reportados pelo Ministério da Saúde e pelas secretarias estaduais, de forma a estarem abaixo do que eles são na realidade", escreve.

Utilizando a mesma metodologia do estudo anterior, ou seja, baseando-se no comportamento brasileiro em comparação com um grupo de países, até o dia de hoje, o Brasil pode ter uma média de 6.375 casos confirmados. Na projeção pessimista, mais de 11 mil casos.

"Se o crescimento se mantiver dentro do cenário otimista, espera-se uma curva menos acentuada, atingindo um total de 3.555 casos. Entretanto, caso as medidas de contenção não sejam eficazes (ou a população deixe de respeitá-las mesmas), pode-se chegar a um total de 11.548 casos (cenário pessimista)", dizem os pesquisadores.

O núcleo também fez projeções para os estados de São Paulo e Rio de Janeiro, que concentram os maiores números de casos.

São Paulo ficou muito abaixo das projeções feitas no dia 16 de março. No cenário otimista, São Paulo chegaria a 1.573 casos no dia 26 de março, mas no dia o estado registrava 1.052 casos, segundo a secretaria de saúde. Segundo o estudo, a discrepância pode apontar baixo nível de testagem, subnotificação ou atraso na notificação dos casos.

Para o dia 30, o grupo prevê um aumento significativo no número de casos. Na média, pode-se esperar 2.792 casos até lá. No cenário mais otimista, o estado pode ter 1.557 e, no cenário pessimista, 5.059 casos.

O Rio de Janeiro seguiu o cenário mediano esperado. A projeção até o dia 26 mostrava 278 casos no melhor cenário, 596 no pessimista e 450 no mediano. Até o dia 25 o estado tinha 421 casos confirmados, segundo a secretaria de saúde.

Até o dia de hoje, o estado pode ter 769 casos em média. "Destaca-se que, pelas projeções do cenário mediano, há um crescimento de 482% no intervalo de 10 dias, sem levar em consideração o possível efeito atenuante pela adoção da política de contenção, realizada rapidamente pelo Estado do Rio de Janeiro", diz o documento. No cenário otimista o estado terá 429 casos, no pessimista chega a 1.392.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado na reportagem, a projeção inicial foi feita no dia 16 de março, e não de maio. O texto foi corrigido.