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Ministro há 18 dias, Teich ainda não buscou hospitais privados

Agente de saúde transporta corpo para caminhão refrigerado em hospital do Rio de Janeiro - RICARDO MORAES
Agente de saúde transporta corpo para caminhão refrigerado em hospital do Rio de Janeiro
Imagem: RICARDO MORAES

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

05/05/2020 04h01

Resumo da notícia

  • Apesar de sobrecarga no SUS, novo ministro da Saúde ainda não buscou rede privada
  • A informação é de principais representantes do setor
  • Teich substituiu Mandetta, que entrou em atrito com Bolsonaro, na metade de abril

No cargo desde 17 de abril, o ministro da Saúde, Nelson Teich, ainda não procurou os principais representantes de hospitais privados e planos de saúde — que poderiam ser alternativas para dar vazão aos atendimentos para o novo coronavírus que já não conseguem ser absorvidos pelo sistema público de saúde.

A FBH (Federação Brasileira dos Hospitais), que representa 15 associações estaduais que respondem por mais de 4.000 hospitais particulares —parte deles conveniados ao SUS —, afirmou que não houve nenhum contato do ministério, "mesmo diante de um momento tão delicado, em que muitos estabelecimentos da rede pública já apresentam sinais de colapso".

"A FBH tem defendido que o enfrentamento à epidemia somente será efetivo se contar com a união entre os setores público e privado. A entidade entende que seria muito mais fácil e pertinente, além de menos oneroso aos cofres públicos, realizar esse trabalho em parceria, contratando leitos que já estão devidamente prontos para atender, do que gastar elevadas cifras na estruturação de hospitais improvisados, ou de campanha", diz a nota da Federação.

A federação também afirmou que "ainda aguarda uma oportunidade para conversar e levar as pautas do setor" e diz que "não foi atendida, muito menos abriu qualquer tipo de negociação durante a gestão do ministro Mandetta".

Outra organização de peso na área, a Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados), também afirma que até a última segunda (4) não havia sido contatada pelo ministério. A organização tem mais de 120 membros, entre eles os hospitais como Albert Einstein, Oswaldo Cruz e Sírio-Libanês.

Uma representante dos convênios particulares, a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), também se diz à disposição do ministério e afirma que não houve até o momento "nenhuma reunião formal com o ministro da Saúde Nelson Teich".

"A Abramge se mantém à disposição do Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde Suplementar, e demais órgãos competentes, pela busca por soluções", diz nota enviada à reportagem.

O ministério da Saúde não havia comentado o posicionamento das associações até o fechamento desta reportagem. As considerações da pasta, quando enviadas, serão incorporadas a este texto.

Filantrópicos foram contatados, mas ministro só pediu tempo

Uma das poucas entidades contatadas pelo substituto de Luiz Henrique Mandetta (DEM), a CMB (Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas), afirmou que Teich foi cordial e educado, mas não fez nenhuma sugestão ou pedido específico.

"Ele nos pediu um prazo para podermos voltar a conversar, disse que queria verificar o setor, mas não houve qualquer proposta concreta. Mas ele foi atencioso, me ligou e pediu tempo para que pudéssemos sentar e discutir", diz o presidente da CMB, Mirocles Campos Véras Neto. Segundo ele, "ainda há espaços" nos hospitais filantrópicos para atender aos pacientes com o coronavírus.

Neto também criticou os estados, os quais, segundo ele, não levaram em conta os hospitais filantrópicos quando traçaram os planos de contingência. "Mesmo assim, continuamos de portas abertas", afirma. A instituição representa 2.172 hospitais sem fins lucrativos em todo o país (sendo que 1.704 atendem o SUS) e responde por 50% de todo o atendimento da saúde pública.

Mesma situação há mais de um mês

No início de abril, reportagem do UOL já havia reportado que o governo não tinha um "plano B" para lidar com a saturação do SUS, nem buscado ajuda do setor privado em meio ao crescimento nas taxas de ocupação de leitos de enfermaria e de UTI (Unidade de Terapia Intensiva).

À época, havia pouco mais de 10 mil casos registrados pelo governo e 432 mortes ao todo. Hoje, o país registra, em média, 390 mortes diárias, levando em consideração os últimos sete dias.

O panorama atual é obscuro, uma vez que não há contagem oficial sobre as taxas de ocupação das estruturas. Amazonas, Rio de Janeiro e Pernambuco, por exemplo, já têm mais de 90% das UTIs ocupadas. No último, há filas para quem precisa de tratamento intensivo. Em São Paulo, segundo dados divulgados ontem, 82% dos leitos de UTI dos hospitais municipais estão ocupados.

Segundo o ministério da Saúde, o país tem ao menos 27.656 leitos de UTI que pertencem à rede privada.

Ministério afirmou que estava "monitorando"

A lei de quarentena deu à União, aos estados e aos municípios poder para requisitar "bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas, hipótese em que será garantido o pagamento posterior de indenização justa".

Mas o ministério da Saúde, até a publicação desta reportagem, não informou objetivamente um planejamento para que leitos e estruturas de hospitais privados sejam contratados.

No começo de abril, o então secretário executivo do Ministério da Saúde, João Gabbardo dos Reis, disse ao UOL que iria "passar a monitorar, a acompanhar a utilização dos leitos de UTI, tanto da rede do SUS, quanto da rede privada". A fala, no entanto, é anterior às mudanças no ministério. Tal qual o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM), Gabbardo foi exonerado do seu cargo no meio da crise da pandemia.