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Com covid-19, maio se torna o mês com mais mortes na história do Brasil

28.mai.2020 - Enterro de vítimas de coronavírus no Cemitério do Cajú (São Francisco Xavier) no Rio de Janeiro Imagem: SAULO ANGELO/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

25/06/2020 04h00

Maio de 2020 já é o mês com o maior número de registros de óbitos feitos por cartórios na história do Brasil. Até a manhã desta quinta-feira (25), haviam sido registradas 123.861 declarações de pessoas que morreram em todo o Brasil, sendo 24.111 pela principal causa: a covid-19.

O número de mortes no mês passado representa uma alta de 13,1% em relação a maio de 2019, quando os cartórios registraram 109.479 declarações de óbito no Brasil.

Historicamente, o mês de julho é o que registra maior número de mortes no país devido à maior circulação de vírus respiratórios (veja abaixo). Há, ainda, o fato de que problemas cardiovasculares são afetados por doenças virais respiratórias, e o aumento dessas doenças faz com que esse número fique ainda mais significativo nos meses de julho.

Um mês mortal

Os dados, entretanto, ainda podem crescer, já que o Portal da Transparência da Arpen (Associação dos Registradores de Pessoas Naturais) é abastecido com informações enviadas pelos cartórios que podem levar alguns dias para informar o óbito ao sistema nacional.

O UOL consultou o banco de dados do SIM (Sistema de Informações sobre Mortalidade), do Ministério da Saúde —que também tem como base a causa-morte indicada nas certidões. Não há registro de um mês tão mortal como foi maio de 2020.

No portal da Arpen são cadastradas as declarações de óbito, mas não há especificação de todas as causas de morte. Isso é feito pelo SIM, que leva em torno de um ano para analisar os dados e os disponibilizar à divulgação pública. Por conta da covid-19, a Arpen criou um outro portal para detalhar apenas as mortes por covid-19 e doenças respiratórias em tempo real. As demais causas, ficam registradas como "demais óbitos".

A plataforma do ministério traz dados detalhados de mortes e suas causas desde 1996 até 2018. Os números de 2019 ainda estão em fase final de apuração para divulgação. Antes de 1996, não há relatos históricos que apontem para uma mortalidade tão alta em apenas um mês.

Ao longo do tempo, com o crescimento da população e a explosão da violência urbana, o número de mortes mensais foi aumentando. A primeira vez que o país passou da marca de 100 mil mortes foi em janeiro de 2011. De lá para cá, tornou-se algo recorrente que o dado alcançasse os seis dígitos.

Até maio de 2020, o mês com o maior número de óbitos já registrados no país havia sido julho de 2017, quando 122.610 pessoas morreram no Brasil das mais diversas causas. Naquele ano, ressalte-se, os números mensais foram puxados para mais por conta da guerra de facções, que fez o país ter recorde de homicídios.

Julho e o histórico de mortes

O mês de julho, historicamente, é o que registra maior número de mortes no país. Em 2018, por exemplo, foram 119.675 mortes. No ano passado, 118.097.

O professor da UnB (Universidade de Brasília) e integrante do Serviço de Pneumologia do Hospital Universitário de Brasília, Ricardo Martins, explica que o número mais alto de mortes nos meses de julho ocorre pela maior circulação de vírus respiratórios no país.

"São as doenças do inverno, aqueles quadros de gripe, de problemas por causas respiratórias. Isso começa ali por abril e chega a julho no pico. E já está bem demonstrado que problemas cardiovasculares são afetados por doenças virais respiratórias. Então acredito que esse aumento dessas doenças faça com que esse número fique ainda mais significativo nos meses de julho", afirma.

Situação inédita

Martins ainda ressalta que a situação dramática causada pela covid-19 é inédita para profissionais de saúde de sua geração.

"Nunca tivemos uma complicação desse nível, com tantas mortes por uma causa em tão curto tempo. Não tenho dúvidas de que esse vai ser o maior problema nos últimos 100 anos", compara.

Além da alta em maio, Martins prevê dias difíceis pela frente no país por causa do novo coronavírus em junho e julho, ao menos. "É uma doença de altíssimo grau de contagiosidade e que está sobrecarregando hospitais —não só UTIs, mas também enfermarias. É uma coisa impressionante e angustiante. A gente vai acompanhando e só vê aumentar a mortalidade", lamenta.

Sobrecarga no sistema

Em maio, a mortalidade atingiu em cheio as metrópoles, que tiveram uma superprocura por hospitais —o que sobrecarregou serviços de saúde. "Foi sem dúvida nosso mês de pico. Os casos surgiam em todas as classes sociais. Pensei que fôssemos ter um colapso no atendimento hospitalar e ambulatorial", conta Artur Gomes Neto, diretor médico da Santa Casa de Maceió.

No maior hospital particular de Alagoas, 94 mortes por covid-19 foram registradas em maio. O hospital chegou a ficar totalmente ocupado com 144 pacientes internados de um só vez —ontem, esse número era bem menor: 102 pessoas, 38 delas em leitos de UTI (unidade de terapia intensiva).

O professor e pesquisador na área de doenças infecciosas da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e do IMIP (Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira), Luís Carlos Arraes, afirma que não há como pensar em qualquer outro fator que justifique uma alta tão grande de mortes em maio deste ano que não a covid-19.

"Os dados comprovam aquilo que já era até esperado, que houvesse um aumento na mortalidade em geral. A única coisa que aconteceu para justificar isso foi a epidemia do coronavírus", afirma.

A mortalidade geral só não é maior, diz Arraes, porque no período de isolamento social houve uma queda natural em outras causas de morte, como acidentes de trânsito e complicações geradas por cirurgias eletivas (que foram suspensas por causa da pandemia).

"Realmente é uma tragédia sem precedente recente. Esse número de mortes por covid-19, apesar de altíssimo, ainda está bem abaixo do real. Basta ver a quantidade de mortes por SRAG [Síndrome Respiratória Aguda Grave], que tiveram aumento, mas não tem a causa dela. E com essa interiorização do vírus pelo país, temo que a gente vai perder mais dados", lamenta.

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