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Em reunião tensa, Anvisa suspende agrotóxico suspeito de causar câncer

Eduardo Militão

Do UOL, em Brasília

21/06/2022 16h46Atualizada em 22/06/2022 13h49

Em uma reunião tensa nesta terça (21), 3 dos 5 diretores da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) decidiram pela suspensão preventiva de produção, importação, venda e distribuição do agrotóxico carbendazim no Brasil. Um dos 20 defensivos agrícolas mais usados no país, o fungicida está banido na Europa e nos Estados Unidos por suspeita de causar câncer e malformação de fetos.

A suspensão é imediata e vale até a conclusão do julgamento do caso, no dia 8 de agosto. A presidente substituta da Anvisa, Meiruze Freitas, afirmou que o uso do agrotóxico também está suspenso.

No meio da reunião, a relatora do processo, Cristiane Jourdan, que já indicava ser a favor da proibição do agrotóxico, abandonou a sessão virtual, sem chegar a participar da votação sobre a suspensão do produto. Os outros diretores presentes — Meiruze Freitas, Alex Campos e Romison Mota — votaram a favor. Em viagem fora do país, o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, não votou.

A confusão começou quando Meiruze anunciou a possibilidade de inverter a ordem do julgamento. Primeiro seria analisado o voto da relatora do caso, Cristiane Jourdan, e, depois, seria avaliada uma medida preventiva para suspender o agrotóxico até a conclusão do processo de avaliação do veneno.

Meiruze decidiu, porém, que a suspensão temporária do defensivo agrícola seria analisada primeiro. Cristiane reclamou: "Não tem porque eu apresentar meu voto se a deliberação da diretora Meiruze for apresentada antes".

Segundo Cristiane, a decisão provisória de suspender o veneno poderia não ter um efeito melhor do que a proposta que ela traria ao processo.

Eu me retiro da reunião e levarei isso aos órgãos de controle, ao Ministério Público, porque entendo que houve questão de se bloquear a leitura do voto da relatora"
Cristiane Jourdan, diretora da Anvisa, ao deixar a reunião

Em resposta a Cristiane, Meiruze afirmou que ela teria toda a liberdade para manifestar seu voto na reunião. "A decisão da diretora Cristiane foi uma decisão unilateral de não seguir o processo", disse.

Alex Campos disse a saída da relatora provocou "desconforto". "O acontecimento de hoje é um sobressalto. As divergências são naturais, mas não podem conduzir a este ambiente."

O diretor Romison afirmou que a saída de Cristiane foi "uma pena" e "lamentável". Em meio à tensão, o colegiado adiou uma reunião prevista para esta quarta para debater outros temas. "Não vejo clima", afirmou Romison.

Agência tomará decisão em 5 de agosto

Após a votação desta terça e um subsequente intervalo, a reunião na Anvisa foi retomada. Sem Cristiane na sala virtual, a presidente substituta da agência, Meiruze assumiu a relatoria do processo e fez uma nova proposta, que foi aprovada. Ela propôs dispensar o relatório de análise de impacto regulatório preliminar, que defendeu o banimento do agrotóxico, e suspendeu a tomada pública de subsídios.

No lugar deles, será feita uma consulta pública até 11 de julho. A relatora dessa consulta foi sorteada: será Cristiane Jourdan. Haverá um cronograma, que inclui uma reunião da Diretoria Colegiada até 5 de agosto, com publicação de resolução em 8 de agosto.

Além disso, Meiruze propôs que, caso o agrotóxico venha a ser definitivamente banido em 5 de agosto, se abra a possibilidade de ser definido um prazo de três meses para a retirada do produto de circulação — ou seja até novembro.

"Caso a decisão final da Anvisa seja por fazer algum esgotamento [o consumo dos estoques remanescentes], seria por três meses", disse Meiruze. Mas isso não foi decidido ainda. O diretor Alex Campos disse que é necessário analisar temas como a "logística reversa" e os estoques. "Mas tudo isso no tempo certo. Por ora, freio de arrumação."

Justiça apressou Anvisa

A Anvisa só iniciou o processo de reavaliação do agrotóxico em 2019, após uma ordem judicial proferida em julho de 2019. A ordem era concluir a análise em seis meses. Mas, como mostrou o UOL, em abril, depois de dois anos, a agência tomou uma decisão que adiou uma das etapas do processo de análise do agrotóxico. Neste mês, a 6ª Vara Federal de Brasília ordenou que a Anvisa concluísse a reavaliação do agrotóxico em 60 dias.

A área técnica da Anvisa já havia se posicionado para banir completamente o carbendazim das lavouras do Brasil. O veneno é utilizado em culturas como soja, milho, laranja e maçã.