reprodução automática próximo vídeo em 5s

Zika: Um ano após surto, dúvidas sobre o vírus permanecem

Ao longo das próximas décadas, as condições ambientais do Brasil (e de outras regiões menos favorecidas do planeta) ficarão ainda mais apropriadas para o mosquito. O aumento da temperatura local e global, consequência das atuais emissões de gases do efeito estufa, tende a impulsionar a proliferação do inseto em lugares hoje frescos demais para ele (no laboratório da Unesp de Botucatu, os ovos, as larvas e os adultos são mantidos a uma temperatura constante de 26,5°C).

Além disso, modelos matemáticos que tentam projetar como será o clima do futuro indicam um aumento dos chamados eventos climáticos extremos --coisas como estiagens prolongadas seguidas de temporais violentos, que concentram boa parte das chuvas em períodos curtos. Para uma espécie que aposta na sazonalidade como estratégia, por meio dos ovos capazes de ficar em animação suspensa, o cenário parece tranquilo e favorável.

Esses eventos extremos poderiam ter um efeito focalizado, potencializando certos surtos, pondera Ribolla. De fato, é impressionante como o mosquito está adaptado a essa sazonalidade. Não é que a população cresça na chuva e diminua na seca: a população é constante, só que no período úmido você vê os adultos voando, enquanto na seca é como se houvesse um banco de ovos esperando a próxima chuva.

O pesquisador da Unesp conta ter presenciado o que parece ter sido um exemplo, em pequena escala, do que pode acontecer no futuro, ao estudar os arredores do campus onde trabalha. Até 2013-2014, Botucatu quase não tinha dengue autóctone, ou seja, transmitida por mosquitos do próprio município. O normal era a doença estar associada a pessoas que tinham viajado para outros lugares, e depois surgiam mais alguns casos em torno dessas pessoas.

O curioso é que o Aedes estava presente na região, conforme indicavam coletas feitas pela equipe da Unesp desde 2004. A gente imaginava que, por estar numa região um pouco mais alta e mais fria [800 metros acima do nível do mar], Botucatu não seria tão propícia ao inseto, explica Ribolla.

Aí, em 2014-2015, começaram a aparecer centenas de casos autóctones. Alguma coisa mudou nos últimos dois ou três anos, possivelmente algo relacionado à densidade populacional do Aedes.

A grande capacidade de adaptação do mosquito faz com que a maioria dos especialistas desconfie de soluções aparentemente milagrosas para detê-lo. Eu não vejo nenhuma ferramenta tecnológica capaz de substituir totalmente o combate aos criadouros, diz Ribolla.

As mudanças nada auspiciosas no comportamento da espécie no interior paulista são, de certa forma, um microcosmo do que está acontecendo no mundo todo. O mosquito já consegue se manter ao longo de todo o ano em regiões nas quais ainda não tinha se fixado: a Califórnia, a orla do mar Negro, Washington e a ilha da Madeira, conforme conta Jeffrey Powell, da Universidade Yale, em artigo publicado no fim de novembro na revis