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Fortnite e o sucesso da estratégia do gratuito que sai caro

7ª temporada do game foi lançada nessa quinta-feira (6) - Reprodução
7ª temporada do game foi lançada nessa quinta-feira (6) Imagem: Reprodução

07/12/2018 08h44

Com sua sétima temporada lançada nesta quinta, o game Fortnite tem se tornado mais do que um passatempo - é um fenômeno global.

Não é qualquer jogo que tem sua própria marca de roupas ou vira referência para as comemorações de gols de jogadores da seleção da Inglaterra em plena Copa do Mundo.

A popularidade do game vem crescendo desde que foi criado, em 2017. Hoje, tem 200 milhões de usuários registrados no mundo todo e já chegou a ter 3,4 milhões de pessoas jogando simultaneamente.

O jogo de sobrevivência combina exploração, construção de edifícios e batalhas em primeira pessoa e pode ser acessado em mais de um dispositivo - é possível, por exemplo, começar uma partida no computador e transferi-la posteriormente para o console ou para um dispositivo móvel.

Para além de sua popularidade, o Fortnite simboliza uma série de transformações que vêm acontecendo gradualmente no mercado de games.

Ele marca uma mudança estética nos videogames: o retorno a um design estilizado, a inversão na tendência de jogos de ação com gráficos cada vez mais realistas.

E é talvez o melhor exemplo do auge de um novo modelo comercialização que se consolidou nos últimos anos.

O Fortnite é de graça: não é preciso pagar para baixá-lo. A empresa ganha dinheiro com a venda de itens customizados para o jogo e outros tipos de conteúdo para download (os chamados DLCs).

E, embora maior parte dos games para computador e para consoles ainda seja paga, esse modelo de muitas atualizações e muito conteúdo para download também se estende aos jogos pagos. Cada vez mais, graças aos conteúdos baixáveis, o jogo que você compra inicialmente é muito diferente da versão que estará jogando depois de meses ou anos.

Os jogos estão sendo vendidos mais como um serviço do que como um produto. E, para o usuário, isso acaba saindo mais caro: muitas pessoas gastam mais com esse conteúdo extra do que com o jogo original. E, mesmo em casos como o do Fortnite, em que o custo inicial é baixo, a experiência completa passa longe de ser de graça.

Os gastos feitos enquanto se joga (como de itens personalizados), as chamadas compras "in-game", também são o modelo principal de comercialização de jogos para smartphones e tablets.

Indústria milionária

O Fortnite é um dos exemplos mais bem-sucedidos desse modelo, mas outras grandes marcas, comoCall of Duty e Fifa, seguem o mesmo roteiro.

No Reino Unido, em 2017, jogadores gastaram 2,67 bilhões de libras em jogos digitais para computador e para dispositivos móveis, incluindo os gastos com compras "in-game".

Como comparação, os tradicionais jogos de videogames que você compra completos, para usar em um console, como um Playstation ou um X-Box, movimentaram 790 milhões de libras.

No mundo, o mercado de jogos digitais deve ter uma receita de US$ 137,9 bilhões em 2018, com 75% vindo de jogos para dispositivos móveis ou para computador, que costumam adotar modelo de comercialização como o do Fortnite.

No Brasil, o mercado de games movimentou US$ 1,3 bilhão (R$ 5 bilhões) em 2017. Para 2018, a previsão é de US$ 1,5 bilhão (R$ 5,8 bilhões), segundo a consultoria Newzoo. Esse valor vem de um conjunto de 75,7 milhões de jogadores no país.

Entre os jogadores que gastam dinheiro no Brasil, 83% compraram itens dentro do jogo entre janeiro e julho de 2018.

A Epic Games, empresa que é dona do Fortnite, não divulga o quanto lucra com o game. Mas a agência Bloomberg estima que a companhia, com todos os seus produtos, valha hoje entre de US$ 5 bilhões (R$ 19 bilhões) e US$ 8 bilhões (R$ 31 bilhões).

Rápida evolução

A indústria de jogos enfrenta desafios quanto à regulação, já que é um universo que evolui muito rápido - diferentemente da legislação.

Há muita preocupação com o fato de que, em alguns setores do mundo de jogos online, seja difícil distinguir entre o que é videogame e o que são jogos de azar (proibidos no Brasil desde 1945 e também em vários lugares do mundo).

A Comissão para Jogos de Azar do Reino Unido afirma que "há diversos sites de terceiros oferecendo apostas ilegais ligadas a videogames populares", onde jogadores podem apostar sobre coisas como o valor de seu inventário de armas virtuais.

Um estudo feito por psicólogos da Universidade de Adelaide, na Austrália, afirma que o sistema de microtransações encontrado nos jogos online diminui a distância entre jogar e apostar, e pode ser um risco para jogadores mais vulneráveis, especialmente os mais jovens.

E em setembro, a OMS (Organização Mundial de Saúde) adicionou uma definição de doença psicológica ligada a games em sua Classificação Internacional de Doenças.

Um porta-voz do Fortnite disse que a maioria das versões do jogo permite que os pais estabeleçam um limite de gasto e restrições de idade.

E quem estiver preocupado com interações com outros jogadores pode desligar a função de conversas dentro do jogo.

E não só o setor de regulação, a indústria como um todo teve que evoluir para acompanhar as últimas inovações.

Tradicionalmente, ela era dominada por títulos grandes, trabalhados por centenas de pessoas e que custavam milhões para serem desenvolvidos - e que também saíam caro para o consumidor final.

No entanto, jogos como Fortnite custam menos para fazer e são distribuídos de graça, embora sejam bastante lucrativos quando conseguem manter as pessoas engajadas em compras in-games e com as frequentes atualizações.

Na sétima temporada de Fortnite, lançada nesta quinta, os jogadores têm mais elementos personalizados, mudanças no mapa e adições como neve no cenário e aviões.

Podem parecer ajustes pequenos, mas, ao adicionar conteúdo novo, mudar o mapa e atualizar o que os jogadores podem ver e fazer, os desenvolvedores estão tentando dar ao público razões para não abandonar o game - e continuar gastando.