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Agora vai? Cientistas entram na caçada às notícias falsas e seus autores

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Helton Simões Gomes*

Do UOL, em Belo Horizonte

25/10/2018 04h00

Se identificar uma notícia falsa é uma complicação para você, saiba que você não está sozinho. O mesmo acontece com outros brasileiros. O problema é tão comum que cientistas entraram na jogada para criar ferramentas que deem uma mãozinha. Entre o que estão criando, há desde indicadores de credibilidade e de confiança de uma notícia até sistemas que traçam a trajetória de modificações sofridas por um texto até que tenha virado uma fake news.

O UOL Tecnologia acompanhou a entrega de bolsas de pesquisa feita pelo Google a projetos de toda América Latina. Das 26 propostas vencedoras que dividiram financiamento de R$ 2 milhões, 17 eram brasileiras. Destas, três delas propunham a criação de sistemas voltados a combater notícias falsas.

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Para se ter ideia de como o assunto caiu de vez no gosto dos pesquisadores brasileiros, o agronegócio e a vida no campo, importante componente da vida social brasileira, também motivou outros três projetos.

"São soluções muito interessantes para problemas difíceis", diz Berthier Ribeiro-Neto, cientista-chefe do centro de engenharia do Google para América Latina, que fica em Belo Horizonte (MG). "O problema de fake news, por exemplo, a gente não tem uma solução boa, mas há propostas interessantes. São plataforma de transparência, em que quem resolve o problema não são os tecnólogos, mas, sim, a sociedade toda."

Dois dos projetos preveem a criação de um sistema de credibilidade da notícia.

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Entenda
 

"É um sistema de reputação para notícias em redes sociais", explica Manoel Horta Ribeiro, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Essa reputação será calculada a partir de vários elementos que giram em torno daquele texto. "A ideia é que, ao invés de olhar só para as noticias, a gente use as interações dos usuários com a notícia e o comportamento das fontes de notícias."

No primeiro momento, o sistema aprenderia com jornalista quais são os critérios para que uma notícia seja falsa. A partir daí, identificaria se essas características estão presentes em outros textos, que seriam apontados como suspeitos. A ferramenta também levaria em conta se usuários acostumados a postar notícias falsas estão se interessando por aquele texto, além de considerar se a fonte do artigo já foi flagrada outras vezes como disseminadora de desinformação.

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"Funciona mais ou menos assim: cada vez que posta uma notícia, você distribui um pouquinho da sua credibilidade. Se é uma boa notícia, você ganha reputação. Se é falsa, você perde. Se você compartilha muita notícia falsa, quando você compartilhar uma noticia ela vai ser considerada suspeita", explica Ribeiro.

Esse sistema não seria disponibilizado aos usuário e, sim, para as redes sociais, que poderiam usar o índice de credibilidade como um critério para o algoritmo mostrar com maior ou menor destaque uma determinada postagem.

Outra ferramenta que pretende criar um "placar da confiança" é a de Fabrício Benevenuto e Júlio Cesar Soares dos Reis, também da UFMG. Uma das principais diferenças é que a plataforma deles não seria direcionada para as redes sociais e, sim, para as empresas de checagem de informação.

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"A ideia não é passar o sistema para qualquer pessoa. Queremos criar uma aplicação para quem vai checar os fatos, gerar rankings de perspectivas diferentes para o próprio jornalista decidir quais são as informações relevantes para rotular", diz Benevenuto.

O sistema indicaria uma probabilidade de a notícia ser falsa e listaria os motivos para isso, como o site de onde ela partiu ser citado recorrentemente por agências de checagem.

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Entenda

Os pesquisadores ressaltam que os algoritmos desempenharão um papel apenas auxiliar. O poder de decisão continuará a ser das pessoas. "A gente não acha que tenha uma solução computacional que vai dizer se isso é verdadeiro ou falso, não", diz Soares dos Reis.

O outro projeto que chamou a atenção do Google é o de Anderson Rocha e Antônio Carlos Theóphilo Costa Júnior, da Unicamp. Eles estão desenvolvendo uma forma de identificar a autoria de uma postagem na internet usando apenas o estilo do texto. O método é pensado para auxiliar em investigações policiais, mas também pode ser aplicado para averiguar de onde partiu uma fake news ou como ela tomou corpo ao longo do tempo.

Anderson Rocha, professor da Unicamp: desafio é achar paciente zero da infestação de notícias falsas - Divulgação/Google - Divulgação/Google
Imagem: Divulgação/Google

"Quando alguém se apodera de uma conta de rede social e faz uma ameaça a alguma outra pessoa, o dono daquela conta pode sempre alegar que não foi ele. Como verifica isso? Você tem que descobrir o padrão de comunicação daquela pessoa para poder casar com os posts que ela diz que não são dela", explica Rocha.

O desafio aqui, conta Rocha, é "achar o paciente zero" de uma infestação de notícia falsa. Para conseguir fazer isso, diz, o sistema "analisa estilo de cada pessoa: letra maiúscula ou minúscula, substantivo, artigos e verbos usados como frequência, a riqueza ou a pobreza do vocabulário, o uso de onomatopeias ou emojis".

* O jornalista viajou a convite do Google