Topo

Documentos secretos: Facebook debateu sobre usar dados e rastrear usuários

Documentos secretos do Facebook tornaram-se públicos nesta quarta - Chip Somodevilla/Getty Images/AFP
Documentos secretos do Facebook tornaram-se públicos nesta quarta Imagem: Chip Somodevilla/Getty Images/AFP

Gabriel Francisco Ribeiro

Do UOL, em São Paulo

05/12/2018 14h13

O Parlamento Britânico publicou nesta quarta (5) trechos de documentos secretos do Facebook como parte de sua investigação contra notícias falsas e o escândalo da Cambridge Analytica. Nas 250 páginas que foram a público, há indícios de que o Facebook atuou para prejudicar concorrentes, além de discussões envolvendo o que fazer com dados de usuários - a rede social, por exemplo, tinha ciência do perigo de rastrear usuários do Android e checava que apps eles usavam para comprar empresas no futuro.

Os documentos incluem emails enviados e recebidos por Mack Zuckerberg, executivo-chefe da empresa, e outros executivos de alto escalão do Facebook. Um deles, por exemplo, mostra que a companhia atuou para prejudicar o Vine, serviço falecido do rival Twitter que envolvia a publicação de vídeos curtos.

Veja também:

Em uma conversa com colegas, Zuckerberg recebe o relato de que o Twitter havia lançado o Vine e tem a indicação de que a empresa deveria cortar o acesso do Twitter à API do Facebook - o Vine permitia achar amigos pela rede social de Mark Zuckerberg. Em resposta, o fundador da rede social diz: "sim, faça isso".

Os legisladores britânicos tomaram os documentos no último mês do fundador da empresa Six4Three, um desenvolvedor que está processando o Facebook nos Estados Unidos por matar seu serviço que envolvia fotos de biquínis. Os papéis estão sigilosos sob ordem Judicial da Califórnia, mas vieram a público pelo privilégio do Parlamento do Reino Unido.

Dados de usuários

Presidente do Comitê que investiga o Facebook no Parlamento, Damian Collins colocou junto aos documentos o que considera seis trechos essenciais. Isso inclui que o Facebook teria tentado esconder de usuários de celulares Android que estava coletando dados de ligações e textos, caso isso se tornasse um problema de relações públicas.

A companhia também aparentemente coletou dados sobre usos de apps de celulares de usuários da rede social - supostamente sem o conhecimento deles - para determinar quem seriam seus maiores rivais e quais plataformas o Facebook poderia comprar.

Segundo o parlamentar, os documentos então secretos ainda mostram que o Facebook autorizou alguns aplicativos para que, mesmo após a mudança de privacidade em 2014 e 2015, desenvolvedores ainda pudessem ter acesso a dados que pertenciam a amigos de usuários utilizadores das plataformas.

Collins ainda diz que um tema recorrente nos papéis era ligar o acesso de aplicativos a dados de amigos de acordo com o valor financeiro da relação dos desenvolvedores com o Facebook.

Os documentos ainda mostram que Zuckerberg participou ativamente da compilação de uma lista de competidores "estratégicos", decidindo quais eles iriam restringir acesso a conteúdos valiosos. Um memorando sem data diz que o próprio Zuckerber revisou pessoalmente a lista. 

Os papéis também apontam que a maior ameaça considerada pelo Facebook não era um simples app ou serviço rival, mas "vários deles" diferentes sendo oferecidos aos usuários. Atualmente, o Facebook comanda a maioria dos aplicativos de redes sociais mais usados no mundo - como o próprio Facebook, o WhatsApp e o Instagram.

Em outro email, Zuckerberg chegou a admitir que o que é bom para o mundo não necessariamente é bom para o Facebook. Isso apareceu em uma discussão sobre aplicativos de terceiros terem acesso à plataforma do Facebook. 

"Entretanto, isso pode ser bom para o mundo, mas não é bom para nós a não ser que as pessoas também compartilhem conteúdo de volta no Facebook e esse conteúdo aumente o valor da nossa rede", apontou o executivo no email interno. 

Uma das grandes revelações dos documentos também é que a companhia discutiu a possibilidade de cobrar um valor para outras pessoas acessarem dados de seus usuários. Em um email de outubro de 2012, Zuckerberg chega a discutir um modelo em potencial de monetização. Nesse caso, os dados de cada usuário custariam, para o fundador da rede social, apenas US$ 0.10 por ano.

É importante notar que a divulgação desta quarta inclui apenas trechos dos documentos obtidos pelo Parlamento - principalmente alguns negativos para a rede social. 

Um porta-voz do Facebook afirmou ao Business Inisider que "os documentos que a empresa Six4Three obteve para seu caso sem base são só uma parte da história e são apresentados de uma maneira que leva a interpretações erradas sem contexto".

"Os fatos são claros: nunca vendemos os dados das pessoas. Nós ficamos ao lado das mudanças da plataforma feitas em 2015 que impediram que um usuário entregasse os dados dos amigos. Como muitos negócios, nós tivemos muitas conversas internas sobre várias maneiras que poderíamos construir um modelo sustentável de negócio na nossa plataforma", diz o Facebook.

Já Mark Zuckerberg apontou que o escrutínio da rede social no caso é "saudável", mas pediu que as ações reveladas não sejam interpretadas de forma errada ou sem motivo. O fundador da rede social volta a citar a mudança na plataforma entre 2014 e 2015 para justificar que apps mal intencionados não são permitidos. 

Como qualquer organização, tivemos muitas discussões internas e muitas ideias levantadas pelas pessoas. Consideramos ideias como cobrar desenvolvedores pelo uso da nossa plataforma, como Amazon AWS e Google Cloud fazem, mas decidimos contra

Mark Zuckerberg

Ações do Facebook caem

Após a divulgação dos documentos, as ações do Facebook passaram a cair pouco mais de 2%. Há o temor de que o documento faça legisladores crescerem os olhos para tomarem ações contra a empresa. 

Ele previu o infocalipse, agora teme pela democracia

Leia a entrevista