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'Haverá conflito': Huawei sobe o tom contra ofensiva de Trump

Ren Zhengfei, fundador da Huawei - AFP
Ren Zhengfei, fundador da Huawei Imagem: AFP

Márcio Padrão

Do UOL, em São Paulo

21/05/2019 16h32

Resumo da notícia

  • Fundador da Huawei, Ren Zhengfei, diz que EUA subestimam empresa
  • Cedo ou tarde, Huawei terá conflito com o país americano, diz executivo
  • Frases são resposta ao boicote comercial imposto por Donald Trump

Como era de se esperar, o fundador e executivo-chefe da Huawei, Ren Zhengfei, não ficou muito feliz com a decisão do governo americano de colocar sua empresa em uma lista de boicote comercial, que por sua vez gerou restrições de suas empresas parceiras nos EUA, como Google, Intel e Qualcomm. E falou, em um tom que pode ser interpretado como ameaça: "Vai haver conflito".

Zhengfei disse nesta terça-feira (21), para a agência de notícias AFP, que o governo norte-americano subestima sua empresa, enquanto o presidente Donald Trump faz tudo que é possível há meses para bloquear as ambições internacionais da gigante chinesa das comunicações.

A teoria da cúpula da Huawei é que o governo Trump quer frear a Huawei sobretudo no ascendente mercado da quinta geração da telefonia, a 5G. A Huawei é a empresa que se diz mais avançada para fornecer a infraestrutura para essa conexão.

Trump alega que a empresa pode espionar os EUA, embora nunca tenham provado isso. Zhengfei há tempos critica os EUA por essa postura e diz que a empresa continua crescendo, apesar disso tudo.

"Os políticos americanos, com sua forma de atuar, demonstram que subestimam nossa força", declarou Ren Zhengfei em entrevista à imprensa transcrita ao vivo por meio do aplicativo móvel da CCTV, a televisão estatal chinesa.

"A rede 5G da Huawei não será afetada. Em matéria de tecnologia 5G, para que as outras empresas alcancem a Huawei será preciso dois ou três anos", prometeu Ren Zhengfei, referindo-se aos grupos americanos e europeus.

"Nós sacrificamos a nós mesmos e nossas famílias. E isso por um ideal: alcançar o topo do mundo", disse o fundador da Huawei. "E para atingir esse ideal, mais cedo ou mais tarde haverá um conflito com os Estados Unidos".

Outro argumento da empresa é que os EUA estão indo contra seus próprios ideias de liberalismo econômico, com o Estado se impondo sobre o livre mercado.

O vice-presidente da Huawei na Europa, Abraham Liu, advertiu que, no futuro, algo parecido pode acontecer "a qualquer outra companhia internacional". "Não é unicamente um ataque contra a Huawei. É um ataque contra a ordem liberal baseada em regras", disse.

Ele prometeu ainda que a companhia vai se esforçar para dissipar as dúvidas sobre os supostos riscos de espionagem da parte do grupo chinês.

"Dada a importância do 5G, como líder do setor, a Huawei está disposta a assinar acordos de não-espionagem com os governos e clientes em todos os países da UE", ressaltou.

Entenda o caso

Na semana passada, a Casa Branca proibiu que as empresas americanas comercializem no setor de telecomunicações com empresas estrangeiras consideradas "de risco" para à segurança nacional. Entre elas está a Huawei.

Número dois mundial de smartphones e líder da tecnologia 5G (a quinta geração de tecnologia móvel), a Huawei é alvo do governo Trump desde 2018, num contexto de guerra comercial e de rivalidade tecnológica entre Pequim e Washington, que culminou na prisão temporária da filha do fundador, Meng Wanzhou, de dezembro a fevereiro.

Depois que Trump incluiu a Huawei em sua lista de boicote, na segunda-feira (20) o Google --cujo sistema Android equipa a maior parte dos smartphones do mundo --anunciou que cortaria os laços com o grupo chinês. Assim, deixará de ter acesso a alguns serviços do Android e aos populares aplicativos Gmail e Google Maps.

Grandes fabricantes de semicondutores, como a Qualcomm e a Intel, informaram a seus funcionários que também deixarão de vender para a Huawei, de acordo com a agência de notícias Bloomberg.

No final da segunda-feira, o Departamento de Comércio dos Estados Unidos suspendeu por 90 dias parte das sanções. O secretário de Comércio dos EUA, Wilbur Ross, disse que a suspensão foi aplicada para garantir às empresas americanas um período de transição para cumprir a medida.

Ren Zhengfei considerou que a medida tem "pouco sentido" e anunciou que seu grupo e o Google "discutem" para buscar soluções para a proibição.

Enquanto isso, a Huawei lançou seus novos smartphones da série Honor 20 em Londres nesta terça-feira, mas não fez referência a uma possível ruptura com o Google.

O que dizem analistas

A proibição de comércio imposta pelos Estados Unidos pode afetar não apenas a Huawei, mas outras grandes empresas americanas que fornecem semicondutores ao grupo chinês, segundo especialistas do setor. Afinal, ainda que estejam atendendo às ordens do governo, perderão muito dinheiro da sua (até então) cliente chinesa se o veto durar muito tempo.

"Também poderia ter um efeito paralisante na Huawei", considera Roger Kay, analista da Endpoint Technologies Associates. "Se não tiverem bases financeiras sólidas, poderão entrar num círculo fatal. Mas se, pelo contrário, tiverem os bolsos cheios, poderão escapar".

Com um corte total de acesso à tecnologia americana, o gabinete de assessores Eurasia Group avalia que a Huawei "sem dúvidas não poderia sobreviver em seu formato atual".

"Não há nenhuma possibilidade de que a empresa sobreviva de forma duradoura (...) sem acesso à cadeia de fornecimento mundial", afirma a Eurasia.

A Huawei de fato criou sua própria filial de produção de chips eletrônicos, a HiSilicon. Mas ainda não está claro se ela será afetada diretamente ou indiretamente pelas sanções americanas.

* Com agências AFP e EFE

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