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Medo do vírus zika toma o Rio antes do carnaval

26/01/2016 19h25

Rio de Janeiro, 26 Jan 2016 (AFP) - Faltam dez dias para o carnaval do Rio de Janeiro, e o temor pelo vírus zika continua aumentando.

Transmitido pelo mosquito Aedes aegypti e associado a uma explosão de casos de bebês com microcefalia, o estado de alerta da turística Cidade Maravilhosa se estende até agosto, quando recebe os primeiros Jogos Olímpicos da América do Sul.

"A preocupação é enorme, porque o Rio é uma cidade de grandes eventos", afirmou, nesta terça-feira o porta-voz da Secretaria de Saúde do Rio, Marcos Vinícius Ferreira, durante a efervescência do Sambódromo, onde serão realizados em 7 e 8 de fevereiro os suntuosos desfiles das escolas de samba.

As comemorações de pré-carnaval nas ruas, os bloquinhos, já começaram no final de semana, e essa grande aglomeração de pessoas facilita a circulação do vírus.

O ministro da Saúde, Marcelo Castro, admitiu que o Brasil está "perdendo feio" na guerra contra o mosquito e destacou que o grande aliado do cidadão a pé é o repelente, especialmente para as grávidas.

"Nas primeiras semanas, estava nervosa de verdade. Não saía mais de casa", relatou a promotora fiscal Manuela Mehl, de 37 anos, que contou à AFP sua experiência após saber da conexão entre o zika e a microcefalia no começo de sua gravidez, considerado o período mais perigoso para o feto.

"Meu médico disse que devia me proteger, que a única coisa que eu poderia fazer era evitar ser picada", acrescentou, enquanto mostrava as dezenas de frascos de repelente que correu para comprar, sabendo que, nas lojas, já estavam praticamente esgotados.

'Teria adiado a decisão'O Aedes aegypti, que também transmite a dengue e a chikungunya, tem a seu favor "a urbanização desordenada e os programas de controle de baixa capacidade", explicou à AFP o epidemiologista Roberto Medronho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

"É muito difícil controlar o mosquito no Rio, onde um terço da população vive nas favelas com inúmeros espaços de proliferação", acrescentou.

A prefeitura aproveitou o carnaval para lançar uma campanha de conscientização, pedindo às pessoas que evitem deixar água parada em suas casas, já que favorecem os focos do mosquito.

Na terça-feira, 15 agente sanitários, vestidos com trajes amarelos e máscaras de gás, borrifaram com inseticida os 900 metros da avenida do Sambódromo, assim como as arquibancadas, com capacidade para 70 mil pessoas.

A prefeitura do Rio também assegurou que "as inspeções serão intensificadas para os Jogos Olímpicos de agosto, ainda que seja um período em que haja menos mosquitos" devido ao inverno.

Castro chegou a recomendar expressamente às mulheres que "evitem ficar grávidas neste momento", embora a advertência oficial seja a de que se protejam do mosquito usando repelente.

"Nós queríamos este segundo filho, mas se eu soubesse de tudo isto teria adiado a decisão de ficar grávida, assim não me estressaria tanto", confessou Mehl, lembrando que o aborto no Brasil só é permitido em casos de estupro, quando a vida da mãe está em perigo, ou no caso de o feto não conseguir desenvolver o cérebro.

A infecção se manifesta com sintomas de gripe (febre, dor de cabeça e cansaço) e erupções cutâneas.

'A ponta do iceberg'As embaixadas do Reino Unido e da França emitiram mensagens de precaução a seus atletas e cidadãos no Brasil, enquanto o governo dos Estados Unidos recomendou às mulheres grávidas que evitem viajar para a América Latina.

O zika "continuará se espalhando" para todo o continente americano, com exceção do Canadá e Chile, alertou a Organização Mundial de Saúde (OMS) na segunda-feira, o que vê como "um motivo sério de preocupação".

O Brasil anunciou que usará 200 mil homens do Exército em operações de combate ao mosquito.

Desde 2015, foram detectados 3.893 casos de microcefalia em bebês - sobretudo, nas regiões do nordeste do Brasil -, uma má-formação na cabeça que altera o desenvolvimento intelectual e que está provavelmente ligada ao vírus zika, contraído pela mãe e transmitido pela placenta, segundo o Ministério da Saúde.

Em 2014, 147 casos foram registrados.

"Ao longo dos anos, podem surgir outros problemas, como a surdez, no caso da rubéola. Isto, sem dúvida, é apenas a ponta do iceberg", advertiu Medronho, que comparou a situação com "a da talidomida (um medicamento sedante) nos anos 1960, quando tivemos uma geração de bebês sem braços e pernas".

"Há um risco de bebês microcéfalos com neuropatias, que não poderão estudar, nem trabalhar. É uma tragédia para as famílias, geralmente as mais pobres. A epidemia passará, mas as pessoas com microcefalia estarão aqui, e isso sobrecarregará o sistema de saúde", destacou o pesquisador.

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