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Família síria enviada de volta a Damasco chora pelo sonho americano destruído

31/01/2017 11h20

Damasco, 31 Jan 2017 (AFP) - Ao pousar na Filadélfia, Estados Unidos, a síria Josephine Abu Asale, cristã, e os sete parentes que a acompanhavam sentiram que aquele era o início de uma nova vida, longe de seu país em guerra. Mas o sonho virou rapidamente um pesadelo.

Treze anos depois de ter apresentado um pedido de imigração, a família cristã recebeu o tão desejado visto em outubro.

E na sexta-feira concluíram um périplo iniciado em Damasco e que passou por Beirute, Amã e Doha, antes de chegar a Filadélfia.

"A viagem durou 20 horas", explica Josephine, de 60 anos, à AFP em seu apartamento do bairro de Tijara, em Damasco.

No desembarque no aeroporto americano, um agente pegou os passaportes e levou todos para um corredor.

"Comecei a ficar nervosa", recorda Josephine.

- 'Você está brincando?' -Os minutos seguintes permanecerão em sua memória para sempre.

"O agente voltou e disse que nossos vistos haviam sido anulados, que nossa entrada estava proibida nos Estados Unidos", pelo decreto do presidente Donald Trump que afeta os cidadãos de sete países de maioria muçulmana.

"Eu perguntei em inglês: 'You're kidding, right?' (Você está brincando, certo?). E ele respondeu: Parece que eu estou brincando?".

Josephine, o marido Basam e o restante da família continuam em choque.

"Pensei que havia uma acusação pessoal contra nós, e não um decreto geral", explica Basam, de 62 anos.

"Não sabíamos que um decreto havia sido assinado enquanto estávamos no avião", afirma o patriarca, enquanto exibe o visto americano no passaporte, com um risco azul que indica a anulação.

"Estávamos tão felizes por ter recebido o visto para viajar até a América do Norte. Há tantos países que não dariam um visto a cidadãos sírios", completa.

- 'Um sonho bonito' -Quase 20 malas continuam espalhadas pela casa da família.

"Passamos 15 dias comprando presentes para nossos amigos. Nós estávamos tão felizes arrumando as malas", recorda Josephine.

"Agora não tenho forças para abrir as malas e retirar os presentes".

Para o irmão de Basam, o golpe foi ainda pior: ele havia vendido a casa e seu carro com a ideia de começar uma vida nova na Filadélfia, onde mora seu filho Tufiq. Ele viajava acompanhado pela esposa, a filha Sara e outros três filhos.

No apartamento dos tios, Sara, de 20 anos, não tira os olhos do smartphone, onde lê as últimas notícias de seus compatriotas que são obrigados a voltar ao áís pelas autoridades americanas.

Nenhum integrante da família viu Tufiq nos últimos três anos.

"O mais duro foi que minha mãe estava a poucos metros do meu irmão e não conseguiu abraçá-lo", conta a jovem.

"Ela começou a chorar (...) e pensei que meu pai iria desmaiar", recorda, com tristeza.

Depois de tentar explicar a situação sem sucesso, a família foi escoltada para um avião e obrigada a retornar a Damasco.

"Não tivemos acesso nem a um advogado nem a um tradutor. Nos privaram de nossos direitos mais básicos em um país que afirma defender os direitos humanos", lamenta.

Para Sara, o sonho americano virou um grande vazio.

"Eu me despedi de todos os meu amigos de infância, dos meus vizinhos, de todos os lugares que amo", explica.

Depois de obter o visto, ela começou a imaginar sua nova vida. Sara lia sobre os Estados Unidos e sobre a universidade em que desejava estudar.

"Foi um sonho bonito", afirma com melancolia.