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Repressão com gás lacrimogêneo marca protestos do 1º de maio na Venezuela

01/05/2017 20h59

Caracas, 1 Mai 2017 (AFP) - As forças de segurança da Venezuela reprimiram com bombas de gás lacrimogêneo protestos opositores em Caracas durante um dia de manifestações a favor e contra o governo de Nicolás Maduro, neste 1º de maio, quando se completa um mês de protestos no país.

Um grupo de manifestantes opositores entrou em uma base militar do leste de Caracas, após quebrar parte de uma grade de proteção, durante um protesto contra o presidente Nicolás Maduro, nesta segunda-feira.

O incidente aconteceu na Base Aérea Generalíssimo Francisco de Miranda - conhecida como La Carlota -, quando um grupo de pessoas derrubou uma parte do alambrado, comprovou uma equipe da AFP.

Grupos de manifestantes entraram no prédio em várias ocasiões, sendo expulsos com gás lacrimogêneo e disparos de borracha.

Os manifestantes atiraram pedras e coquetéis molotov nas forças de ordem.

Mais cedo, tinham tentado chegar ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) e ao Conselho Nacional Eleitoral (CNE), ambos no centro da cidade, onde milhares de partidários do governo liderados por Maduro se concentraram para celebrar o Dia do Trabalhador.

Tanto o TSJ quanto o CNE são acusados pela oposição de servir ao governo.

Como acontece há um mês, as marchas opositoras tentaram, sem sucesso chegar ao coração da cidade, considerado um reduto do chavismo, mas as forças de segurança as barraram com gás lacrimogêneo e tiros de borracha.

Além de La Carlota, foram registrados distúrbios em outros setores do leste e do oeste da capital.

No oeste de Caracas, um deputado ficou ferido na cabeça. Outros protestos opositores, que exigiam eleições gerais, também ocorriam em cidades do interior do país.

"Estou em pé de guerra até que Maduro se vá. Isto é uma ditadura disfarçada", declarou à AFP Matilde Rodríguez, de 67 anos, moradora do popular bairro Petare, na Praça Altamira, reduto opositor.

As manifestações, que deixaram 28 mortos, centenas de feridos e detidos, começaram em 1º de abril em repúdio a decisões com as quais o máximo tribunal atribuiu-se as funções do Parlamento, de maioria opositora, e retirou a imunidade dos deputados.

As duas medidas foram anuladas em meio a uma forte pressão internacional, mas os opositores consideram que o "golpe de Estado" do Executivo e do Judiciário continua.

Os opositores a Maduro também exigem a realização de eleições gerais, culpando o presidente pela grave crise econômica e política que vive a Venezuela.

'Assembleia Cidadã'O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou nesta segunda-feira um processo para criar uma nova Constituição, sem voto universal, mas por setores populares, ao completar um mês dos protestos da oposição que exigem sua saída do poder.

"Convoco (...) para conseguir a paz de que necessita o país, para derrotar o golpe fascista, uma Constituinte cidadã, não de partidos políticos. Uma Constituinte do povo", disse Maduro a uma multidão de seguidores reunidos no centro de Caracas para comemorar o Dia do Trabalhador.

Maduro explicou que serão eleitos 500 representantes, uma parte por setores da sociedade e outra por municípios, que formarão uma Assembleia Constituinte "popular, cidadã, operária", que redigirá a Carta Magna que substituirá a de 1999.

A Constituição vigente, impulsionada pelo falecido presidente Hugo Chávez (1999-2013), foi redigida por 131 constituintes eleitos por voto direto, universal e secreto, e em seguida aprovada em referendo.

A liderança opositora rejeitou a convocação de Maduro, advertindo que ela aprofunda a crise política e reafirma uma tentativa de "golpe de Estado" contra o Parlamento, pois o que se pretende é convocar uma Constituinte "escolhida a dedo".

Maduro "quer dar um salto de uma vez a um sistema tipo [o de] Cuba", denunciou Julio Borges, presidente do Parlamento, único dos poderes controlado pela oposição.

"Diante da fraude constitucional da Constituinte que o ditador acaba de anunciar, povo na rua a desobedecer semelhante loucura!", reagiu o líder opositor e ex-candidato à Presidência, Henrique Capriles.

O deputado opositor Henry Ramos Allup assegurou que "o que Maduro convocou não é uma constituinte, mas uma 'prostituinte'".

"Assumo as consequências"Maduro pede diálogo e diz querer eleições. Mas ele se refere às de governadores - que deveriam ter sido celebradas em 2016 -, descartando a antecipação das presidenciais.

Mas nesta segunda-feira, elevou o tom: "Querem diálogo? Poder Constituinte. Querem paz? Poder Constituinte. Querem eleições? Poder Constituinte. Originário, plenipotenciário, operário, popular. Assumo todas as consequências", desafiou.

No fim de semana, o papa Francisco pediu o fim da violência no país e renovou a oferta de ajudar em um diálogo, mas com "condições muito claras", ao lembrar o processo fracassado que o Vaticano acompanhou no fim de 2016.

A oposição reafirmou em carta sua negativa a uma negociação "se não há garantias". "Continuamos somando aliados no mundo e o único que fica isolado é Maduro", disse Borges.

Oito países latino-americanos apoiaram o papa, pediram negociações com "condições claras" e a libertação de "presos políticos", o que foi rechaçado pelo governo, que considerou os apelos uma "ingerência".

Acusando-a de impulsionar uma intervenção estrangeira, a Venezuela iniciou na semana passada sua saída da Organização dos Estados Americanos (OEA), enquanto a Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) se reunirá nesta terça-feira em El Salvador para discutir a crise.

A convulsão política se dá em meio a uma situação econômica complicada. O país com as maiores reservas de petróleo do planeta, sofre com uma severa escassez de alimentos e medicamentos e uma inflação, a mais alta do mundo, que o FMI estima em 720% para 2017.

Neste domingo, véspera do Dia do Trabalhador, Maduro elevou o salário mínimo mensal - salário básico e bônus alimentar - a 200.000 bolívares (280 dólares na taxa oficial, mais alta, e 50 dólares no mercado paralelo).

A oposição afirma que o reajuste salário mostra "o desastre econômico" e que a crise será resolvida quando Maduro deixar o poder. Segundo pesquisas privadas, seu governo, que termina em janeiro de 2019, é rejeitado por sete em cada dez venezuelanos.