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Temer chama Exército após protesto violento; crise se aprofunda no País

25/05/2017 01h15

Brasília, 25 Mai 2017 (AFP) - O governo convocou tropas do Exército, nesta quarta-feira (24), para proteger prédios públicos em Brasília atacados durante um protesto maciço para exigir a saída do presidente Michel Temer, encurralado por acusações de corrupção.

Os manifestantes destruíram prédios públicos e provocaram incêndios, em mais uma dia difícil para o governo Temer, cada vez mais isolado e com sua base de apoio fragilizada.

"Neste momento há tropas federais aqui (no Palácio do Planalto) e no Palácio do Itamaraty, e já estão chegando tropas para garantir a proteção dos prédios ministeriais", anunciou o ministro da Defesa, Raul Jungmann.

"O senhor presidente da República decretou, por solicitação do presidente da Câmara [Rodrigo Maia] uma ação de garantia da lei e da ordem", anunciou Raul Jungmann.

O governo alegou que alguns manifestantes puseram em risco a vida de funcionários públicos ao atacarem vários ministérios com paus e pedras. E reforçou que a ordem - vigente até o próximo dia 31 e que implica a mobilização de 1.500 militares - havia sido tomada pelo presidente, que luta por sua sobrevivência política há uma semana.

A decisão costuma ser tomada para apoiar a Polícia em momentos de segurança crítica, ou de grandes eventos como os Jogos Olímpicos, mas é sensível em um país que viveu a ditadura militar entre 1964 e 1985.

Convocar o Exército é "uma medida extrema do governo Temer, e o sinal claro de que se perdeu o controle, com consequências muito ruins para nossa democracia e para as instituições", disse o analista político André Cesar, sócio da consultoria legislativa Hold em Brasília.

Nessa mesma linha, mas em tom moderado, posicionou-se o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), aliado de Temer.

Para quem viveu a ditadura, "a questão da presença militar é sempre uma coisa que nos assusta", disse o parlamentar, um dos nomes aventados para uma possível sucessão.

'Cena de guerra'Aos gritos de "Fora, Temer!", a manifestação, convocada pela esquerda e por sindicatos, reuniu entre 35 mil e 100 mil pessoas, segundo as autoridades e os organizadores, e foi predominantemente pacífica.

Perto do fim, porém, grupos de jovens encapuzados atacaram vários ministérios ao longo da avenida que leva ao Congresso e conseguiram invadir uma sala do Ministério da Agricultura, à qual atearam fogo. A polícia respondeu com bombas de gás lacrimogêneo e de efeito moral.

Os confrontos deixaram 49 feridos, incluindo um homem baleado, sete detidos e danos em oito ministérios, além da Catedral de Brasília, segundo as autoridades.

"Estou indo embora, porque isso já é uma cena de guerra", disse à AFP Fabio Ferreira, funcionário do Ministério do Planejamento, ao reportar distúrbios no prédio onde trabalha.

'Temer vai cair'No Congresso, também se vivia um clima de efervescência, diante dos sinais de rápida erosão da base aliada de Temer.

Uma sessão da Câmara dos Deputados foi suspensa temporariamente, depois que legisladores da esquerda tomaram a tribuna.

"Temer vai cair. Todo mundo diz que é um governo morto", disse a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR).

Os participantes do ato também pediram "Diretas Já!" e a retirada dos projetos de reforma da Previdência e de flexibilização da legislação trabalhista.

Muitos apostam em uma saída institucional via Tribunal Superior Eleitoral (TSE). De 6 a 8 de junho, o órgão examinará uma denúncia que poderá levar à cassação da chapa Dilma-Temer, vencedora da eleição presidencial de 2014, por suspeita de financiamento ilegal.

"O Brasil virou imponderável (...) Desde que cheguei ontem aqui está todo mundo conspirando. Ninguém mais acredita na continuidade do governo", disse Paulo Pereira da Silva, o deputado Paulinho da Força (SD-SP), líder da Força Sindical, que foi aliado de Temer nos primeiros meses de seu governo.

A Constituição determina que, em caso de vacância na Presidência na segunda metade de um mandato, haverá eleições indiretas para a escolha de um nome para completá-lo. As eleições diretas poderiam ser realizadas somente em caso de emenda constitucional. Uma PEC apresentada pelo deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) teve a votação adiada nesta quarta-feira (24) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

Um ano após o impeachmentEsta nova crise ocorre apenas um ano depois da destituição pelo Congresso da presidente Dilma Rousseff. Temer, seu vice, a substituiu com a expectativa de completar o mandato até o fim de 2018 e aplicar um programa de ajustes severos para tirar o país da pior recessão de sua história.

O quadro atual é outro. A economia demora a se recuperar, o desemprego atinge níveis recordes, e os escândalos de corrupção envolvem os principais ministros e grande parte dos aliados do presidente impopular.

A gota d'água foi a divulgação, na semana passada, de uma gravação em que Joesley Batista, um dos donos da maior processadora de proteína animal do mundo - a JBS -, relata a Temer as manobras para se livrar das investigações da Operação Lava Jato sobre o esquema de propina na Petrobras.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu imediatamente ao Supremo Tribunal Federal (STF) para prosseguir com o inquérito sobre Temer por obstrução da Justiça.

A esquerda, que denuncia um "golpe institucional", vê na súbita aceleração da crise uma oportunidade única para se vingar.

"Este é o fim do governo golpista. O povo está nas ruas para isso. Não precisavam roubar o Brasil", disse à AFP Francisca Gomes, uma porteira de 59 anos de São Paulo, que protestou em Brasília nesta quarta-feira, segurando com outras três colegas um caixão de papelão preto com imagens do presidente e cruzes brancas com a inscrição "RIP Temer".

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