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Tailândia se despede do rei Bhumibol um ano depois de sua morte

24/10/2017 15h51

Bangcoc, 24 Out 2017 (AFP) - Dezenas de retratos exibidos recordam os melhores momentos do rei da Tailândia, Bhumibol Adulyadej, que faleceu há um ano e será cremado nesta semana em uma cerimônia acompanhada por seus devotos súditos.

Somsree faz uma pausa e retira seu favorito: uma foto dos anos 1980 do monarca com roupas casuais, sentado em uma ponte de madeira, com as costas apoiadas em um caminhão, conversando com um aldeão.

Dado seu papel elevado, ele não precisava viajar pelo país, diz Somsree Trupsangsree na loja do bairro antigo de Bangcoc onde ela vende retratos do admirado monarca.

"Mas ele foi lá para trabalhar", diz a vendedora, de 59 anos, sobre Bhumibol, ou Rama IX, cujo funeral, na quinta-feira, vai parar a Tailândia.

"Além disso, suas mãos seguravam um mapa. Ele se sentava ao lado das pessoas, tinha os pés no chão", acrescentou.

Como ocorre com muitos tailandeses, o vínculo de Somsree com o rei Bhumibol, que morreu há um ano, aos 88 anos, depois de um reinado de sete décadas, é instintivo e íntimo.

Também está fundamentado em uma narrativa incansavelmente reforçada pela máquina de propaganda do palácio.

Imagens dele, como as que ela vende, estampam casas, vitrines e outdoors, enquanto as memórias de seus bons trabalhos são difundidas todas as noites através de transmissões de TV do palácio.

De retratos formais em túnicas opulentas até instantâneos de um soberano suado caminhando através de selvas para documentar as necessidades de seu país, o falecido rei é lembrado como régio, mas acessível, rico, mas não ostensivo, e sempre dedicado ao povo tailandês.

A imagem de Bhumibol nunca foi tão proeminente quanto na preparação para sua cremação - um evento elaborado que deverá atrair 250 mil pessoas para o bairro antigo de Bangcoc.

Os tailandeses ainda estão se ajustando à vida sob um herdeiro que agora preside a imensa riqueza e prestígio da coroa, mas que ainda precisa criar um vínculo semelhante com seu povo.

O rei Maha Vajiralongkorn, de 65 anos, é uma figura mais afastada, voltada para suas questões, e passou boa parte do seu primeiro ano como monarca no exterior.

Mas a discussão honesta sobre os dois monarcas é impossível dentro da Tailândia, que proíbe as críticas à instituição, sob uma das leis de difamação real mais severas do mundo.

- Reino reconstruído -Criado na Suíça, Bhumibol subiu ao trono aos 18 anos, em 1946, depois que seu irmão mais velho, Ananda Mahidol, foi morto a tiros em circunstâncias misteriosas no Grand Palace, em Bangcoc.

Ele foi coroado quatro anos depois, herdando uma monarquia cujo poder estava em contínuo declínio.

No momento da sua morte, tudo isso tinha mudado.

Bhumibol deixou uma das monarquias mais ricas do mundo, com o palácio como eixo das redes de poder da Tailândia, incluindo os influentes militares.

"A Tailândia precisava de um rei como símbolo da renovação e unificação, e um jovem rei encontrou um povo para reconstruir um reino ao redor", explicou Thitinan Pongsudhirak, professor de política da Universidade Chulalongkorn.

O renascimento dos antiquados rituais do palácio - incluindo a prostração em sua presença - e atribuições espirituais elevaram Bhumibol a um status semi-divino.

Essa deificação tornou as cenas de seu envolvimento com os tailandeses comuns ainda mais notáveis para uma nação impressionada com sua ética de trabalho.

Ao longo dos anos que passou cruzando a Tailândia, Bhumibol semeou milhares de projetos reais bem divulgados, em um país pobre e agrário, que lhe renderam o apelido de "Rei do Desenvolvimento".

As viagens produziram uma série de imagens que colocaram Bhumibol como um rei compassivo que minimizou a importância dos ricos para colocar seu povo em primeiro lugar.

"Há muita hagiografia e opiniões oficialmente aplicadas sobre as instituições tradicionais da Tailândia, mas nada disso teria funcionado sem o rei Bhumibol da maneira que ele era", escreveu Thitinan em comentários à AFP.

"O rei foi tão devotado, dedicado e diligente que as pessoas viam isso e ao longo do tempo isso se tornou seu vínculo com elas".

Em seu longo reinado, as centelhas da rebelião comunista foram extinguidas com a ajuda dos EUA, e repetidos ciclos de políticas eleitorais foram anulados por protestos violentos e golpes militares.

No entanto, o rei Bhumibol foi percebido como uma figura acima desses combates, apesar de seus laços com os militares, cujo poder foi tomado dos frágeis governos civis que ele apoiava formalmente.

- Estar à altura -Com essa reputação santa de Bhumibol, não será fácil para seu herdeiro estar à altura.

A exuberante vida pessoal e financeira do novo rei, incluindo a recente transferência de ações no valor de 500 milhões de dólares de um crédito do palácio, são objeto de boatos intermináveis.

Alguns analistas temem pela estabilidade do reino, com uma junta no comando de um país fervilhando com divisões políticas enquanto o novo reinado dá seus primeiros passos.

Mas as críticas ao novo monarca devem ser mantidas a portas fechadas devido à lei sobre o crime de lesa-majestade.

Publicamente, os tailandeses abraçaram a sucessão real, erguendo retratos do novo rei em todo o país desde que ele subiu ao trono, no ano passado.

"Este rei se tornará nosso novo pai", diz Prapai Saebae, de 90 anos. "Temos que respeitá-lo".

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