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Papa conclui visita a Chile e Peru com dura crítica à corrupção

21/01/2018 20h15

Lima, 21 Jan 2018 (AFP) - O papa Francisco encerra neste domingo (21) sua visita ao Peru com uma missa multitudinária em Lima e uma duríssima condenação à corrupção, que "adoece" a política na maior parte da América Latina.

A sexta viagem latino-americana do pontífice argentino, que precisou esperar a chegada ao Peru para sentir-se acolhido pelos católicos, que foram em massa às ruas para recebê-lo - diferentemente da frieza com a qual foi tratado no Chile - foi ofuscada, sobretudo na etapa chilena, pelo escândalo que assombra a Igreja pelos casos de abusos sexuais de menores por membros do clero.

Visivelmente cansado depois de uma semana na qual percorreu milhares de quilômetros para visitar seis cidades nos dois países e com uma agenda cheia de atos, o papa voltou a erguer a voz contra a corrupção que, afirmou, "adoece" a política na América Latina, em particular no Peru, onde quando os presidentes deixam seus cargos, "os levam presos".

Na sexta-feira, ele já tinha convocado o presidente Pedro Pablo Kuczynski, na corta bamba por este "vírus", que "infecta tudo".

O pontífice aproveitou a ocasião de um encontro com os bispos peruanos, no domingo, para insistir em sua alegação.

No Peru, Francisco disse: "(Ollanta) Humala está preso, (Alejandro) Toledo está preso (vive nos Estados Unidos e há uma ordem de extradição contra ele), (Alberto) Fujimori esteve preso até agora, Alan García, que está entro/não entro. O que acontece?", questionou-se.

Em sua viagem, o papa também teve que lidar com os pedados de uma Igreja "arrogante" no Chile, que perde fiéis aos borbotões, e dividida no Peru por lutas de poder em seu interior, pedindo "humildade" a uns e "unidade" a outros.

Às religiosas peruanas, lembrou no domingo que as "fofocas" nos conventos ameaçam a unidade da Igreja e comparou o hábito aos "terroristas, que jogam a bomba e vão embora".

Em seu último dia em Lima, com uma população de nove milhões de habitantes, Francisco se preparava para a última das cinco missas multitudinárias que celebrou nos dois países.

- Sabor agridoce -No Chile, país com a renda per capita mais alta da região, o papa tentou estancar as feridas de uma Igreja profundamente desacreditada pelos abusos sexuais de religiosos e que ofuscaram o foco na questão indígena, durante visita a Temuco (sul), e na migração, em Iquique (norte), que Francisco queria dar à primeira visita de um pontífice ao país em mais de 30 anos.

No Peru, onde sua figura apaixona os fiéis, a destruição da Amazônia, a corrupção, o crime organizado e o feminicídio, que convertem a América Latina na região mais violenta do planeta e menos segura para a mulher, foram os flagelos denunciados pelo papa em suas visitas a Puerto Maldonado (na Amazônia), Trujillo (norte) e Lima.

- O flagelo dos abusos sexuais -Mas Jorge Mario Bergoglio, de 81 anos, voltará a Roma com um sabor agridoce desta visita.

Sua defesa firme do bispo chileno Juan Barros, acusado de encobrir um sacerdote condenado pelo Vaticano por abusos sexuais a menores nos anos 1980 e 1990, prejudicou seus atos de contrição e suas declarações de "dor e vergonha" por estas ações devastadoras para a imagem da Igreja Católica, em um país que perde adeptos de forma acelerada.

O pontífice se reuniu com vítimas de abusos em Santiago, com as quais "chorou" por estas atrocidades, mas isso não o impediu de denominar de "calúnias" as acusações contra o bispo, do qual se despediu afetuosamente com um abraço em Iquique.

Em um gesto incomum, o cardeal Sean O'Malley, assessor próximo do pontífice em sua qualidade de diretor da Comissão vaticana de Prevenção da Pedofilia na Igreja, no sábado se afastou publicamente de Francisco.

Para o arcebispo de Boston, é "compreensível" que as declarações e o comportamento do papa com o bispo Barros tenham causado "uma grande dor" às vítimas no Chile.

"As palavras que enviam a mensagem de que 'se não podem provar suas acusações, ninguém vai acreditar' abandonam os que sofrem estupros criminosos repreensíveis em sua dignidade humana e relegam os sobreviventes a um exílio desacreditado", considerou o prelado em comunicado.

O cardeal O'Malley tinha previsto se encontrar neste domingo com o papa em Lima, segundo antecipou no sábado o jornal National Catholic Reporter.

- Defesa da mulher -Após denunciar em Puerto Maldonado a violência contra a mulher e o tráfico de pessoas - a "escravidão moderna -, e visitar em Santiago uma prisão feminina, o papa condenou a "praga" dos "feminicídios" em Trujillo, atingida pelo tráfico de drogas e pela insegurança, e convidou a população a "lutar contra esta fonte de sofrimento, pedindo que se promova uma legislação e uma cultura de repúdio a toda forma de violência".

Esta foi a primeira vez que saiu da boca do papa a palavra feminicídio, um crime de ódio, em um contexto de discriminação e violência de gênero que se dá majoritariamente nos lares e nas relações de casais, e um flagelo que custou a vida de milhares de mulheres na região.

Segundo a ONU, metade dos 25 países com mais casos de feminicídio no mundo é latino-americana.