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Após derrota do 'califado', Estado Islâmico tenta reorganizar comando e espalhar terror

Ruínas de bairro em Raqqa, na Síria, antes dominado pelo Estado Islâmico - Ivor Prickett/The New York Times
Ruínas de bairro em Raqqa, na Síria, antes dominado pelo Estado Islâmico Imagem: Ivor Prickett/The New York Times

Em Bagdá

31/08/2018 04h00

O grupo Estado Islâmico (EI) se encontra em plena reorganização para tentar sobreviver às derrotas na Síria e no Iraque, onde há quatro anos proclamou um califado depois de ter se apoderado de territórios extensos.

O grupo foi expulso de quase todas essas áreas e deve encontrar "uma nova forma de atuar, sobretudo para recrutar depois de suas enormes baixas", afirma à AFP um responsável dos serviços de segurança iraquianos sob a condição de anonimato.

A prioridade para o EI, que sonhava em se tornar "Estado", é uma reorganização administrativa.

As 35 "wilaya" (províncias, em árabe) que formavam o "califado" acabaram. Após a perda de suas duas "capitais", Raqqa, na Síria, e Mossul, no Iraque, o EI somente menciona em seus órgãos de propaganda seis "wilaya".

Para designá-las, volta a usar as definições territoriais conhecidas: Iraque, Síria, leste da Ásia, Tadjiquistão, Sinai egípcio e Somália.

As "wilaya" de Mossul, Raqqa ou Kirkuk desapareceram completamente do discurso do grupo de Abu Bakr al Bagdadi, ficando reduzidas a "cantões" ("mantaqa").

Homens coletam sucata de metal dos escombros da Praça Paradise Square, que costumava ser um próspero centro comercial, em Raqqa, na Síria - Ivor Prickett/The New York Times - Ivor Prickett/The New York Times
Homens coletam sucata de metal dos escombros da praça do Paraíso, que costumava ser um próspero centro comercial
Imagem: Ivor Prickett/The New York Times

Em 2014, antes do aparecimento público do "califa" e da proclamação do "Estado Islâmico", o EI presumia ter acabado com o traçado fronteiriço "imperialista" aplicado por britânicos e franceses sobre antigos territórios do Império Otomano ao fim da Primeira Guerra Mundial.

Em 2014, a propaganda jihadista difundiu imagens de escavadoras, tentando apagar a fronteira entre Síria e Iraque.

Isso também acabou. Agora as forças iraquianas se deslocam na fronteira por onde os extremistas circulavam.

Do lado sírio, as tropas de Damasco e curdo-árabes respaldadas pela coalizão internacional anti-EI também recuperaram zonas fronteiriças.

"Comando reorganizado"

Não se sabe o número de efetivos do EI, mas sem dúvida o grupo "está debilitado e reorganizou o comando", explica à AFP o responsável iraquiano.

"Isso demonstra a perda de confiança da direção do EI em relação a seus comandantes de "wilaya' no Iraque, a quem reduziu as prerrogativas", acrescentou a fonte.

Com certa frequência as autoridades iraquianas anunciam a captura ou a morte de responsáveis do EI ou de pessoas do entorno de Bagdadi, como seu filho, morto em julho na Síria ao ser atingido por mísseis teleguiados russos. O próprio Bagdadi foi dado por morto várias vezes e os Estados Unidos mantêm a recompensa de US$ 25 milhões (R$ 103,5 milhões) por sua captura.

Neste mês, em sua última gravação sonora, a quarta desde que se proclamou "comendador dos fiéis", Al Bagdadi multiplica as palavras de "consolo e pêsames" e ressalta Hicham al Hashemi, especialista em grupos islamitas radicais.

Neste sermão pela Eid al Adha, festa muçulmana do sacrifício, as convocações para resistir e para continuar a "jihad" (guerra santa) ocultam um ar de derrota, disse.

Pela primeira vez, o próprio Bagdadi pede a seus apoiadores no Ocidente que realizem ataques em seus países. "Valem por mil aqui", afirmou.

"Depois de ter perdido o controle no Iraque e na Síria, a direção EI se concentra agora em uma visão mundial" como fez a Al-Qaeda, afirma a fonte iraquiana. O foco é semear o terror no mundo.

Na gravação de 55 minutos, Bagdadi retoma um discurso próprio da Al-Qaeda. Ataca os Estados Unidos, menciona o Irã xiita, faz uma convocação aos sunitas do Iraque e denúncia as unidades paramilitares iraquianas Hashd al Shaabi, nas quais predominam os xiitas, enumera Hashemi.

"Os três discursos anteriores de Bagdadi estão inseridos em uma 'comunicação de crise' e o último discurso entra dentro da mesma categoria", disse à AFP Tore Hamming, estudioso do jihadismo no European University Institute.