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Termina referendo constitucional marcado por situação na Venezuela

24/02/2019 22h53

Havana, 25 Fev 2019 (AFP) - Mais de 80% dos cubanos habilitados votaram neste domingo (24) na nova Constituição, que reafirma o socialismo como sistema político "irrevogável", em um dia marcado pela defesa cubana da Venezuela e críticas cruzadas com os Estados Unidos.

As cerca de 25 mil seções eleitorais fecharam as portas às 18h locais (20h de Brasília). O último boletim da Comissão Eleitoral, divulgado às 17h locais (19h de Brasília), uma hora antes do fechamento, indicou que 81,53% dos 8,6 milhões de habilitados tinham exercido o direito ao voto, que é voluntário da ilha.

Os resultados preliminares serão conhecidos na tarde desta segunda-feira.

Depois de votar, o presidente Miguel Díaz-Canel manifestou-se pelo Twitter sobre a situação na Venezuela, principal aliada de Cuba:

"A união cívico-militar e o povo revolucionário da #Venezuela, com seu Presidente @NicolasMaduro, impediram o golpe imperialista. Fracassaram os falcões do império e seus lacaios acompanhantes, mas o império não renuncia aos seus planos. A luta continua. #ManosFueraDelaVenezuela" [Mãos Fora da Venezuela], escreveu Díaz-Canel.

Cuba tenta unir a comunidade internacional contra o que chama de uma "agressão militar dos Estados Unidos" ao seu aliado venezuelano.

Na mira de Washington, assim como seu contraparte venezuelano Maduro, Díaz-Canel disse à imprensa que a América Latina está "vivendo um momento de ameaça imperial", e condenou a presença dos presidentes de Colômbia, Chile e Paraguai no sábado na fronteira da Colômbia com a Venezuela.

"A quem estes presidentes estavam apoiando?", perguntou-se também questionand-se o que fazia ali o senador republicano pela Flórida, Marco Rubio, duro crítico da revolução cubana e muito próximo do presidente Donald Trump.

Precisamente, Rubio, que é de origem cubana, tuitou neste domingo que o referendo é "outra manobra mais que a ditadura cubana usa para se aferrar ao poder", uma farsa e uma fraude". "Vejos você em breve", escreveu, dirigindo-se a Díaz-Canel em outro tuíte postado no sábado.

O conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton, tuitou por sua vez que "o referendo constitucional de Cuba hoje é outra estratégia do regime cubano para acobertar sua repressão e tirania. Os Estados Unidos apoiam os chamados de liberdade e democracia do povo cubano".

Segundo o jornal oficial Granma, Raúl Castro, primeiro secretário do governista Partido Comunista (PCC, único) "exerceu seu direito ao voto" na manhã deste domingo sem dar declarações.

- Trump impulsiona o sim? -Em Miami, Trump advertiu na segunda-feira que "os dias do socialismo e do comunismo estão contados na Venezuela e também na Nicarágua e em Cuba", países que sua administração aponta como "a troica da tirania".

Para o acadêmico Carlos Alzugaray, a agressividade de Trump impulsionou a onipresente campanha #YovotoSí (Eu voto sim), do governo.

"O discurso de Trump foi uma boa propaganda para o sim (...) Tem muita gente (...) que vai votar sim porque quer defender a independência diante da ameaça americana", explicou Alzugaray à AFP.

A nova Constituição, que substituiria a de 1976, reconhece o mercado e o investimento privado e externo como agentes na reforma da economia de viés soviético e com muitas carências, mas sempre sob a orientação do governista e único Partido Comunista.

- "A oportunidade de dizer não" - Em face do referendo, a oposição que apela geralmente à abstenção ou a anular as cédulas, desta vez convocou o "não".

"É óbvio que esse 'não' redondo vai além do 'não' a uma Constituição, é um 'não' a um regime que busca se perpetuar no poder", declarou à AFP o opositor José Daniel Ferrer.

Votar contra o texto é, ainda, "a única oportunidade que o povo teve em anos de lhe dizer 'não'", acrescentou.

Na era da Internet, mais facilmente acessível na ilha desde o lançamento, em dezembro, do 3G, o "sim" e o "não" disputaram por meses as redes sociais.

A Constituição dará aos cubanos "a Cuba a que sempre aspiramos, a Cuba digna, a Cuba sem ingerências, sem manipulações", disse o jovem Elián González, de 25 anos, que ficou famoso criança como o menino balseiro nos anos 2000.

O governo confia em que a vitória maciça do "sim", que requer 50%+1 do colégio eleitoral.

A Constituição de 1976 foi aprovada por 97,7% dos que votaram e a reforma constitucional de 2002 para tornar o socialismo "irrevogável" obteve 99,3%.

Na hipótese de que o "não" vença, um cenário político sem precedentes em 60 anos de revolução, continua em vigor a Carta de 1976 e o governo teria que adequar as normas para dar base legal às reformas em curso.

Alzugaray avaliou que a nova Constituição terá entre "70% e 80%" dos votos válidos: "A sociedade mudou e esta mudança vai se refletir no voto".