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Entenda por que a crise venezuelana faz tanto ruído na política americana

25/02/2019 17h41

Miami, 25 Fev 2019 (AFP) - A crise venezuelana é um assunto doméstico na Flórida, tradicionalmente o epicentro dos exilados latino-americanos. No entanto, ao contrário de outros destinos onde as diásporas estão alojadas, esse estado do sudeste americano tem uma peculiaridade: geralmente, ele decide quem vai para a Casa Branca.

Além da importância geopolítica do país com as maiores reservas de petróleo do mundo, a questão venezuelana molda a política local na Flórida.

"Aqueles que pretendem representar a Flórida precisam ser proativos em questões de relações internacionais, mas em nível local", disse à AFP Tomás Regalado, veterano político local que foi prefeito de Miami por oito anos.

As questões internas da Venezuela, Cuba, Nicarágua, Haiti e Porto Rico são "o pão com manteiga de senadores e congressistas do sul da Flórida", disse o republicano que hoje dirige a rádio e a TV Martí.

"Miami já não é apenas a capital do exílio cubano, é a capital dos exilados em geral", continuou ele.

Nesse contexto, há um mês o senador Marco Rubio - um cubano-americano que representa a Flórida - propulsou seu Partido Republicano ao se revelar como o artífice da política do presidente Donald Trump contra o governo de Nicolás Maduro.

Com isso, a simpatia dos venezuelanos em relação ao presidente americano aumentou em meio a essa população que costuma se identificar como independente.

"Sem ser republicana, sou imensamente grata pelo apoio de Trump e do governo americano no conflito venezuelano", disse a atriz venezuelana Bettina Grand, 53, que mora em Miami há quase uma década.

Nesta cidade do sul da Flórida, onde o exílio venezuelano está concentrado nos Estados Unidos, carros com bandeiras tricolores e cartazes que dizem "obrigado Trump" podem ser vistos com frequência.

Segundo Regalado, tudo isso "feriu mortalmente" os democratas, que em 2020 tentarão arrebatar a presidência de Trump.

- São poucos, mas fazem barulho -As preferências neste estado oscilante, onde é impossível prever se os republicanos ou os democratas vencerão, são quase sempre decididos por margens mínimas. E, por causa do intrincado sistema eleitoral americano, a decisão da Flórida é crucial.

"Uma mudança política, mesmo para um pequeno grupo, pode ter implicações enormes para quem ganha a Flórida (...) e para quem é o presidente dos Estados Unidos", disse Michael McDonald, professor associado de Ciência Política da Universidade Internacional da Flórida (FIU).

Cerca de 300.000 venezuelanos vivem nos Estados Unidos, metade deles na Flórida. Mas embora apenas 36.000 dos 14 milhões de eleitores da Flórida tenham nascido na Venezuela, existem "dezenas de milhares" de eleitores da segunda ou terceira geração da Venezuela.

"Eles não são uma população tão grande quanto a dos cubanos-americanos, mas são importantes", disse Daniel Smith, chefe do departamento de Ciência Política da FIU e especialista em eleições.

"E eles tendem a se registrar como independentes, embora ultimamente estejam se registrando mais como democratas", continuou ele. "Mas tenho certeza de que o governo Trump os vê como eleitores que podem oscilar, de acordo com a forma como a crise é tratada".

Ainda precisa ser visto. Por exemplo, para Eloisa Silva, uma fisioterapeuta venezuelana de 30 anos que vive em Miami há 12 anos, Trump fez "o que tinha que fazer".

"Não fiquei mais simpática a ele. Acho apenas que qualquer presidente deveria estar apoiando a Venezuela agora", comentou.

Os políticos locais não esquecem que uma diferença de apenas 500 votos na Flórida deu a vitória em 2000 ao presidente George W. Bush contra seu adversário democrata.

Apesar de serem poucos, os venezuelanos "fazem muito barulho, são muito militantes, têm uma extraordinária capacidade de mobilização e captam a atenção da imprensa", disse Regalado, lembrando seus anos no gabinete do prefeito.

- Democratas à caça -Os democratas estão se esforçando para se inserir nesse debate.

Seus representantes locais buscam oportunidades de foto com líderes da oposição e aumentaram a pressão para que o governo conceda status de proteção temporária (TPS) aos venezuelanos, embora esses esforços sejam difíceis de serem ouvidos em meio ao estrondo de Trump e Rubio.

"Eles foram feridos politicamente "e não querem que o governo de Trump os supere" nesse assunto, disse Smith.

No sábado, enquanto a oposição venezuelana tentava entrar com ajuda humanitária pelas fronteiras, um grupo de representantes democratas se reunia com o líder opositor Carlos Vecchio na localidade de Weston, noroeste de Miami.

A anfitriã, a congressista distrital Debbie Wasserman Schultz, disse que para ela a "Venezuela não é um assunto de política internacional: é um imperativo doméstico".

Ao evento compareceram os democratas Bob Menéndez, senador por Nova Jersey, e os representantes federais Donna Shalala de Florida e Albio Sires, também de Nova Jersey.

Nos últimos dias se pronunciaram, pedindo a Maduro que ceda, Bill e Hillary Clinton, assim como os pré-candidatos democratas Bernie Sanders e Kamala Harris, que prometeu outorgar o TPS aos venezuelanos caso chegue à Casa Branca.

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