Do caos à incerteza: venezuelanos aguardam reabertura da fronteira com a Colômbia
Ureña, Venezuela, 27 Fev 2019 (AFP) - Em frente à ponte Francisco de Paula Santander, que continua obstruída por soldados, os moradores da cidade venezuelana de Ureña esperam ter a sorte de poder passar para a colombiana Cúcuta.
Milhares de moradores de Ureña e da vizinha San Antonio, onde vivem cerca de 100 mil pessoas, dependem de ir ao outro lado da fronteira para trabalhar, estudar e comprar remédios e produtos básicos escassos na Venezuela.
A Colômbia anunciou que à meia-noite desta terça-feira reativará as passagens fronteiriças que ligam Cúcuta a Ureña e San Antonio, mas não se sabe se a Venezuela fará o mesmo.
Pela manhã, um pequeno grupo de crianças em idade escolar exibia um cartaz onde estava escrito: "Queremos estudar. Deixe-nos passar".
"Minha filha caçula está muito preocupada. 'Mamãe, quero estudar; mamãe, tenho uma prova' (...) O que posso fazer?", disse à AFP Kelly Pinto, mãe de duas meninas de 8 e 10 anos, enquanto observava o acesso à ponte Santander, bloqueado por um veículo militar blindado.
Um blindado militar, chamado popularmente de morcego, pois abre placas de metal como se fossem asas, fechava a rua.
Kelly vive da venda de produtos comprados do outro lado da divisa. "Não nos dizem se vão abrir a fronteira ou não", lamenta.
Os dias anteriores foram um caos, com violentos distúrbios e bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha disparados por membros da Guarda Nacional. Um ônibus incendiado por manifestantes no sábado foi retirado da rua, ocupada ainda por uma grande quantidade de escombros.
Por ora, o local está tranquilo, mas o clima ainda é de muita incerteza.
A situação foi similar em San Antonio, onde fica o principal ponto binacional de travessia: a ponte Simón Bolívar, fechado com barreiras de metal e sob vigilância militar.
- 'Esperando ordens' -Os conflitos na região começaram por conta da tentativa de entrada no território venezuelano de ajuda humanitária, solicitada pela oposição, mas bloqueada pelo governo de Nicolás Maduro.
Juan Guaidó, o líder do Parlamento reconhecido como presidente interino da Venezuela por 50 países, disse que assistência cruzaria a fronteira de qualquer maneira no sábado.
Nesta terça, um grupo de moradores de Ureña se aproximou dos militares que vigiam a ponte Santander para tentar negociar a abertura da fronteira e para informar que estavam dispostos a ajudar na retirada do escombros.
"Nos disseram que estão em processo de abertura", mas "sem data, sem hora, sem nada", declarou à AFP Gladys Celis, uma integrante do grupo que falou com os soldados.
"Estão esperando ordens", destacou Celis, cujo marido trabalha do outro lado da fronteira.
O chavismo celebrou como uma vitória a fracassada tentativa de envio pela fronteira de carregamentos de alimentos e insumos médicos, ação que Maduro denuncia como um "show" para iniciar uma invasão militar liderada por Estados Unidos.
- Más recordações -Desde o sábado, a Venezuela mantém um "fechamento total" da fronteira sul com o Brasil, onde os distúrbios deixaram um saldo de quatro mortos, e bloqueou quatro pontes binacionais dos limites ao oeste com a Colômbia no estado de Táchira, assim como no de Santander, mais ao norte.
À margem da estrada entre Ureña e San Antonio, jovens ofereciam nesta terça um guia para cruzar a fronteira pelas trilhas, passagens ilegais. Cobravam, em pesos colombianos, o equivalente a quatro dólares por pessoa.
Esta não é a primeira vez que as ligações territoriais de 2.200 km entre a Venezuela e a Colômbia são bloqueadas por ordem de Maduro. Durante vários meses entre 2015 e 2016, os postos fronteiriços dos estados Zulia, Apure e Amazonas foram fechados por conta de um ataque a uma patrulha militar venezuelana.
Na época, a travessia foi sendo retomada pouco a pouco, a princípio, com permissões especiais por razões de trabalho ou médicas.
Esta medida, adotada em reação a um ataque armado contra uma patrulha militar venezuelana, teve um forte impacto na economia de Ureña e San Antonio, já que apenas 20% da indústria e do comércio sobreviveram ao fechamento, segundo dados de sindicatos locais.
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