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Florestas tropicais, um "pulmão" que perde o fôlego

19/08/2019 12h08

Paris, 19 Ago 2019 (AFP) - Particularmente vulneráveis às mudanças climáticas e vítimas do desmatamento voraz, as florestas tropicais mostram sinais de dificuldades respiratórias, o que leva a temer que não consigam mais desempenhar seu papel de sumidouros de carbono, algo vital para frear o aquecimento global.

Pulmões do planeta, assim como os oceanos, as florestas absorvem entre 20% e 30% dos gases causadores do efeito estufa emitidos pelo homem, um percentual constante, apesar do aumento das emissões nas últimas décadas. De modo claro: sem elas, a mudança climática seria muito pior.

O aumento de CO2 na atmosfera estimula a fotossíntese. A princípio, isto é uma boa notícia para o clima: mais árvores e folhas absorvem mais CO2, responsável pelo aquecimento global.

Nas florestas tropicais, que representam quase um terço das três trilhões de árvores do planeta, outros fatores - do aumento das temperaturas até a falta de nutrientes - limitam a fotossíntese, de acordo com uma série de estudos publicados recentemente.

"Durante muito tempo, falou-se das florestas tropicais como sumidouros de carbono. As reservas de biomassa aumentavam de maneira regular. Mas atualmente a situação mudou: as reservas permanecem estáveis", explica Jean-Pierre Wigneron, do Instituto Nacional Francês de Pesquisa Agronômica.

A partir de dados obtidos por satélite, o pesquisador e seus colegas calcularam que a biomassa vegetal aérea da zona tropical permaneceu estável desde 2010, de acordo com um estudo publicado em julho na revista "Nature Plants".

Outra publicação, na "Nature Communication" desta semana, que também levou em consideração as emissões procedentes da terra, vai mais longe: os trópicos se tornaram contribuintes líquidos de CO2.

"Uma seca extensa e mudanças importantes na utilização das terras em uma região, na qual os solos são ricos em carbono, são condições que poderiam provocar uma liberação de carbono do solo", comenta o coordenador da pesquisa, Paul Palmer.

Em 2017, um estudo publicado na "Science" já havia provocado o alarme, com a informação de que os trópicos emitiam mais CO2 do que capturavam, uma consequência do desmatamento que envia o gás para a atmosfera.

Além de confirmar a tendência, os dois novos estudos mostram a intervenção de outros fatores nas dificuldades das florestas tropicais para respirar: o aumento das temperaturas e a seca, observadas durante o fenômeno "El Niño" de 2015-2016.

- Quente, mas não muito -"Realmente há uma diferença, ao menos no passado recente, entre as regiões áridas mais acostumadas à seca - e que têm um bom percentual de recuperação - e as florestas tropicais úmidas, em particular na África, que são mais vulneráveis à seca", afirma Philippe Ciais, do Laboratório de Ciências do Clima e do Meio Ambiente, que mostrou em outro estudo a existência de uma temperatura "ótima" para o crescimento das árvores.

Para uma fotossíntese ideal, as árvores precisam de sol e de calor, mas não muito. E também precisam de água suficiente, destaca Jean-Pierre Wigneron.

Sem esquecer os nutrientes. Um estudo publicado na "Nature Geoscience" indica que o empobrecimento em fósforo do solo da Amazônia limita o crescimento das árvores, apesar do aporte suplementar de CO2.

Outra pesquisa publicada esta semana pela "Nature Climate Change" é mais otimista, pois considera que o CO2 "continuará estimulando a biomassa vegetal, apesar dos efeitos restritivos dos nutrientes do solo", como o fósforo e o nitrogênio.

Deste modo, a biomassa vegetal deve crescer 12% até 2100, aumentando sua absorção de carbono "equivalente a seis anos de emissões" de CO2, explica à AFP César Terrer, da Universidade de Stanford.

As conclusões de sua equipe, presente em todo planeta, não acabam com as preocupações sobre as florestas tropicais.

"No hemisfério norte, a retenção de carbono nas florestas é mais importante há quase 30 anos", destaca Philippe Ciais. Mas poderão compensar as fragilidades dos trópicos?

Em um relatório publicado no início do mês, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) manifestou preocupação com a "incerteza vinculada com o futuro do sumidouro de carbono terrestre".

Diante desta ameaça, multiplicam-se as operações de plantação de árvores em grande escala, apoiadas por alguns cientistas que consideram a medida uma grande oportunidade para frear o aquecimento global.

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