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Turquia mantém ofensiva na Síria e curdos lembram 'obrigação moral' dos EUA

12/10/2019 16h41

Ras al-Ain, Síria, 12 Out 2019 (AFP) - A Turquia manteve sua ofensiva no norte da Síria neste sábado (12), com o ataque à cidade-chave de Ras al Ain, nas mãos das milícias curdas, que lembraram aos Estados Unidos, seus aliados durante anos, a "obrigação moral" de ajudá-los.

Em Ancara, o ministério da Defesa informou que as forças turcas tomaram Ras al Ain, cidade fronteiriça com a Turquia, o que foi desmentido pelos curdos.

Segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH) e um correspondente da AFP no local, os turcos entraram na cidade, mas os combates continuam.

As Forças Democráticas Sírias (FDS), coalizão de árabes e curdos apoiada há anos pelos Estados Unidos na luta antijihadista, exortaram Washington, ao qual acusou de tê-los "abandonado", a "assumir sua obrigação moral" de ajudá-los e pediram-lhes o "fechamento do espaço aéreo para a aviação turca".

A Turquia, fronteiriça com a Síria, quer expulsar das áreas fronteiriças a milícia curdo-síria das Unidades de Proteção Popular (YPG), as quais qualifica de "terroristas", e instaurar uma "zona de segurança" de 32 km de largura para separar sua fronteira das zonas controladas pelas YPG.

Desde que começou a ofensiva, na quarta-feira, 81 combatentes curdos e dezenas de civis perderam a vida, segundo o último balanço do OSDH, enquanto 100.000 pessoas tiveram que deixar seus lares, segundo a ONU.

Ancara anunciou, por sua vez, a morte de quatro soldados na Síria e de 18 civis em ataques com foguetes lançados pelos curdos contra cidades turcas da fronteira.

A Alemanha anunciou a a suspensão da entrega de armas à Turquia que pudessem ser usadas contra os curdos na Síria, uma medida adotada também pela França.

- "Contra-ataque" -Na manhã deste sábado, forças turcas e seus aliados locais lançaram o ataque a Ras al Ain, de onde praticamente todos os habitantes fugiram, segundo o OSDH.

O barulho dos bombardeios foi incessante e combatentes pró-turcos armados com lança-foguetes se dirigiam para o front, segundo um correspondente da AFP perto da cidade.

Dezenove civis morreram no sábado nos bombardeios turcos, segundo o OSDH.

Nove deles foram "executados em diferentes momentos" pelos aliados sírios das forças turcas no sul da cidade de Tal Abyad, acrescentou a ONG.

Segundo um dirigente das FDS, cuja coluna vertebral são as YPG, "Ras al Ain continua resistindo e os enfrentamentos permanecem".

"As FDS recuaram parcialmente pelos bombardeios violentos, mas lançaram um contra-ataque", acrescentou.

O OSDH e um correspondente da AFP asseguraram que as forças turcas e seus aliados conquistaram uma zona industrial na periferia de Ras al Ain.

Um dirigente dos grupos sírios que apoiam os militares turcos (ex-rebeldes que combateram o regime sírio no começo da guerra), informou que seu avanço tinha perdido velocidade "pela feroz resistência das YPG".

A mídia turca diz que Ancara quer se apoderar de uma faixa do território de 120 km de extensão por 30 km de largura das cidades fronteiriças de Ras al Ain até Tal Abyad.

No total desde a quarta-feira, as forças curdas perderam 27 povoados, segundo o OSDH.

Apoiadas pelo Ocidente, sobretudo pelos Estados Unidos, as FDS são a ponta de lança contra o grupo jihadista Estado Islâmico (EI), derrotado em março, quando perdeu seu último reduto no país.

No âmbito desta luta, soldados americanos foram enviados a setores do nordeste sírio.

Segundo o Pentágono, soldados americanos deslocados perto da cidade síria de Kobane foram alvo de disparos de artilharia de posições turcas nesta sexta-feira, embora não tenha havido vítimas. A Turquia negou ter disparado contra eles.

- "Punhalada nas costas" -No sábado, as FDS consideraram que a operação de Ancara tinha "revitalizado" o EI e "ativado células" jihadistas.

Vários países temem também o destino dos membros do EI detidos pelos curdos.

As forças curdas qualificaram de "punhalada pelas costas" a retirada americana da fronteira, o que permitiu à Turquia lançar sua ofensiva.

Na sexta-feira, os Estados Unidos informaram que o presidente Donald Trump assinaria um decreto para ativar sanções contra a Turquia.

"Não importa o que digam, não deteremos" a operação, respondeu o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan.

A Liga Árabe, por sua vez, após uma reunião de urgência sobre o tema no Cairo, condenou neste sábado "a agressão da Turquia" e pediu a retirada imediata das tropas de Ancara.

Várias ONGs alertaram para o risco de um novo desastre humanitário na Síria, onde a complexa guerra, da qual participam múltiplos atores regionais e internacionais, deixou mais de 370.000 mortos e milhões de deslocados.

A Turquia, que realizou duas ofensivas no norte da Síria em 2016 e 2018, deseja realojar em uma futura "zona de segurança" parte dos 3,6 milhões de refugiados sírios instalados em seu território.