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Certo da vitória, Morales denuncia 'golpe de Estado' em curso na Bolívia

23/10/2019 11h20

La Paz, 23 Out 2019 (AFP) - O presidente boliviano, Evo Morales, denunciou nesta quarta-feira (23) que um "golpe de Estado" promovido pelos setores de direita está em andamento e disse que executará medidas para defender a democracia, no momento em que os resultados das eleições confirmarem sua vitória.

"Um golpe de Estado está em andamento. Quero que o povo boliviano saiba que até agora humildemente sofremos para evitar a violência e não entramos em confronto", disse o presidente em um comunicado à imprensa.

Além disso, Morales declarou ter certeza de que vencerá o pleito no primeiro turno.

"Estou quase certo de que, com os votos nas áreas rurais, venceremos no primeiro turno", disse o atual presidente que busca seu quarto mandato consecutivo.

Morales apareceu diante da mídia pela primeira vez desde as eleições de domingo e deu declarações no momento em que se inicia uma greve nacional que pede um segundo turno com o adversário Carlos Mesa.

Na terça-feira, centenas de opositores enfrentaram a polícia no centro de La Paz, perto da sede do Órgão Eleitoral Plurinacional (OEP), aos gritos de "fraude".

Morales registrava 46,4% dos votos nesta quarta-feira (23), contra 37,07% de Mesa, após a apuração de 95% dos votos válidos, uma leve queda na vantagem do chefe de Estado.

De acordo com os resultados das eleições presidenciais de domingo, publicados pelo site do OEP, Morales foi o candidato mais votado.

A Constituição boliviana estipula que um candidato a presidente consegue a eleição no primeiro turno se conquistar 50% mais um dos votos, ou se superar a barreira de 40% e registrar dez pontos de vantagem para o segundo colocado.

No momento, a vantagem de Morales para Mesa é inferior a 10%, o que significa que deve ser realizado um segundo turno.

Ao contrário de seus dois mandatos anteriores, desta vez, o presidente boliviano não conseguiu alcançar no primeiro turno 50% mais um dos votos. Além de elegê-lo automaticamente, esse resultado também o manteria no controle do Congresso, abrindo caminho para que aprovasse leis sem oposição.

- Greve por tempo indeterminado -Enquanto isso, um grupo de organizações civis dos nove departamentos da Bolívia convocou uma greve por tempo indeterminado.

O protesto começou a tomar forma em Santa Cruz (900 km a leste de La Paz), onde manifestantes queimaram na noite de terça-feira (22) parte da sede do tribunal eleitoral, órgão que deu a vitória na região a Morales.

"Vamos fazer greve até quando vocês quiserem", proclamou Luis Fernando Camacho, líder do Comitê Cívico Pró-Santa Cruz, região promotora do desenvolvimento nacional, e onde algumas ruas já estão bloqueadas.

A greve também começa a ser organizada na rica região de mineração de Potosí e em outras áreas.

"Seremos os jovens que respeitarão a democracia e os que tirarão Evo Morales do palácio (do governo)", disse o presidente do Comitê Civil de Jovens de Tarija (sul), César Ramos.

A influente plataforma civil Conade, que reúne comitês civis em todo país, também anunciou "resistência civil" à possível vitória de Morales e sua adesão à greve geral.

- Sob a lupa internacional -No domingo à noite, com base em uma rápida contagem eletrônica de votos organizada pelo TSE, Mesa comemorou sua ida para o segundo turno.

"Um triunfo inquestionável que nos permite dizer com absoluta certeza e segurança, tanto pela informação da mídia quanto pelo nosso próprio cálculo interno: estamos no segundo turno!", celebrou.

Após a divulgação destes dados parciais, porém, o TSE parou a contagem dos votos por cerca de 20 horas, causando suspeita e rejeição na oposição. Também estimulou pedidos de organizações internacionais, começando pela Organização dos Estados Americanos (OEA), assim como de diferentes países, como Estados Unidos, Argentina, Brasil e Colômbia, para que se respeite a transparência da votação.

Diante desse quadro, Mesa, que foi presidente de 2003 a 2005, quando renunciou sob pressão de movimentos sociais, disse que não reconheceria os resultados, que "fazem parte de uma fraude vergonhosa".

Os críticos de Evo Morales tomaram as ruas e começaram a atacar as sedes eleitorais.

A controvérsia do resultado parcial das eleições - que temporariamente projeta Morales como vencedor no primeiro turno - será analisada em Washington, em uma reunião extraordinária da OEA, que concordou em auditar o processo eleitoral a pedido do governo boliviano.

A ONG Washington Office on Latin America (Wola), responsável pela investigação e promoção dos direitos humanos, solicitou ao governo de Morales e às autoridades eleitorais que "respeitem de forma total e transparente os procedimentos constitucionais para garantir que o povo da Bolívia possa exercer seu direito fundamental de escolher seus próprios líderes de modo livre e justo".

A decisão de Morales de concorrer ao quarto mandato foi duramente criticada e, em fevereiro de 2016, foi rejeitada pelos bolivianos em uma consulta popular.

Um ano depois, contudo, essa decisão foi anulada por uma polêmica decisão do Tribunal Constitucional.

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