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Morales renuncia depois de perder apoio de militares

10/11/2019 20h16

La Paz, 10 Nov 2019 (AFP) - O presidente boliviano Evo Morales renunciou neste domingo de seu berço político na região central de Cochabamba após perder o apoio das Forças Armadas e da Polícia, depois de três semanas protestos contra sua polêmica reeleição.

"Renuncio a meu cargo de presidente para que (Carlos) Mesa e (Luis Fernando) Camacho não continuem perseguindo dirigentes sociais", disse Morales em discurso televisionado, referindo-se a líderes opositores que convocaram protestos ele, desde o dia seguinte às eleições de 20 de outubro.

A praça Murillo, onde fica o Palácio Quemado, sede do governo em La Paz, foi tomada por bolivianos que comemoravam a renúncia de Morales, que governou a Bolívia por quase 14 anos, um recorde nacional de permanência no poder.

"Esta é minha única bandeira", gritava um jovem com casco branco e o rosto coberto, enquanto agitava a tricolor bandeira boliviana enquanto um grupo tentava arriar a 'whipala', símbolo xadrez que identifica as culturas indígenas.

O presidente boliviano de 60 anos enfrentou neste domingo uma avalanche de renúncias de altos funcionários, em alguns casos depois de terem tido suas casas incendiadas, e pela pressão decisiva dos militares e da Polícia, que pediram sua renúncia.

Os resultados de uma auditoria da OEA, que detectou "sérias irregularidades" nas eleições, consideradas fraudulentas pela oposição, desencadearam os acontecimentos que resultaram na renúncia.

"A comissão da auditoria da OEA tomou uma decisão política" ao exigir novas eleições na Bolívia, declarou Morales pela televisão pouco depois de anunciar sua renúncia à presidência do país. "Alguns técnicos da OEA estão a serviço de grupos de poder", acrescentou.

- "Golpe de Estado" ou "lição ao mundo" -Seus dois principais aliados na América Latina, Cuba e Venezuela, denunciaram o que consideram ter sido um "golpe de Estado".

"Condenamos categoricamente o golpe de Estado consumado contra o irmão presidente @evoespueblo", escreveu no Twitter o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.

Pelo Twitter, o presidente eleito de Argentina, Alberto Fernández, também classificou como um "golpe de Estado" a situação na Bolívia.

Já o candidato opositor e ex-presidente Carlos Mesa disse que os bolivianos "deram uma lição ao mundo" ao protagonizarem três semanas de protestos nas ruas que levaram à renúncia como presidente de Evo Morales.

O governo da Colômbia pediu uma "reunião urgente" do conselho permanente da OEA.

O presidente Jair Bolsonaro afirmou no Twitter que denúncias de fraudes eleitorais levaram à renúncia de Morales.

"Denúncias de fraudes nas eleições culminaram na renúncia do Presidente Evo Morales. A lição que fica para nós é a necessidade, em nome da democracia e transparência, contagem de votos que possam ser auditados. O VOTO IMPRESSO é sinal de clareza para o Brasil!".

A opinião de Bolsonaro foi oposta à do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Acabo de saber que houve um golpe de Estado na Bolívia e que o companheiro @evoespueblo foi obrigado a renunciar. É lamentável que a América Latina tenha uma elite econômica que não saiba conviver com a democracia e com a inclusão social dos mais pobres", tuitou Lula.

Pela manhã, Morales havia convocado novas eleições, depois de que uma missão de auditoria da OEA detectou uma série de "irregularidades" nas eleições de 20 de outubro. A medida, contudo, foi insuficiente. As Forças Armadas e a Polícia pediram sua renúncia, somando-se à pressão de líderes opositores.

"Após analisar a situação conflituosa interna, pedimos ao presidente de Estado que renuncie a seu mandato presidencial permitindo a pacificação e a manutenção da estabilidade, pelo bem da nossa Bolívia", disse o general Williams Kaliman à imprensa.

Em meio à onda violência, dezenas ministros e autoridades do governo renunciaram ao longo do dia.

O presidente da Câmara dos Deputados, Víctor Borda, renunciou depois de que manifestantes atacaram sua casa. O ministro de Mineração da Bolívia, César Navarro, renunciou depois de ter sua casa incendiada por opositores em Potosí.

- "Irregularidades" -Pela manhã, a OEA emitiu em um comunicado: "O primeiro turno das eleições realizado em 20 de outubro deve ser anulado e o processo eleitoral deve começar novamente (...) assim que houver novas condições que deem novas garantias para sua realização, entre elas uma nova composição do órgão eleitoral".

"Nos quatro elementos revisados (tecnologia, cadeia de custódia, integridade das atas e projeções estatísticas) foram encontradas irregularidades, que variam desde muito graves até indicativas. Isso leva a equipe técnica auditora a questionar a integridade dos resultados da eleição", diz o informe.

Morales, no poder desde 2006, conquistou o quarto mandato até 2025 em primeiro turno ao obter 47,08% dos votos e superar por mais de dez pontos percentuais o centrista Mesa (36,51%), mas a oposição denunciou uma fraude e foi às ruas exigir sua renúncia.

Os protestos começaram no dia seguinte à eleição na região oriental de Santa Cruz, a mais rica da Bolívia, e foram se estendendo a outras cidades, incluindo La Paz.

No sábado, Morales havia convocado os partidos políticos opositores a um diálogo - ao que se negaram -, excluindo os poderosos comitês cívicos regionais que o tinham cercado com protestos.

As greves causaram perdas no valor de cerca de 12 milhões de dólares, segundo cifras oficiais.

A oposição havia se oposto à auditoria da OEA porque pensava que se tratava de um artifício de Morales para ganhar tempo.

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