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A "rota da seda sanitária" irrita muitos na Europa

30/03/2020 14h58

Paris, 30 Mar 2020 (AFP) - Algumas autoridades europeias não escondem seu desconforto em relação à China, uma superpotência que eles acusam de avançar seus peões geopolíticos na crise do Covid-19 e de tentar reescrever a história da pandemia em seu território.

A secretária de Estado francesa para os Assuntos Europeus, Amélie de Monchalin, no domingo, criticou a China e a Rússia por "instrumentalizar" sua ajuda internacional.

Alguns dias antes, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, criticou a "disputa mundial de narrativas" em andamento e as "lutas de influência" através da "distorção" dos eventos e da "política de generosidade".

Ele lembrou que, embora hoje "estejam sendo feitas tentativas para desacreditar" a Europa, em janeiro, a crise era apenas chinesa, estava localizada apenas em Hubei", e foi agravada porque os líderes do partido chinês (comunista) ocultaram informações cruciais". Lembrou ainda que a Europa ajudou a China, como Pequim está fazendo agora com o Velho Continente.

Como eles, muitas autoridades europeias suspeitam que a superpotência chinesa - que parece ter erradicado a epidemia de coronavírus em seu país - está usando a "diplomacia da máscara" para exaltar seu modelo de poder.

Pequim pediu discrição quando a UE partiu em sua ajuda, mas agora, quando se trata da ajuda da Europa, está destacando sua ação com uma "campanha de comunicação sem precedentes", enfatiza Antoine Bondaz, da Fundação para a Pesquisa Estratégica (FRS), em uma nota dedicada à "Rota da Seda Sanitária".

Essas ações incluem "uma doação de US$ 20 milhões à OMS, o envio de médicos para o Irã e a Itália, a construção de um laboratório no Iraque, o envio de testes para as Filipinas e de equipamentos de proteção para o Paquistão e a França", lista o pesquisador.

- "Uma concorrência entre sistemas" -A embaixada da China na França está promovendo abertamente uma campanha para promover o sistema político chinês e seu "sucesso" na batalha contra o coronavírus.

"No fundo, algumas pessoas admiram os sucessos do governo chinês. Invejam a eficiência de nosso sistema político e odeiam a incapacidade do país de se sair tão bem", escreveu a embaixada em seu site, com divulgação também via Twitter.

A batalha ideológica sobre o Covid-19 vem na esteira da tentativa de controle das rotas marítimas no Mar da China e do acesso à tecnologia 5G.

"Por sete anos, a China se envolveu em uma concorrência acirrada entre sistemas políticos e aproveitou todas as oportunidades nacionais ou internacionais para mostrar a suposta superioridade de seu sistema", disse à AFP Alice Ekman, analista responsável pela Ásia no Instituto de Estudos Segurança da União Europeia (EUISS).

- "Pecado original" -Pequim também quer "se livrar, interna e externamente, do pecado original", que é o surgimento do vírus em seu território, avalia François Heisbourg, um especialista francês em geopolítica.

Resta saber se o relato da crise será convincente, diz uma fonte diplomática europeia.

Se eles saírem dessa crise rapidamente, especialmente em termos econômicos, será com dez vezes mais poder e confiança, prevê esta fonte.

"Mesmo que as declarações sobre a origem do vírus e a mediação excessiva da ajuda chinesa passem a ser críticas à China, outros países continuam mostrando proximidade com Pequim no contexto atual (Rússia, Irã, Paquistão, Argélia, entre outros), e não gostariam de proclamar em coro o surgimento de uma "nova ordem mundial" pós-ocidental no final desta crise", diz Ekman.

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