Topo

Coronavírus obriga o transporte de corpos à Terra Santa em aviões de carga ou jatos privados

04/05/2020 09h43

Jerusalém, 4 Mai 2020 (AFP) - A família de Serge Bokobza, que morreu na França, queria que ele fosse enterrado em Jerusalém e, apesar das restrições devido ao coronavírus, seu corpo foi transferido para a Terra Santa, com seus parentes assistindo ao sepultamento por videoconferência.

Este médico judeu de Cretail, nos arredores de Paris, foi enterrado há algumas semanas no Monte das Oliveiras, em frente à Cidade Velha de Jerusalém, por um grupo de coveiros com roupas e máscaras de proteção.

Apenas um membro da família, o rabino Shraga Dahan, que vive em Israel, esteve presente no funeral.

"Instalei o Zoom [aplicativo de videoconferência] para que todos pudessem ver o enterro ao vivo", disse Dahan à AFP.

"Centenas de pessoas estavam presentes virtualmente, mas no local éramos cerca de dez, incluindo os funcionários da funerária", acrescenta.

Desde o início da pandemia, o espaço aéreo israelense está quase deserto, as autoridades fecharam as fronteiras e suspenderam o tráfego aéreo.

Mas alguns aviões de carga continuam chegando ao aeroporto Ben Gurion, em Tel Aviv, com às vezes a bordo corpos de judeus que querem ser enterrados em Jerusalém e cujas famílias organizam o translado, a qualquer custo.

Por causa dos poucos voos para Tel Aviv, "as famílias tiveram que alugar jatos particulares para levar os corpos de seus parentes e pagar quantias enormes", explica Yehuda Meshi-Zahav, fundadora da organização Zaka, que ajuda a organização de enterros em Israel de judeus do exterior.

Meshi-Zahav fala de um jato particular alugado por US$ 250.000 por uma família judia de Nova York e afirma que cerca de 250 estrangeiros, mortos ou não pelo vírus, foram enterrados em Israel desde o início da pandemia.

Normalmente, cerca de 1.500 estrangeiros são enterrados a cada ano.

- Sepultura eterna -Os judeus que são enterrados em Israel precisam comprar uma concessão, que em Jerusalém pode custar cerca de 100.000 shekels (cerca de US$ 30.000).

Muitos judeus querem ser enterrados em Israel, o único Estado de maioria judaica do mundo, onde acreditam que suas sepulturas têm menos risco de serem profanadas por atos antissemitas.

A tradição diz ainda que os judeus têm direito a uma sepultura eterna. Enquanto em muitos países é possível que um corpo seja deslocado do local devido à falta de espaço décadas após ser enterrado.

Escolher ser enterrado em Israel também é visto como uma garantia de que os ritos funerários judeus serão mais respeitados, especialmente em tempos de pandemia.

Na França, por exemplo, para evitar possíveis riscos de contaminação, está proibida a lavagem funerária tradicional, indispensável para os judeus religiosos que desejam que seu corpo seja lavado antes de ser colocado em uma mortalha diretamente na terra.

"Para lidar com essa tarefa difícil nesse período de contaminação, tivemos que treinar funcionários funerários com padrões sanitários mais rigorosos", explica Meshi-Zahav.

"Transportamos os corpos em dois sacos sanitários e depois coordenamos com nossos colegas israelenses, que cuidam de tudo de acordo com os regulamentos sanitários locais", explica Yves Sportes, diretor de uma funerária na França que já realizou cerca de 50 traslados de corpos para Israel desde o início da crise da saúde.

A empresa israelense El Al suspendeu os voos dos aeroportos franceses, de modo que os restos mortais devem ser transportados para a Bélgica e depois em aviões de carga para Tel Aviv.

Com a retomada dos voos comerciais, os restos mortais poderão ser guardados nos porões dos aviões, o que permitirá que as famílias enterrem seus parentes "de maneira honrosa e pelo preço correto", disse El Al, que fatura 3.000 euros por esse serviço.

"O mais difícil é que as famílias não podem acompanhar seus entes queridos", diz Sportes.

Foi assim que o rabino Shraga Dahan recitou o kadish, a oração dos mortos, sozinho em frente ao corpo de Serge Bokobza, apenas acompanhado pelos coveiros e pelas pessoas em videoconferência. "Foi muito estranho."

mib/cgo/gl/awa/pc/mar/mr