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Trinta anos após unificação, Iêmen volta a se dividir

20/05/2020 09h59

Dubai, 20 Mai 2020 (AFP) - Trinta anos após a unificação dos antigos estados do Norte e do Sul, o Iêmen está prestes a se dividir novamente em meio a conflitos armados, reivindicações regionais e interferência estrangeira.

Em 22 de maio de 1990, os líderes da República do Iêmen do Norte e do Iêmen do Sul anunciaram em Sanaa, a capital, o nascimento de um país único.

Tratou-se da realização do "sonho de toda uma geração de iemenitas", diz à AFP o analista político Saleh al Baidhani.

Mas hoje esse sonho está desfeito, em um país envolvido em conflitos intermináveis, com um mosaico de zonas rivais.

Sanaa e amplas áreas do norte estão nas mãos dos rebeldes huthis, enquanto o governo controla a zona central de Marib e as províncias do leste.

Os confrontos entre separatistas e forças pró-governo abriram uma frente dentro do campo anti-huthi.

Tudo isso levou ao fim do Iêmen concebido em 1990, como admitido nos círculos de poder, exilado em Riade.

Questionado pela AFP, Ali al Sarari, conselheiro do primeiro-ministro Main Abdelmalek Said, vê apenas duas opções para o futuro: "um Iêmen fragmentado ou um Iêmen federal e descentralizado".

Mas esta última opção parece ilusória: o conflito no Iêmen deixou milhares de mortos desde 2014, essencialmente civis, segundo organizações humanitárias, e o país está enfrentando a pior crise humanitária do mundo, de acordo com a ONU.

O Iêmen foi unificado após "transformações revolucionárias", lembra Baidhani.

Após um golpe de Estado por oficiais nacionalistas em 1962, a monarquia zaidita no norte do Iêmen se tornou uma república.

Por sua vez, o Sul se tornou independente em 1967, após quatro anos de revolta contra os colonos britânicos. Em 1970, um regime marxista foi estabelecido, o único no mundo árabe.

Duas ideologias são então opostas: nacionalista no Norte, socialista no Sul. Mas ambas tendem à unificação do país.

Mas o caminho para um Iêmen unido será marcado por combates sangrentos, incidentes fronteiriços e negociações sem fim.

Em 1978, chega ao poder no Norte Ali Abdallah Saleh, que mais tarde se tornaria o primeiro presidente do novo país, com o apoio de ex-líderes do Sul.

Mas, muito rapidamente, estes se sentem excluídos do poder e tentam uma secessão em 1994, reprimida violentamente pelas tropas do Norte.

"A unificação do país teve más fundações e toda a aparência de uma colonização do Sul pelo Norte", explica Hussein Hanachi, que administra um centro de estudos em Áden.

O analista destaca, assim, o desmantelamento de empresas estatais no Sul em benefício de empresários do Norte e a distribuição de terras aos apoiadores do presidente.

- "Nova realidade" -Além da tentativa de secessão de 1994, o governo deve enfrentar a ameaça de grupos jihadistas e grandes dificuldades econômicas.

Em 2011, na esteira da Primavera Árabe, a revolta nas ruas forçou o presidente Saleh a deixar o país e iniciou um difícil período de transição, a favor de seu sucessor Abd Rabbo Mansur Hadi.

Os rebeldes huthis, implantados no Norte, aproveitam a situação e tomam a capital em 2014.

O surgimento dos huthis, apoiados pelo Irã xiita, levou sua grande rival sunita Arábia Saudita a apoiar o governo e formar uma coalizão militar, que intervém na guerra do Iêmen desde 2015.

E com a proclamação, em 26 de abril, da autonomia do Sul pelos separatistas - vários de seus elementos formados pela Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos -, a divisão do Iêmen parece já confirmada.

"A unidade do Iêmen em seu estado atual não existe mais", confirma Majed al Mathque, que dirige um centro de reflexão em Sanaa. "A guerra criou uma nova realidade", conclui.

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