Topo

Vídeo de reunião ministerial expõe entranhas do governo Bolsonaro

22/05/2020 21h11

Brasília, 23 Mai 2020 (AFP) - A divulgação do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, na qual o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro diz que foi pressionado pelo presidente Jair Bolsonaro a trocar o comando da Polícia Federal (PF), mostra os integrantes do primeiro escalão do governo brasileiro utilizando termos pouco amenos sobre os principais temas do momento, como a pandemia de coronavírus.

Em uma parte do vídeo, Bolsonaro descreve o governador de São Paulo, João Doria, como "bosta" e o governador do Rio de Janeiro, Wilson Wietzel, como "estrume" por promoverem medidas de confinamento social que, aos olhos do presidente, são prejudiciais para a economia.

Por outro lado, o pedido do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, de apreensão do celular de Bolsonaro gerou uma reação forte por parte do governo.

Uma decisão que, se aceita pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, teria "consequências imprevisíveis" e comprometeria a "estabilidade nacional", segundo o chefe do Gabinete de Segurança Nacional (GSI), general Augusto Heleno.

Tanto o pedido de apreensão do celular, apresentado por partidos da oposição, quanto a divulgação do vídeo da reunião ministerial fazem parte da investigação aberta depois que Sérgio Moro pediu demissão do Ministério da Justiça, alegando que o presidente tentou interferir nas investigações da Polícia Federal para proteger sua família e amigos.

Bolsonaro garante que a gravação não o incrimina. Apesar de admitir que na reunião tenha se referido a amigos e familiares, ele afirma que estava falando sobre sua segurança pessoal e não os protegendo de investigações da PF.

"Tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui! E isso acabou. Eu não vou esperar 'foder' a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa", diz Bolsonaro no vídeo .

O vídeo liberado pelo STF teve excluído apenas trechos com referências a "certos estados estrangeiros".

- O fator "medo" -Na reunião, é discutida a estratégia e combate à COVID-19, que já estava em plena expansão no Brasil.

O então ministro da Saúde, Nelson Teich, que renunciou ao cargo em 15 de maio, insiste na necessidade de tranquilizar a população para dominar o fator "medo".

"Enquanto não mostrarmos à sociedade que controlamos a doença, qualquer tentativa econômica será ruim, porque o medo impedirá que a economia seja considerada uma prioridade", diz.

Bolsonaro ataca virulentamente os governadores dos dois principais estados do Brasil.

"Que os caras querem é a nossa hemorroida! Nossa liberdade! Isso é uma verdade. Que esses caras fizeram com o vírus, esse bosta do governador de São Paulo, o estrume do Rio de Janeiro", exclama.

- Aproveitar a COVID para desmatar -O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, exortou seus colegas a aproveitarem o fato de que a atenção mundial está focada na pandemia para avançar na legalização de atividades agrícolas e extrativistas em áreas protegidas da Amazônia.

"Nós temos a possibilidade nesse momento que a atenção da imprensa tá voltada exclusiva ... quase que exclusivamente pro COVID (...) e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas" nesse campo, explicou Salles.

A organização ambientalista WWF expressou sua "indignação" por esses propósitos, que "mostram que Salles sabe que o que ele propõe é ilegal".

Em seu discurso, o ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo afirma que a crise, longe de isolar o Brasil devido à rejeição das recomendações globais de saúde, oferece a oportunidade de se tornar um dos grandes nomes do mundo.

"Estou cada vez mais convencido de que o Brasil tem hoje as condições, tem a oportunidade de ocupar a mesa de quatro, cinco, seis países que vão definir a nova ordem mundial" da pós-pandemia, afirmou.

jm-js/gma/lca/jc