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Jornalista boliviano deixa TV após denunciar assédio do governo interino

03/06/2020 21h38

La Paz, 4 Jun 2020 (AFP) - O jornalista boliviano Junior Arias anunciou nesta quarta-feira (3) seu afastamento temporário da emissora televisão em que trabalha, após denunciar ter sofrido ameaças do governo da presidente interina Jeanine Áñez após difundir uma matéria sobre supostas compras superfaturadas de material para a Polícia.

"Vou embora, assumo essa determinação tranquilo, satisfeito, com a cabeça erguida porque acredito ter feito um trabalho que o único que tentou fazer foi divulgar aos cidadãos e aos espectadores uma série de fatos que marcaram supostas irregularidades no governo atual", disse Arias ao telejornal Gigavisión, a emissora de TV de sua família.

O diretor da Gigavisión e pai do jornalista, Jorge Arias, esclareceu que o filho tirou uma "licença temporária".

Após a difusão, na semana passada, da reportagem de Junior Arias, o Ministério do Governo (Casa Civil), ao qual está subordinada a Polícia, informou em um comunicado que "essa falsidade é guerra suja e guerra política". E destacou que não descansaria até que o jornalista "retifique" a informação.

A missão na Bolívia do Escritório da Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos reagiu nesta quarta-feira pelo Twitter à resposta pública para a denúncia divulgada pela Gigavisión: "Em um sistema democrático, as autoridades estão submetidas a um maior escrutínio público e devem favorecer o debate sob um clima de abertura ao trabalho da imprensa", escreveu.

"Os jornalistas que investigam supostos atos de corrupção não devem ser alvo de assédio ou intimidação", acrescentou.

Dias antes, o relator para a liberdade de imprensa da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Edison Lanza, expressou na mesma rede social sua "grave preocupação com a resposta do Ministério do Governo da Bolívia à investigação jornalística sobre a compra de gases antidistúrbios".

Antes da notícia que resultou em seu afastamento da emissora, Junior Arias tinha investigado durante meses uma viagem em um avião militar da filha da presidente Áñez de Tarija (sul) a La Paz. Segundo a apuração jornalística, no voo viajou um de seus amigos e a mãe, membro do Parlamento, para que comparecessem à sua festa de aniversário, em plena quarentena pela pandemia do novo coronavírus.

Outro caso difundido pelo veículo e revelado por Arias atinge o ministro da Presidência, Yerko Núñez, que segundo a informação também levou a La Paz em um voo militar uma ex-miss de sua cidade no departamento amazônico de Beni.

Depois da divulgação das reportagens, a ministra da Comunicação, Isabel Fernández, retirou a publicidade estatal da Gigavisión, alegando uma suposta baixa audiência.

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