Giuseppe Conte, o líder italiano resgatado pelo coronavírus
Roma, 5 Jun 2020 (AFP) - Ele era acusado de ser um fantoche dos partidos políticos, um "ninguém". Agora, graças à sua gestão da crise deflagrada pelo coronavírus, o chefe de governo italiano, Giuseppe Conte, surge como o líder que ilumina o país.
Segundo uma pesquisa recente da emissora pública RAI, 59% dos italianos confiam "muito" em Conte, que conseguiu manter um diálogo permanente com a população durante esses meses difíceis de pandemia, recorrendo ao Facebook e à televisão.
"Não o veem como um político tradicional, mas como um homem livre que oferece informações e é independente", disse à AFP o professor de Ciência Política Gianfranco Pasquino, da Universidade John Hopkins, em Bolonha.
"Podemos dizer que ele aprendeu gradualmente sua nova profissão", resume o especialista.
O discreto professor universitário de direito privado, sem experiência política, foi nomeado chefe de governo em junho de 2018, graças ao Movimento 5 Estrelas (M5E, antissistema), do qual se diz próximo.
Considerado um "fantoche" de seus dois vice-primeiros-ministros, Luigi Di Maio, líder político do M5E, e Matteo Salvini, da Liga de extrema direita, ele se distanciou de ambos, com seu estilo sóbrio.
Depois de romper com Salvini e se alinhar em setembro de 2019 com o Partido Democrata (PD, centro esquerda) para formar um novo governo, tornou-se uma figura-chave por sua capacidade de mediar entre as legendas.
"Fortaleceu-se, ganhou espaço para ação, sem vice-presidentes criando obstáculos", diz outro especialista em política italiana, Alessandro Giacone, professor da Universidade de Bolonha.
"Devido à epidemia, teve que centralizar as medidas tomadas pelo governo e esteve na vanguarda do cenário político e da mídia", acrescenta.
"Conte é muito elogiado por sua gestão da crise", enfatiza o historiador, que acredita que, embora muitos preconceitos sobre a Itália e sua má gestão das contas ainda estejam em vigor na Europa, o resultado final é que a imagem do país "saiu mais forte".
- Itália, país laboratório -Fora da China, a Itália foi o primeiro país do mundo ocidental a tomar decisões arriscadas contra a pandemia, como ordenar o confinamento por dois meses e depois iniciar um gradual desconfinamento, com todas as medidas anunciadas e explicadas por Conte e baseadas no princípio de que "a saúde vem em primeiro lugar".
"O país tem sido uma espécie de laboratório" para o resto do mundo, diz Giacone.
O primeiro-ministro italiano também liderou a batalha, com França e Alemanha, pela adoção do plano bilionário da União Europeia para a recuperação da economia, um desafio para um país oprimido pela burocracia, corrupção e má administração dos fundos europeus.
O temido líder da oposição Matteo Salvini saiu enfraquecido e desacreditado por seus ataques ao governo em meio a uma pandemia que, segundo uma pesquisa feita pela Ixè, causou uma perda de cerca de 10 pontos de popularidade para a Liga. Passou de 35% há um ano para atuais 25%.
Agora, Conte enfrentará um desafio ainda maior: a recessão econômica causada pelo novo coronavírus, a pior desde a Segunda Guerra Mundial.
Com uma economia devastada por dois meses de paralisia total para impedir a propagação do vírus, que deixou quase 34.000 mortos, as fortes desigualdades sociais que persistem na Itália vieram à tona.
"Um terço dos trabalhadores teve seus salários cortados e, no final de março, 45% dos trabalhadores estavam desempregados", disse à AFP Vincenzo Galasso, da Universidade Bocconi, de Milão.
"O mercado de trabalho sofreu o baque, as desigualdades aumentaram, especialmente para pessoas com baixa escolaridade, para quem não pode trabalhar em casa", explicou.
"Isso representa uma bomba prestes a explodir. O governo liderado por Conte não está assumindo riscos no momento, mas, em alguns meses, a situação poderá mudar, devido à situação econômica", alerta Galasso.
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