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"Isto é real": os meses de agonia de um paciente da COVID-19

11/07/2020 13h20

Washington, 11 Jul 2020 (AFP) - Scott Krakower, um psiquiatra infantil de um hospital de Nova York, foi diagnosticado com a COVID-19 em meados de abril, mas três meses depois ainda há dias em que sente cansaço extremo, falta de ar ou dificuldades para falar por dores na garganta.

O médico nova-iorquino de 40 anos é um dos pacientes denominados em inglês de "long-haulers" (de longo prazo), cujo período de recuperação supera as duas semanas em média dos curados.

Krakower disse à AFP que em alguns dias duvida de si mesmo e se pergunta se não deveria estar no trabalho, se os sintomas que enfrenta são reais até que, por exemplo, sai para caminhar e seus pais ou a esposa, que estão com ele no telefone, percebem que está ofegante.

O fenômeno é atribuído a uma doença pós-viral da qual se sabe muito pouco, mas que é cada vez mais reportada por pacientes, que compartilham suas experiências em fóruns como o Grupo de Apoio Covid Longa, no Facebook, que tem mais de 5.000 membros.

"Quando eu penso que estou bem e tenho três ou quatro dias bons, eu tenho cerca de três ou quatro horas em que novamente não consigo falar ou meu gânglio linfático começa a inflamar no lado direito do pescoço", afirma Krakower em uma entrevista por vídeoconferência de sua casa em Long Island.

Krakower trabalhava como diretor de unidade no departamento de psiquiatria do Zucker Hillside Hospital, no Queens, onde suspeita que foi infectado durante a epidemia em Nova York.

Primeiro ele perdeu o olfato e o paladar - "tudo tinha gosto de borracha -, depois uma tosse incômoda que o impedia até de trabalhar de casa, até que perdeu a voz completamente.

Três semanas e meia depois, além de calafrios e febre alta, ele começou a tossir com tanta força que cuspia sangue. Ele não conseguia mais engolir e sua voz se tornou aguda. Terminou em uma sala de emergência.

- Fase pós-viral - "O inchaço (da laringe) foi provocado por uma inflamação pós-viral que ocorreu semanas após o vírus", afirmou o médico Robert Glatter, que tratou Karkower.

Por precaução, Krakower se isolou da esposa e dos cinco filhos durante cinco semanas, que foram especialmente difíceis para a família.

Sua filha Hazel, de dois anos, e Evan, o filho que tinha apenas quatro meses, o viam apenas por ligações de vídeo, que Krakower usava para "encontrar" a família no momento do jantar ou na leitura de histórias antes de dormir.

"Eu realmente não gostaria que ninguém passasse pelo que passei", disse, antes de afirmar que ainda se emociona ao pensar sobre a quarentena. Seu período de isolamento terminou após dois testes negativos para o coronavírus.

Glatter disse que a fadiga contínua de Krakower é semelhante a que foi documentada em outras doenças que causam a síndrome da fadiga crônica.

Os cientistas não sabem porque isto acontece, mas Glatter disse que poderia estar relacionado a uma lesão na mitocôndria, uma parte das células responsável por gerar energia.

Para Glatter, as pessoas que experimentam estes sintomas de forma prolongada não devem cair em uma confusão médica, na qual outras pessoas ou os próprios pacientes atribuem os sintomas à ansiedade.

"Isto é real", disse Glatter. "Isto não está na cabeça das pessoas. Isto é o que elas vivem todos os dias, o que publicam online".

"As pessoas estão fazendo sessões de terapia porque está afetando suas vidas de tal maneira que elas não conseguem viver como normalmente fariam".

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