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Eventual vitória de Biden colocará 'relação especial' com Londres à prova

Joe Biden, candidato do partido Democrata à Presidência dos Estados Unidos - Divulgação/Partido Democrata
Joe Biden, candidato do partido Democrata à Presidência dos Estados Unidos Imagem: Divulgação/Partido Democrata

27/10/2020 09h31

Londres, 27 Out 2020 (AFP) - Em caso de vitória do democrata Joe Biden nas eleições americanas, a "relação especial" estabelecida entre o britânico Boris Johnson e Donald Trump poderá sofrer alterações —em um momento em que Londres precisa de mais amigos do que nunca.

O Reino Unido vai se separar da União Europeia (UE) no final do ano e, para compensar a perda de seu principal parceiro comercial, busca fechar acordos de livre-comércio com outros países. O principal deles são os Estados Unidos, com quem vem negociando há algum tempo.

Os democratas já avisaram, porém, que tal tratado ficará sob risco, se a aplicação do Brexit por parte dos britânicos enfraquecer a paz na Irlanda do Norte. O acordo de paz foi firmado em 1998 ao final de três décadas de um sangrento confronto, com mediação dos Estados Unidos e de outros países.

"Não acho que Joe Biden se sinta particularmente efusivo com este governo britânico, e eles vão ter que trabalhar muito para mudar isso", disse no domingo à rede CNN o ex-ministro britânico das Finanças conservador George Osborne.

Em dezembro passado, quando Johnson se dirigia para uma vitória legislativa esmagadora, Biden o descreveu como um "clone físico e emocional" de Trump. Até o presidente americano elogiou o premiê britânico como "o Trump da Grã-Bretanha".

E a longa lista de comentários provocativos do popularmente conhecido como "BoJo" voltou a cobrar seu preço: Biden era vice-presidente quando Johnson escreveu em 2016 que Barack Obama era antibritânico por causa de sua herança "parcialmente queniana" e por sua "antipatia ancestral pelo Império Britânico".

Populistas "camaleões"

Se Biden vencer a eleição presidencial, é provável que muitos ex-membros do governo Obama voltem à Casa Branca, com uma imagem negativa de Johnson.

Um deles, Ben Rhodes, ex-conselheiro de segurança nacional, comparou o britânico, recentemente no Twitter, a um Trump com "cabelo melhor" e QI mais alto.

Na opinião de Heather Conley, especialista do Center for Strategic and International Studies (CSIS), um "think tank" de Washington, se Biden for eleito, o primeiro-ministro britânico pode se adaptar rapidamente.

"Me consola que os populistas são camaleões: adotam a cor do momento político. Acredito que, se Biden ganhar, o tom de Johnson mudará drasticamente", disse à AFP.

Trump recebeu com satisfação a chegada a Downing Street, no ano passado, do "duro" e "inteligente" inglês nascido em Nova York. Johnson, por sua vez, elogiou as "muito boas qualidades" de Trump, em contraste com a desconfiança de outros líderes, como a chanceler alemã, Angela Merkel.

Em questões como mudança climática, Irã, Rússia, ou OTAN, o Reino Unido continua mais alinhado com seus parceiros europeus. E com o próprio Biden.

"Melhor com Biden"

De acordo com Conley, "as questões relacionadas ao Brexit seriam tratadas de maneira muito diferente em um governo Biden, no que se refere ao entusiasmo pró-Brexit da administração Trump".

A negociação comercial entre os dois países atraiu a atenção dos democratas desde que Johnson apresentou uma legislação, em setembro, que revogaria unilateralmente o que foi acertado no Brexit sobre o futuro comércio entre a província britânica da Irlanda do Norte e a vizinha República da Irlanda, um membro da UE.

Biden, que fala apaixonadamente sobre suas raízes irlandesas, advertiu que o acordo comercial não veria a luz do dia, se Londres minasse o acordo de paz da Sexta-feira Santa de 1998. O pacto encerrou o confronto entre católicos republicanos e sindicalistas protestantes.

O governo britânico não quer tomar partido público nas eleições americanas de 3 de novembro, mas alguns conservadores não mostram tal reserva.

Sajid Javid, ex-ministro das finanças de Johnson, escreveu no jornal Daily Telegraph na semana passada sobre o discurso final de Ronald Reagan na convenção republicana de 1992, ano em que o britânico trabalhou como banqueiro em Nova York.

Segundo Javid, Reagan apelou para "as melhores esperanças, não os piores medos". Agora, "apenas um dos candidatos pode dizer o mesmo de forma confiável. O Reino Unido estará melhor com Biden", concluiu.