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Presidente tunisiano assume plenos poderes e provoca grave crise política

26/07/2021 11h37

Tunes, 26 Jul 2021 (AFP) - A Tunísia acordou nesta segunda-feira (26) em uma grave crise política depois que o presidente Kais Saied decidiu, no domingo, suspender a atividade parlamentar e atribuir-se plenos poderes executivos, o que levou o partido Ennahdha a denunciar um "golpe de Estado".

O Exército também cercou a sede da Presidência do governo, a Kasbah, e impediu a entrada de seus trabalhadores, afirmaram funcionários à AFP.

No domingo à noite, após um dia de manifestações em várias cidades do país, o presidente Saied anunciou que suspendeu a atividade do Parlamento por 30 dias e que se encarregará do poder Executivo "com a ajuda do governo", após uma reunião de emergência com autoridades das forças de segurança no palácio presidencial de Cartago.

Além disso, destituiu o chefe de governo Hichem Mechichi, em um contexto de forte descontentamento popular pela gestão da crise social e sanitária por parte do Executivo.

O partido governante, Ennahadha - de orientação islamita -, criticou duramente a medida de Saied, que denunciou como "um golpe de Estado contra a revolução e contra a Constituição", segundo um comunicado.

A decisão do presidente também foi criticada no exterior.

A Turquia, aliada de Ennahdha, pediu a restauração da "legitimidade democrática" e a Alemanha exigiu a "retomada da ordem constitucional o mais rápido possível".

Berlim também pediu o "respeito às liberdades civis, que é uma das conquistas mais importantes da revolução tunisiana" de 2011, que costuma se apresentada como a única bem-sucedida da Primavera Árabe.

- "Protetores da Constituição" -Centenas de apoiadores de Saied e de Ennahdha se atacaram mutuamente nesta segunda-feira com pedras e garrafas em frente ao Parlamento, na cidade de Tunes, observaram repórteres da AFP.

Rached Ghannouchi, chefe do Ennahdha e presidente do Parlamento, que ficou horas estacionado em um carro em frente à porta fechada do Parlamento, não conseguiu entrar no edifício porque os militares enviados para vigiar a câmara o impediram.

"Queremos entrar no Parlamento! (...) Somos os protetores da Constituição", disse a vice-presidente da Assembelia, Samira Chaouachi, do partido aliado Qalb Tounes, aos soldados que guardam a porta do Parlamento, segundo um vídeo publicado pela mídia local e que foi divulgado nas redes sociais.

"Nós somos os protetores da nação", respondeu um dos militares, que acrescentou que estava apenas cumprindo ordens.

Essas medidas buscam "mudar a natureza do regime político na Tunísia e transformá-lo de um regime democrático para um regime presidencial, individual e autoritário", considerou Ghannouchi em uma declaração publicada na página oficial de Ennahdha.

Saied declarou que a Constituição não permite dissolver o Parlamento, mas que permite suspender sua atividade, segundo o artigo 80, no caso de "perigo iminente".

Esse artigo é aplicado por 30 dias, ao longo dos quais a Corte Constitucional deve decidir se prolonga ou não sua vigência. No entanto, essa instituição ainda não pôde ser lançada devido à agitada vida política da Tunísia desde a aprovação da Constituição em 2014.

- Conflito político -Rached Ghannouchi e o presidente Saied estão imersos em um conflito político há seis meses, que paralisou o governo e prejudicou os poderes públicos, em meio à onda de casos de covid-19 que abala a Tunísia desde o início de julho.

Com quase 18.000 mortos por coronavírus, o país de 12 milhões de habitantes apresenta uma das piores taxas de mortalidade do mundo.

Depois do discurso de Saied, milhares de tunesianos, indignados com as lutas de poder e a questionada gestão da crise social e sanitária por parte do governo, foram às ruas apesar do toque de recolher, lançando fogos de artifício e buzinando na capital Tunes e em outras cidades.

"Esse é o presidente que gostamos", exlcamou Nahla, uma mulher de 30 anos coberta por uma bandeira da Tunísia. Ao seu lado, um tunisiano se preocupava com o possível "nascimento de um novo ditador".

Além do Ennahdha, os partidos de sua coalizão, Qalb Tounes e o movimento islamita nacionalista Karama, também condenaram as decisões de Saied.

Na oposição, a Corrente Democrática, um partido socialdemocrata que apoiou Saied em várias ocasiões, também rejeitou a medida, embora tenha culpado a "tensão popular e a crise social, econômica e sanitária e a falta de horizontes da coalizão no poder dirigida por Ennahdha".

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