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Relatório da CPI fará acusações duras contra Bolsonaro

20/10/2021 00h31

Rio de Janeiro, 20 Out 2021 (AFP) - A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado vai recomendar nesta quarta-feira em seu relatório final o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro por crime de "epidemia com resultado de morte", entre outros atribuídos à sua gestão da pandemia de covid-19, que deixou mais de 600.000 mortos no Brasil.

Após seis meses de audiências conturbadas, com testemunhos emocionantes e revelações chocantes sobre as experiências com "cobaias humanas" com medicamentos ineficazes, a CPI, constituída por senadores de tendências diversas, apresenta seu aguardado relatório.

O documento, com cerca de 1.200 páginas, deverá ser lido - provavelmente uma versão abreviada - pelo relator da Comissão, o senador Renan Calheiros (MDB-AL). Ele anunciou na noite desta terça-feira (19) que irá apresentar nove acusações contra Jair Bolsonaro ao invés das 11 previstas inicialmente, entre elas as de "crime contra a humanidade" e "prevaricação".

Os crimes de "homicídio" e "genocídio de indígenas" foram retirados no último minuto devido a dissensos no âmbito da CPI.

Para a CPI, o governo Bolsonaro agiu com "dolo", tendo decidido intencionalmente não adotar as medidas necessárias para conter a circulação do vírus.

As acusações gravíssimas devem, no entanto, ter um alcance sobretudo simbólico por enquanto, uma vez que o presidente se beneficia de apoios no Congresso que lhe permitem evitar a abertura de um processo de impeachment. O mesmo vale para o procurador-geral da República, Augusto Aras, um aliado de Bolsonaro, que pode barrar qualquer indiciamento.

A CPI também deve pedir o indiciamento de vários ministros e dos três filhos mais velhos do presidente, que qualificou a Comissão de "farsa".

"Estamos com o relatório que está parecendo uma sentença, mas o governo está tranquilo. Você pode criticar a atitude dele [Bolsonaro], mas você não pode dizer que isso levou a crime. Você pode fazer a crítica, mas você não pode criminalizar o presidente da República", declarou ao UOL Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado.

- "Nós merecíamos um pedido de desculpas" -A CPI não tem o poder de abrir processos judiciais, mas as revelações que apresentou podem ter um impacto político considerável, enquanto as pesquisas de opinião já situam Bolsonaro (sem partido) como derrotado perante o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a um ano das eleições presidenciais.

O relatório será encaminhado ao Ministério Público, que poderá indiciar ou não as pessoas incriminadas pela CPI. No caso de Jair Bolsonaro, especialistas consideram a acusação pouco provável, pois é incumbência do procurador-geral.

Após os depoimentos de vários ministros, altos funcionários ou dirigentes de hospitais e empresas, a CPI exibiu uma face mais humana na segunda-feira, com os testemunhos de familiares das vítimas da covid-19.

"Nós merecíamos um pedido de desculpas da maior autoridade do país (o presidente Bolsonaro). Não é questão de política, nós estamos falando de vidas", declarou, com lágrimas nos olhos, o motorista de táxi Márcio Antônio Silva, que perdeu seu filho de 25 anos.

"O que vimos foi a antítese do que se esperava de um presidente da República. Jamais o vimos derramar lágrimas de compaixão ou expressar enorme pesar pelo povo brasileiro", acrescentou perante a CPI Antônio Carlos Costa, presidente da ONG Rio de Paz.

- "Punir os responsáveis" -A CPI investigou as responsabilidades do governo na grave escassez de oxigênio, que causou a morte de dezenas de pacientes por asfixia em Manaus, o discurso anticonfinamento de Jair Bolsonaro e sua negação da gravidade da pandemia, que chamou de "gripezinha".

O governo também é apontado pelos atrasos e pelas suspeitas de corrupção na aquisição de vacinas.

A Comissão se debruçou, ainda, sobre as relações entre o governo e as empresas de saúde privadas, acusadas de promover o "tratamento precoce", sobretudo a hidroxicloroquina, cuja ineficácia para a covid foi provada cientificamente.

Uma delas, a Prevent Senior, é suspeita de ter realizado sem o conhecimento de seus pacientes experiências com este tipo de tratamento e de ter pressionado os médicos para prescrevê-lo a "cobaias humanas".

"O relatório desta CPI será para pedir a punição dos verdadeiros responsáveis por esse morticínio que aconteceu no Brasil, e são muitos. Não podemos (deixar de) puni-los", resumiu nesta terça-feira o senador Omar Aziz (PSB-AM), presidente da CPI.

lg/pt/mvv