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Reduto de Bolsonaro, presidenciáveis se mobilizam em busca do voto evangélico

Presidente Jair Bolsonaro conserva o eleitorado evangélico como seu principal bastião - Isac Nobrega/Presidência da República
Presidente Jair Bolsonaro conserva o eleitorado evangélico como seu principal bastião Imagem: Isac Nobrega/Presidência da República

Da AFP

25/02/2022 13h06Atualizada em 25/02/2022 13h47

Apesar de a campanha ainda não ter começado, os possíveis candidatos à presidência do Brasil já se movimentam para seduzir o eleitorado evangélico, chave para a eleição de Jair Bolsonaro em 2018 e que tende a ser cada vez mais decisivo, de acordo com especialistas.

Bolsonaro, que segundo as pesquisas perderia as eleições de outubro para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tentará a reeleição com a promessa de seguir trabalhando em defesa dos valores cristãos.

Este "é um governo que fala com orgulho que acredita em Deus, que respeita os seus militares, que defende a família brasileira", disse o presidente de extrema-direita, que recentemente cumpriu a promessa de nomear para o Supremo Tribunal Federal um ministro "terrivelmente evangélico".

Por sua vez, o Partido dos Trabalhadores (PT) de Lula lançará no próximo mês um podcast com entrevistas de interesse exclusivo dos evangélicos, como parte de uma estratégia desenhada por um pastor que se reuniu com o ex-presidente de esquerda (2003-2010).

O pastor Paulo Marcelo Schallenberger orientou Lula sobre como se aproximar e vencer desconfianças em relação à agenda de costumes do PT, mais liberal do que a defendida nos templos, confirmou uma fonte do partido à AFP.

Até mesmo o ex-juiz Sérgio Moro, notabilizado pela operação "Lava Jato", em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, se comprometeu diante de líderes religiosos a ser fiel a 14 "princípios", entre eles o de lutar contra a ampliação do aborto.

"Os movimentos dos candidatos estão mostrando a relevância que tem o mercado evangélico para a política", disse à AFP o cientista político André Cesar, da consultoria Hold.

Os evangélicos representam quase um terço da população brasileira, o equivalente a cerca de 70 milhões de pessoas, e algumas projeções indicam que, no espaço de uma década, eles podem superar os católicos no país com a maior população desta denominação religiosa do mundo.

Principal reduto de Bolsonaro

Apesar do desgaste sofrido por Bolsonaro na pandemia, que se deve, segundo os especialistas, à sua má gestão da pandemia e ao impacto da mesma na economia, o presidente conserva o eleitorado evangélico como seu principal bastião.

De acordo com uma pesquisa da consultoria PoderData realizada este mês, 44% dos evangélicos votariam no atual presidente no primeiro turno, enquanto 32% votariam em Lula. Outros institutos de pesquisa, no entanto, estimam um cenário de maior paridade entre o petista e Bolsonaro.

Em 2018, o voto evangélico foi decisivo para inclinar a balança a favor de Bolsonaro. Segundo as pesquisas, no segundo turno entre o atual presidente e o petista Fernando Haddad, 70% dos evangélicos votaram em Bolsonaro, que, apesar de se declarar católico, é casado com uma evangélica e havia se aproximado desse eleitorado.

Durante a última campanha presidencial, Bolsonaro acusou o PT de promover a sexualização das crianças e de distribuir nas escolas o que ele batizou de "kit gay", um suposto manual que ensinaria as crianças a se tornar homossexuais, algo classificado como informação falsa pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mais tarde, já como presidente, nomeou evangélicos para o comando de ministérios como a pastora Damares Alves, na pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

Bolsonaro "compartilha com os evangélicos os mesmos valores sobre a homoafetividade, o aborto e a importância da família tradicional. Não é o candidato ideal, mas o candidato possível", disse à AFP Juliano Spyer, antropólogo e autor do livro "Povo de Deus: quem são os evangélicos e por que eles importam", uma radiografia dos evangélicos brasileiros.

Questão de valores

Sóstenes Cavalcante, deputado federal (DEM-RJ) e líder da poderosa frente parlamentar evangélica, disse à AFP acreditar que, apesar da penúria econômica em que muitos brasileiros evangélicos vivem nos últimos anos, a maioria voltará a votar em Bolsonaro.

"Com este governo não tivemos que lutar contra afrontas aos nossos valores", disse o deputado, aliado de Bolsonaro. "Nos governos do PT vivíamos impedindo projetos de legalização do aborto, do casamento homossexual e de sexualização das crianças nas escolas".

O pastor reconheceu, em sintonia com as pesquisas, que Lula lidera a corrida presidencial, mas com uma vantagem que pode ser revertida se Bolsonaro adotar medidas de alívio econômico, mas destacou que "mesmo diante da crise [econômica], o evangélico vai se pautar pelos valores", por isso eles votarão majoritariamente no atual presidente.

Já Spyer ressaltou que, apesar de o evangélico brasileiro típico ser uma mulher negra e periférica, o que coloca esse perfil em choque com algumas políticas do presidente, como a decisão de flexibilizar as regras de acesso às armas, Bolsonaro abraçou o cristianismo "de forma integral".

"Os evangélicos nunca tiveram tanto espaço como agora. Os próximos presidentes terão que partir desta realidade", afirmou.