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Fragmentos de vida nas regiões ocupadas na Ucrânia

02/08/2022 12h19

A comunicação é rara e as informações são parciais nas regiões ucranianas conquistadas pelas forças russas e isoladas do restante do país.

Nas últimas semanas, a AFP entrou em contato com civis que vivem em Kherson (sul), Lysychansk (leste) e Balakliya.

Todos descreveram um desmonte dos serviços público, falta de gás, de eletricidade, de internet e um clima de tensão.

Seguem relatos da vida na zona ocupada. Os depoimentos não puderam ser verificados de forma independente.

KHERSON

O exército ucraniano lançou há alguns dias uma contraofensiva nesta região do sul da Ucrânia, onde uma grande cidade, Kherson, foi conquistada pelos russos em 3 de março.

"Há muitos soldados nas cidades, em Kherson, Nova Kajovka, com helicópteros e aviões sobrevoando", afirmou Oleksandre*, professor de 25 anos, que mora em uma localidade próxima.

"É tudo muito deprimente. Não há medicamentos e idosos estão morrendo por falta de tratamento(...) Os serviços públicos estão totalmente destruídos".

"Os militares e as novas autoridades não nos dizem absolutamente nada, só que estão ali para sempre".

"O rublo não circula, passaportes não são emitidos, ninguém nos quer mesmo" (A Rússia declarou o rublo moeda oficial e começou a entregar passaportes russos).

"Muitas pessoas estão sem trabalho e só ficaram os profissionais sem qualificação. Quem tem dinheiro e bons empregos em tecnologia ou comunicação foi embora. Está tudo parado".

"Nas primeiras semanas houve manifestações contra a ocupação, mas em um mês terminaram quando foram cortadas a internet e a comunicação".

"Todos os ativistas ou estão escondidos, ou foram sequestrados ou assassinados".

"Se os russos nos escutam falar ucraniano, nos classificam como nazistas. Checam as redes sociais, tatuagens ou se temos símbolos ucranianos no corpo. Há quem tenha coberto suas tatuagens".

LYSYCHANSK

Antonina*, de 52 anos, vive com seu marido e filha de 20 anos nesta cidade do Donbass que caiu nas mãos russas no início de julho.

"Não há autoridades, gás, água ou eletricidade. Há pouca ajuda humanitária e ainda muitos bombardeios".

"Não é possível ir embora, ninguém tem dinheiro para isso, os salários não são pagos há vários meses".

"A internet funciona em algumas cidades, como Svatove, a uma hora de estrada".

"Há ofertas para viajar em ônibus particular por  600/700 dólares, através da Rússia ou Belarus, mas muitos não confiam e temem serem levados para a Rússia".

BALAKLIYA 

Andriï* e Tetiana* são um casal de professores de Balakliya, localidade ocupada desde o início de março. Sua filha Ana* é quem conta o cotidiano da família, baseando-se nas poucas notícias que tem dos pais.

"Nos primeiros meses da guerra, meus pais continuaram dando aulas online. Depois cortaram a internet. Então, ligavam para os alunos para orientarem as lições de casa até que cortaram o telefone".

"Hoje continuam sendo professores, mas não recebem mais salários".

"Muita gente fugiu. No começo era possível, agora não é mais". 

"Meu pais me contaram que no edifício de quatro andares onde moram, só restaram duas famílias".

"Alguns dos habitantes que ficaram (...) apoiam às novas autoridades. Às vezes provocam meus pais lhes dizendo que terão que ensinar russo".

"No início da ocupação, ativistas foram sequestrados e mortos. Agora todos obedecem e ficam quietos".

*Os nomes foram trocados

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© Agence France-Presse