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Onda de doações alivia situação da família de menino que chamou a polícia por fome

08/08/2022 16h26

Há uma semana, as prateleiras da cozinha da família Barros estavam vazias. Agora, os armários estão cheios de mantimentos, depois que Miguel, de 11 anos, ligou para a polícia desesperado para informar que não tinha "nada para comer".

O menino comoveu o país na terça-feira passada após se comunicar com o serviço de emergência. Durante três dias, sua mãe só pôde oferecer a ele e seus irmãos farinha de milho e água.

Quando o atendente lhe perguntou qual era sua emergência, o menino respondeu: "Seu policial, aqui... É porque aqui em casa não tem nada para a gente comer."

Uma viatura foi enviada à casa da família em Santa Luzia, periferia de Belo Horizonte, em Minas Gerais.

Os agentes pensaram que poderia ser um caso de negligência, mas ao chegar ao local se deparam com uma situação cada vez mais comum no país: uma mãe que luta para alimentar os filhos enquanto os preços dos alimentos sobem e a renda diminui. 

Os oficiais foram ao supermercado e retornaram com uma cesta básica de alimentos, além de doações do dono do estabelecimento.

A história de Miguel foi parar na imprensa e logo viralizou. Então, as doações começaram a chegar de todo o Brasil e também de fora, lotando a cozinha da família. 

"Veio muita comida diferente, que eu nem sei quais eram", conta Miguel, sorrindo, ao abrir o armário cheio.

- "A fome dói" -

Célia, mãe de Miguel, tem 46 anos e é solteira. Ela tem oito filhos, seis deles ainda vivem com ela. Ela costumava "fazer bicos", mas com a pandemia ficou desempregada.

"Foi muito sofrimento. Eu nunca vou esquecer na minha vida, porque a fome, ela doí tanto", disse à AFP, com seu filho mais novo nos braços.

"Você chega ao ponto de não conseguir levantar, não conseguir agir (...) O Miguel me viu desesperada, chorando (...) E aí foi que as coisas mudaram. Através do Miguel", se alegra.

A fome voltou a ser um problema no país depois de ter sido quase erradicada há uma década. O Brasil apareceu na última edição do Mapa da Fome das Nações Unidas, um ranking do qual tinha saído em 2014, com 28,9% da população vivendo em "insegurança alimentar moderada ou grave". 

As imagens divulgadas no ano passado de pessoas famintas coletando ossos descartados no Rio de Janeiro mostraram uma face preocupante do outrora próspero Brasil. 

Um estudo publicado pela Fundação Getúlio Vargas em junho de 2022 mostrou que 30% dos brasileiros vivem na pobreza (com menos de 5,50 dólares diários), frente a 24% em 2014.

Às vésperas das eleições presidenciais de outubro, os principais candidatos, o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, culpam um ao outro pela situação do país.

Miguel está feliz que sua família tem o suficiente para comer, ao menos temporariamente.

"Agora tem tanta coisa, tanta doação, que agora eu que não tinha nada, hoje eu tenho para poder ajudar as pessoas", comemora Célia.

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© Agence France-Presse