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Suriname e Guiana se dividem entre riqueza do petróleo e preservação ambiental

17/10/2022 12h01

Eis o grande paradoxo de Suriname e Guiana, dois pequenos países pobres da América do Sul: ambos se projetam como um novo polo petroleiro, mas também são os pulmões do planeta, com florestas virgens e balanços neutros, e até mesmo negativos, de carbono.

O petróleo pode ser o caminho para tirar esses países da pobreza rumo a um desenvolvimento ecologicamente exemplar, desde que contornem a "maldição" do ouro negro, que já fez muitos produtores gastarem todos os seus recursos e não saírem do subdesenvolvimento. 

Com 800 mil habitantes, a Guiana tem reservas de mais de 10 bilhões de barris, que podem aumentar. É o país com a maior reserva per capita do mundo, à frente de Brunei, Kwait e Emirados Árabes Unidos. 

Estima-se que o Suriname, com 600 mil habitantes, deve estar próximo. A confirmação de suas reservas aguarda a decisão das petroleiras de atuarem no país.

- Texas -

O bairro do Texas, ao sul de Paramaribo, reflete a miséria do Suriname com suas casas em ruínas e esgoto a céu aberto.

Edison Poekitie, um músico de 23 anos, explica porque a região foi batizada com este nome. "Era tudo escuro, não havia eletricidade. As pessoas carregavam luminárias com parafina como nos filmes. Diziam que viviam como vaqueiros, como no Texas". 

Poekitie vive com 50 dólares por semana no máximo. Se passa fome? "Todos os dias!", responde.

O Suriname atravessa uma dura crise econômica, com inflação galopante e dívida externa disparada.

"Precisamos de encanamento, cabos de eletricidade, ruas sem buracos, escolas, quadras esportivas", afirma.

- A maldição -

Em Georgetown, o gerente de uma mercearia Brian Braithwaite, 45 anos, tenta se manter "otimista". 

"Todos esperam que as coisas melhorem com o petróleo", mas "tememos que o dinheiro seja usado em benefício próprio. Deve ser investido no desenvolvimento do país", defende ele.

"Se as coisas não melhorarem, irei embora. As pessoas precisam de emprego", desabafou.

Nos dois países, ainda há pequenas cidades sem eletricidade e saneamento básico.

Os presidentes de Suriname e Guiana prometeram administrar com rigor os recursos, criar fundos para as gerações futuras, além de mecanismos de controle de gastos.

"Conhecemos bem a maldição do petróleo", disse à AFP o presidente do Suriname, Chan Santokhi.

"A existência de petróleo e de gás é limitada. Por isso, temos que usar os recursos para diversificar a economia, investir na agricultura, no setor de turismo, em moradias, infraestrutura... para termos um desenvolvimento sustentável no futuro", completou.

O presidente guianês, Mohamed Irfaan Ali, menciona "pilares de desenvolvimento" semelhantes.

- Créditos de carbono -

Os dois presidentes acreditam que este desenvolvimento econômico pode ser alcançado sem afetar o balanço de carbono, graças às suas florestas (mais de 90% de seu território) e a uma transição ecológica financiada com o dinheiro do petróleo.

"A energia suja pode financiar a energia limpa", afirma Timothy Tucker, da Câmara do Comércio e Indústria de Georgetown, que garante que as emissões geradas pelo crescimento serão compensadas com uma redução das emissões poluentes em grande escala. 

Ambos os países pretendem manter sua pegada de carbono negativa para se beneficiarem de fundos internacionais. Irfaan Ali estima o valor dos créditos de carbono em US$ 190 milhões por ano para Guiana.

Para Monique Pool, ativista ambiental no Suriname, seria melhor renunciar à exploração petroleira, como fizeram França e Guiana Francesa, e se concentrar somente na busca por "créditos de carbono".

"Ganharíamos mais dinheiro e mais rápido do que com petróleo e gás, e por mais tempo, porque seria sustentável", insiste. "Enquanto nos mantivermos 'verdes', teremos créditos para sempre", alegou Monique.

Steven Debipersad, economista da Universidade Anton de Kom, em Paramaribo, destaca que os US$ 10 bilhões projetados para os próximos 10-20 anos terão um forte impacto no Produto Interno Bruto (PIB) do Suriname, no desenvolvimento, mas também no meio ambiente.

"Todo o país que começa a explorar petróleo vê um aumento da população, do trânsito, do consumo de eletricidade", explica. "Os recursos serão convertidos em crescimento", mas "isso impactará negativamente o meio ambiente".

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© Agence France-Presse