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Mais de cem meninas continuam desaparecidas após 10 anos do sequestro pelo Boko Haram

12.mai.2014 - Em vídeo divulgado pelo grupo radical Boko Haram, as meninas feitas reféns vestem hijabs Imagem: AFP

10/04/2024 08h41Atualizada em 10/04/2024 09h29

Cada vez que escuta alguém se aproximar de sua porta, Mary Shettima pensa que sua filha Margaret está de volta, dez anos após ser sequestrada na Nigéria.

Margaret, que este ano completa 29 anos, é uma das 276 estudantes sequestradas em 14 de abril de 2014 por membros do Boko Haram na pequena localidade rural de Chibok, no estado de Borno (nordeste), e está entre as mais de cem que continuam desaparecidas.

O sequestro comoveu o mundo e impulsionou a campanha internacional "Bring back our girls" (Tragam de volta nossas meninas). Mas a realidade não mudou nesta parte da Nigéria, onde o conflito com o Boko Haram levou a uma das piores crises humanitárias com mais de 40.000 mortos e de dois milhões de deslocados.

A região de Chibok ainda vive sob a ameaça de ataques e sequestros. A AFP conseguiu chegar lá com escolta militar depois de uma viagem de seis horas por estradas empoeiradas que a ligam à cidade de Yola.

O Exército reforçou sua presença e a escola onde as 276 meninas foram raptadas, que reabriu em 2021, está protegida por um muro e arame farpado. Das novas salas de aula, os estudantes podem ver as ruínas dos antigos dormitórios incendiados pelos sequestradores.

Hauwa, que tinha 16 anos na época e passou três anos em cativeiro, lembra-se da noite em que seus sequestradores chegaram em motocicletas. "Eles gritavam e atiravam para cima. Fiquei aterrorizada, pensei que iriam nos matar", diz.

Em meio aos escombros, o vice-diretor da escola, Bature Sule, explica que muitos pais da pequena cidade de maioria cristã estão felizes porque "mantivemos a educação das crianças".

Segunda chance

Militantes do Boko Haram, que atacam escolas cujo ensino consideram ocidentalizado, foram os primeiros a sequestrar crianças em idade escolar na Nigéria para pedir resgate.

A prática se espalhou por todo o país. Mais de 1.680 estudantes foram levados de escolas nigerianas entre 2014 e 2022, segundo a ONG Save the Children.

Desde o início do conflito, o Exército retomou áreas controladas pelo Boko Haram, mas também enfrenta sua organização adversária, o Estado Islâmico, na África Ocidental.

Há algumas semanas, a Nigéria registrou dois sequestros em massa: um no próprio estado de Borno, onde foram raptadas mais de 100 pessoas, principalmente mulheres e crianças, e outro no estado de Kaduna, no noroeste, onde mais de 130 crianças foram levadas de sua escola.

Pouco depois do sequestro em Chibok, 57 meninas conseguiram fugir e mais de 100 foram resgatadas ou libertadas após acordos entre os islamitas e as autoridades.

Muitas tentam recuperar os anos perdidos e retomar os estudos. Na cidade de Yola, ao sul de Chibok, a AFP conversou com várias delas na universidade americana na cidade.

Grace, que tinha 17 anos quando foi sequestrada, quer ser enfermeira. "Eles destruíram minha vida. Sem eles eu já teria terminado os estudos", suspira.

Assim como as outras, ela foi levada à força para a floresta de Sambisa, um refúgio islamita, onde a comida era insuficiente e era preciso se esconder quando o Exército sobrevoava a área.

Muitas meninas se casaram com os sequestradores, enquanto outras, como ela, foram submetidas ao trabalho escravo. Quando foi libertada, após três anos de cativeiro, "não conseguia parar de chorar", conta.

Hauwa, 26 anos, estudante de Comunicação, pensa diariamente nas meninas ainda em cativeiro. "Tenho a impressão de que o governo não se preocupa com estas pessoas", reclama.

O porta-voz do presidente nigeriano, Bola Ahmed Tinubu, não respondeu aos pedidos de comentários feitos pela AFP.

"O governo nigeriano não aprendeu nada com o que aconteceu", lamenta Jeff Okoroafor, do movimento Bring Back Our Girls. "É por isso que ainda sequestram crianças", destaca.

Muitos pais das meninas de Chibok morreram e os que permanecem vivem uma angústia constante somada às dificuldades de uma das regiões mais pobres do mundo. Muitos se apegam à esperança de que suas filhas retornarão.

"Minha filha voltará em breve", sonha Mary Shettima. "É a esperança que me mantém viva", resume.

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