HRW alerta para deterioração 'galopante' da democracia na América Latina

Da Venezuela à Nicarágua, passando por Haiti, Cuba, Equador, El Salvador, Peru, Brasil e Argentina, a deterioração da democracia na América Latina foi "galopante" em 2024, segundo a ONG Human Rights Watch (HRW), que publicou seu relatório anual sobre os direitos humanos no mundo nesta quinta-feira (16).

O informe mundial 2025, no qual ao longo de cerca de 550 páginas a HRW repassa a situação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais em mais de uma centena de países, lembra que a "reticência covarde" de muitos governos para defender os mais pobres supõe a "erosão" das normas internacionais.

O retorno de Donald Trump à Casa Branca na próxima segunda-feira (20) pode agravar a situação, adverte a HRW. 

Na América Latina, longe de melhorar, "avançou de forma galopante" o autoritarismo e a deterioração da democracia, juntamente com a corrupção, a perda da independência judicial e o crescimento do "fenômeno paralelo" do crime organizado, diz à AFP Juanita Goebertus, diretora regional da HRW.

No Brasil, embora o retorno de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência tenha lançado uma luz de esperança, com a queda de 30% do desmatamento na Amazônia ou a aprovação de leis para a proteção dos direitos digitais na infância, a Polícia matou até setembro 4.565 pessoas, 80% das quais eram negros.

O informe avalia a situação em Venezuela, Cuba e Nicarágua, as quais considera "três ditaduras absolutamente consolidas", e chama atenção para o Haiti como um país tomado por gangues criminosas que semeiam o terror frente à "ausência absoluta de um Estado".

A posse de Nicolás Maduro para um terceiro mandato na Presidência da Venezuela em 10 de janeiro, apesar dos indícios de fraude nas eleições de 28 de julho, "é o resultado final de uma eleição que ignorou abertamente a vontade do povo e consolida o autoritarismo" no país, diz.

- Nicarágua revoga cidadania de críticos -

Na Nicarágua, o regime ditatorial de Daniel Ortega e Rosario Murillo "ampliou o uso do exílio forçado e a revogação da cidadania como formas de perseguir os críticos", acrescenta. 

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Desde 2018, o governo nicaraguense fechou mais de 5.600 ONGs e 58 meios de comunicação, além de universidades. Mais de 263 jornalistas fugiram do país, 26 deles nos primeiros seis meses do ano passado.

A HRW alerta que no México, à violência extrema do crime organizado se soma o "abuso generalizado por parte de agentes estatais com quase total impunidade". 

A ONG adverte, ainda, que as recentes mudanças constitucionais para reforçar o papel do Exército nos trabalhos policiais e revisar o sistema judiciário poderiam "perpetuar os abusos e minar gravemente o Estado de direito".

Na Colômbia, os abusos dos grupos armados, o acesso limitado à justiça e os altos níveis de pobreza, particularmente no meio rural, e nas comunidades indígenas e afro-descendentes também preocupam os autores do informe, apesar de destacarem a recente ratificação do Acordo de Escazú pelo governo do presidente Gustavo Petro.

O acordo, do qual o Brasil é signatário, é o primeiro tratado na América Latina e no Caribe focado em meio ambiente e direitos humanos. 

No Peru, o governo presidido por Dina Boluarte, "fez pouco ou nenhum esforço" para deter os ataques realizados pelo Congresso que aprovou leis que "minam a independência judicial, fragilizam as instituições democráticas e dificultam as investigações sobre o crime organizado, a corrupção e as violações dos direitos humanos", acrescenta o informe.

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O documento critica a falta de independência judicial na Guatemala no processo de seleção dos que devem exercer a justiça e as interferências públicas que beneficiam os poderosos.

Na Argentina, o primeiro ano do governo de Javier Milei se caracterizou por "novos desafios" aos direitos humanos, obstáculos para o exercício da liberdade de expressão e reunião e a retórica oficial hostil contra jornalistas e a comunidade LGBTQIAPN+, afirma.

Honduras, por sua vez, segue lutando contra a corrupção generalizada, um poder judiciário comprometido, altos níveis de violência e ataques a ambientalistas.

- "Respostas ineficazes" -

Às ameaças aos direitos humanos soma-se a "maior sofisticação e internalização" do crime organizado e as respostas governamentais "muito ineficazes", lembra Goebertus.

É o caso do "populismo punitivo" praticado pelo governo de El Salvador, que em dois anos e meio prendeu 83.000 pessoas e registrou 300 mortes no cárcere, "sem que tenha havido um processo de investigação" interno.

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Ou do Equador, que em um ano de estado de exceção, viu aumentarem os casos "de excessos de uso da força, torturas, desaparecimentos e execuções extrajudiciais".

"Temos políticas de linha-dura imediatistas baseadas no encarceramento em massa, mas sem capacidade real de investigação técnica judicial para revelar estruturas", lamenta a especialista, pedindo "investimentos a mais longo prazo" para "fortalecer nossa capacidade de administração de justiça real".

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© Agence France-Presse

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