Conteúdo publicado há 1 mês

'Cirurgião solitário' abusou de quase 300 crianças; júri começa na França

Com uma personalidade "particularmente atípica", o ex-cirurgião Joël Le Scouarnec, 74 anos, conseguiu esconder durante décadas suas parafilias, o que o levou a abusar sexualmente de cerca de 300 pacientes, a maioria crianças.

O julgamento de quatro meses de Le Scouarnec começará em 24 de fevereiro. O cirurgião é acusado de violência sexual entre 1989 e 2014, período em que trabalhou em dez estabelecimentos no oeste da França. Segundo a investigação, as agressões ocorreram quando as vítimas estavam adormecidas ou acordando.

No total, ele enfrenta 111 acusações de estupro e 189 de agressão sexual, agravadas pelo fato de que ele abusou de sua posição como médico e que as vítimas geralmente tinham menos de 15 anos (256 das 299).

A idade média das vítimas era de 11 anos, mas entre os muitos crimes atribuídos ao médico estão o estupro de um bebê de um ano e a agressão sexual de uma paciente de 70 anos.

Joël Le Scouarnec, que já está preso por crimes semelhantes, pode ser condenado à pena máxima de 20 anos de prisão, já que a lei francesa não permite o acúmulo de penas.

Quem é o cirurgião

Le Scouarnec nasceu em Paris, filho de um marceneiro e de uma zeladora. Mais velho de três irmãos, era um ótimo aluno, bastante solitário, e sonhava se tornar cirurgião desde os 10 anos, o que conquistou na década de 1980.

Ele se casou e teve três filhos entre 1980 e 1987. Mas, por trás da imagem de uma família sem problemas, o casamento ficou cada vez mais tenso à medida que as tendências pedófilas do médico aumentavam.

"Joël está possuído pelo diabo (...) e não suspeita de nada", disse ao Le Télégramme em 2019 sua agora ex-esposa, de quem se separou no início dos anos 2000 e se divorciou em 2023.

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A mulher também disse que "nunca" suspeitou dele, embora tenha o flagrado "olhando de forma estranha" para jovens vizinhos.

Nos vários hospitais do oeste da França onde trabalhou, a maioria de seus antigos colegas o descreveu como um homem "discreto" e um médico "competente", que nunca levantou dúvidas, exceto para dois deles.

Le Scouarnec mudou de hospital em diversas ocasiões por vários motivos: conflitos com colegas, oposição à compra de uma clínica por um grupo de "financistas", fechamento de seu departamento etc.

Fora do hospital, ficava isolado. Em sua casa, colecionava dezenas de bonecas, com as quais praticava atos sexuais, e tirava fotos e vídeos de suas práticas, que também eram zoofílicas, escatológicas e sadomasoquistas.

Segundo suas declarações, citadas pela acusação, o réu explorou "o que há de mais sórdido, de mais sinistro" e se entregou "ao mundo da pedofilia", acreditando ser intocável.

Em seus cadernos, descobertos durante uma operação em 2017, registrou e listou sua vida sexual, alegando ser "obcecado, até mesmo tiranizado, por tudo relacionado ao sexo".

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Os investigadores encontraram mais de 50.000 fotos violentas e 5.000 vídeos.

O cirurgião também registrou meticulosamente os nomes de suas vítimas em cadernos, juntamente com relatos dos abusos que ele infligia secretamente a elas, às vezes até mesmo na mesa de operação.

Esse costume permitiu que os investigadores rastreassem seu histórico de agressão.

"Peritos psiquiátricos e psicólogos conseguiram esclarecer as diferentes tendências de uma personalidade particularmente atípica", disse o Ministério Público à imprensa.

"Muito frio, muito distante"

A Justiça o descobriu em 2004 através de seu cartão bancário, utilizado para acessar sites de pornografia infantil. Um tribunal em Vannes o condenou em 2005 a quatro meses de prisão, com suspensão da pena.

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Essa condenação não o impediu de continuar sua carreira como cirurgião até 2017, quando se aposentou.

No mesmo ano, quando sua vizinha de 6 anos denunciou um estupro, o número de vítimas veio à tona. Além de centenas de pacientes, também abusou sexualmente de duas sobrinhas.

Em dezembro de 2020, sentou no banco dos réus do tribunal de Saintes. Desde então, cumpre 15 anos de prisão por estuprar sua vizinha e uma sobrinha na década de 1990, e por abusar sexualmente de outra sobrinha e de um paciente menor de idade durante o mesmo período.

Francesca Satta, advogada das vítimas em Saintes que também atuará em Vannes, o descreve como "muito frio, muito distante" e calculista: "Só avança seus peões quando sabe quais peões nós avançamos".

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